Opções do Governo agravam as condições de vida e as desigualdades

São insuficientes as medidas até agora adoptadas para enfrentar o agravamento das condições de vida. O PCP demonstrou-o na semana passada em interpelação ao Governo, onde reafirmou a existência de uma política alternativa com soluções para os problemas.

A par da escassez de acção governativa na respostas às dificuldades das famílias, a sobressair do debate estiveram ainda outras questões da maior relevância como seja o combate às desigualdades e injustiças sociais ou a degradação do acesso aos serviços públicos.

«Enquanto salários e pensões perdem valor real e ficam cada vez mais longe do fim do mês, vemos o contraste com a acumulação de lucros obscenos pelos grupos económicos e em tantas multinacionais instaladas no País», afirmou logo a abrir o deputado Bruno Dias, dando nome aos sectores que são os ganhadores dessa realidade dual e profundamente desigual: a banca e os seguros, a energia ou as telecomunicações.

Processo de concentração da riqueza a «um nível sem paralelo», num quadro em que persiste a injustiça fiscal, em que crescem a pobreza e as desigualdades, tudo sob o olhar impávido do Governo, que prefere recorrer à propaganda para camuflar o que diz que faz mas não faz e usar indicadores económicos gerais para esconder que a vida está pior. As intervenções de membros do Governo são disso testemunho. Foi o caso da ministra Adjunta e dos Assuntos Parlamentares, que não se cansou de repetir que o Governo tem acudido com «medidas de apoio às famílias mais vulneráveis» (ver caixa).

«Como pode o Governo referir que tudo fez para acudir aos mais vulneráveis, quando deliberadamente empurra os trabalhadores e os reformados para a pobreza, ao recusar o aumento intercalar dos salários e das pensões que permita recuperar e valorizar o poder de compra?», inquiriu no encerramento do debate a líder parlamentar do PCP, observando que «de pouco ou nada vale enaltecer os indicadores económicos, quando estes não têm nenhuma tradução na vida das pessoas».

 

Fazer frente aos poderosos

E por isso a exigência do PCP de aumento dos salários e pensões foi transversal ao debate, tal como foi a do controlo e redução de preços de bens e serviços essenciais. Essa é a solução capaz de combater a especulação e reduzir preços, sublinhou Paula Santos.

Aliás, propostas nesse sentido da parte dos comunistas não têm faltado. Mas porque falam mais alto os interesses da banca, da grande distribuição e dos grupos económicos, tais propostas têm sistematicamente esbarrado na rejeição de PS, PSD, CDS, IL e Chega, anotou Paula Santos, daí concluindo que em nenhum destes partidos os trabalhadores e o povo podem encontrar a resposta aos seus problemas.

Também a habitação foi colocada em primeiro plano, com a bancada comunista a considerar a situação como de «verdadeira emergência social». «É real o receio de muitas famílias, face ao aumento dos custo com a habitação, de não conseguir suportar esses encargos, correndo o risco de ficar sem casa», alertou Bruno Dias, convicto de que as medidas apontadas pelo Governo não respondem aos problemas, «como podem até criar novos e mais graves». Reclamou-se, por isso, que a habitação «seja assumida como um direito e não como uma mercadoria».

Preocupações idênticas foram manifestadas quanto à saúde e à Escola Pública, áreas onde os problemas se vêm avolumando e para os quais o remédio, reiterou Paula Santos, está «na ruptura com as opções da política de direita», na afirmação de «uma política alternativa, patriótica e de esquerda como a que o PCP propõe aos trabalhadores e ao País».

 

Equidade fiscal, precisa-se!

Portugal tem um grave problema de justiça fiscal. Os deputados comunistas demonstraram-no na interpelação ao Governo. E fizeram-no de forma insofismável, pondo desde logo em evidência o contraste chocante entre, por um lado, o esforço fiscal que recai sobre os salários, os baixos rendimentos e o consumo, e, por outro, as benesses para fuga ao pagamento de impostos concedidas aos grandes grupos económicos, aos detentores de grandes fortunas e património de elevado valor.

O deputado Duarte Alves não se ficou pela denúncia e deu exemplos concretos que atestam essa realidade: dos off shores aos regimes dos residentes não-habituais (alargados pelo Governo aos nómadas digitais), dos expedientes legais de tributação no estrangeiro de lucros obtidos no País ao alargamento do prazo de reporte de prejuízos fiscais.

Enquanto isto sucede, «quem vive do seu salário, da sua pensão, paga mais IRS», lamentou o parlamentar do PCP, anotando que também a «energia continua a ser taxada como se não fosse um bem essencial».

Às críticas da bancada comunista o secretário de Estado do Trabalho procurou contrapor a ideia de que o Governo tem vindo a executar «políticas sectoriais» para mitigar «efeitos negativos», mostrando-se céptico quanto à possibilidade de «aumentar salários, desagravar fiscalmente a carga sobre trabalhadores e, ao mesmo tempo, aumentar o investimento público».

Ora, não só é possível, como é uma necessidade impreterível, insistiu o PCP, com Duarte Alves a apontar os moldes concretos em que isso poderá ser feito. Por exemplo, através da baixa do IRS aos salários mais baixos e intermédios, através da actualização do valor da dedução específica, congelada desde 2010. Mas também por via da baixa do IVA da energia, incluindo o gás de botija, bem como pela baixa do IVA das telecomunicações para a taxa intermédia de 13 por cento. Com origem no PCP não têm faltado igualmente propostas com vista a garantir a tributação em Portugal dos lucros aqui realizados, «acabando com benefícios fiscais, alçapões e isenções ao sector financeiro e aos grupos económicos».

Concretizem-se essas medidas – e logo haverá maior equidade fiscal, como foi dito. Para que se acabe de vez com situações escandalosas como é a da existência de bancos e outros grupos económicos que «ganham centenas de milhões de euros e pagam taxas efectivas de impostos abaixo do que pagam em salários e pensões».

 

Pelo aumento de salários e pensões

O discurso da ministra Adjunta e dos Assuntos Parlamentares foi todo ele construído no sentido de afirmar que as opções do Governo são pelo «reforço do Estado social», que não têm faltado as necessárias «medidas de apoio às famílias mais vulneráveis». Embora reconhecendo que estas passam por dificuldade, realidade que não teve como escamotear, Ana Catarina Mendes descartou qualquer responsabilidade do Governo, atribuindo-as exclusivamente a «factores externos», como a «guerra e o disparar da inflação», «não a escolhas políticas erradas».

No decurso do debate a bancada comunista tratou de desmontar a falácia da narrativa do Governo, mostrando o desfasamento que há entre esta e o quotidiano concreto dos trabalhadores e do povo. Entre os muitos exemplos dados, um há que sobressaiu com particular nitidez: a recusa do Governo em dar passos efectivos na valorização salarial. Isto quando é sabido, como tratou de sublinhar a deputada Alma Rivera, que «é aumentando os salários que podemos impedir que os trabalhadores vivam em situação de pobreza».

A líder parlamentar comunista, Paula Santos, na intervenção final, também não esteve com meias palavras, acusando o Executivo de procurar «fazer que faz, para esconder que não faz o que é preciso». Já sobre as medidas por este tomadas, considerou-as «insuficientes e ineficazes face às dificuldades que crescem todos os dias». Daí a consideração expressa de que a «resposta aos problemas» passa necessariamente por uma política alternativa, como a que o PCP defende e propõe, que, entre outros eixos, «assuma o aumento geral dos salários e das pensões como uma emergência nacional».

Sem esse aumento, não há melhoria das condições de vida.

E por isso a exigência de valorização dos salários e pensões ocupou um lugar central no debate.

 



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