Hoje está geralmente assumido que o sistema capitalista atravessa sérias dificuldades. Cresce a inquietação nas fileiras da classe dominante. A euforia triunfalista que acompanhou o desaparecimento da União Soviética (o «fim da história», lembram-se?) já lá vai. Reconhece-se já abertamente que o centro imperialista, que os EUA e seus parceiros do G7 personificam, não só se mostra incapaz de sair da situação de real estagnação em que há largos anos se encontra a sua economia (a Alemanha acaba de entrar em recessão) e com picos de crise cada vez mais frequentes e devastadores, como está em acentuado declínio no plano mundial.
E olhando para o desenvolvimento e crescente peso da China nas relações internacionais e para espaços de cooperação que, como os BRICS ou a Organização de Cooperação de Xangai, contrariam os propósitos hegemónicos do imperialismo, fiéis do sistema chegam a afirmar, como Martin Wolf, o principal comentador em economia do Financial Times (edição de 15.05.23), que «tanto o momento “unipolar” dos EUA como o domínio económico do G7 passaram à história».
Se é certo que um tal reconhecimento não é generalizado, nem por isso pode subestimar-se o seu significado político neste tempo de férreo controlo mediático e de furiosa perseguição a toda e qualquer voz discordante do pensamento único. Desde logo porque vem dar razão às análises do PCP. Mas sobretudo porque, evidenciando as inquietações que percorrem a classe dominante, revela a existência de posições «realistas» que põem em causa a estratégia de confrontação em que a recente cimeira do G7 no Japão persiste e que ameaça cada vez mais explicitamente a República Popular da China.
Naquele mesmo sentido, e de modo bem mais acutilante, se situa o artigo de 15 especialistas em segurança norte-americanos publicado recentemente no New York Times. Contestando abertamente a narrativa oficial os autores afirmam que a solução para a guerra na Ucrânia «não é mais armas e mais guerra», que não irão «endossar a estratégia de lutar contra a Rússia até ao último ucraniano», que foram «provocações deliberadas que resultaram na guerra Rússia-Ucrânia», lembrando que «com o colapso da União Soviética e o fim da Guerra Fria, os líderes dos Estados Unidos e da Europa Ocidental garantiram aos líderes soviéticos e russos que a NATO não se expandiria até às fronteiras da Rússia» e que «desde 2007 a Rússia advertiu repetidamente que a presença das forças armadas da NATO nas fronteiras russas era intolerável».
E depois de denunciarem os fabulosos lucros do complexo-militar com a guerra e as tragédias e fracassos das agressões militares ao Iraque e ao Afeganistão, propõem que em lugar de lançar mais achas para a fogueira da Ucrânia «nos dediquemos a forjar um acordo diplomático que interrompa a matança e diminua as tensões».
Tais posições, que partem de dentro do próprio sistema, favorecem o alargamento do campo das forças anti-imperialistas e amantes da paz. Sem falsas expectativas, elas confirmam que é possível isolar os sectores mais agressivos do imperialismo e fazer recuar e derrotar os falcões do militarismo e da guerra. O que é preciso é intensificar a luta pela paz, que o PCP tem defendido, praticamente só, desde o primeiro momento.