Passatempos
Um popular passatempo, publicado em jornais e revistas, consta de duas imagens à primeira vista semelhantes, exceptuando umas poucas diferenças. O desafio é precisamente encontrá-las: umas mais evidentes, outras praticamente indetectáveis.
Nesta crónica invertemos os termos do jogo, adaptando-o à política nacional. Assim, mais do que as diferenças que separam PS, PSD, Chega e IL – e existem, algumas delas até bastante significativas –, procuramos aquilo que os une, nada mais nada menos do que a defesa intransigente dos interesses dos donos-disto-tudo.
O tema não é novo por aqui, sabemo-lo, mas convém por vezes a ele regressar, pois é muito o ruído, solenes as proclamações, veementes as indignações e poderá sempre haver quem, no meio de tudo isto, se desoriente e confunda.
Alguns exemplos recentes testemunham essa convergência, expressa em opções concretas, mais do que em palavras.
O PCP apresentou há dias uma proposta para controlar o preço do cabaz alimentar, de modo a travar as consequências mais brutais da elevada inflação que se verifica e, com elas, a especulação que a fomenta. PS, PSD, Chega e IL rejeitaram-na, para satisfação dos principais grupos da grande distribuição, que assim poderão continuar a acumular lucros obscenos com as dificuldades da maioria – os da Jerónimo Martins/ Pingo Doce aumentaram 29,3% e os da Sonae/ Continente quase que duplicaram.
O mesmo aconteceu, ainda em Dezembro, quando esteve em causa o controlo dos preços da energia e dos combustíveis, face quer aos valores crescentes – e, para tantos, incomportáveis – pagos por todos nós, quer aos lucros acumulados pela GALP e EDP, que em Setembro do ano passado já ultrapassavam os mil milhões de euros. Entretanto, são cada vez mais os que têm de optar entre comer e aquecer a casa…
E quando o PCP (sempre ele!) propôs a taxação dos lucros extraordinários alcançados pelos grupos económicos dos sectores da energia, dos combustíveis, da banca, dos seguros e da distribuição alimentar, qual foi a opção de PS, PSD, Chega e IL? Votaram contra, evidentemente. O mesmo que fizeram às propostas que visavam a redução geral das comissões bancárias, a criação de uma rede pública de creches, o aumento do salário mínimo, das reformas e das pensões. E a tantas, tantas outras.
Mas lá continuarão, na Assembleia da República e no palco que a comunicação social sempre lhes dá, a exibir as suas diferenças, sejam elas reais ou aparentes. E entre diárias acusações de «socialismo», juras apaixonadas (e sempre traídas) de amor à democracia e à liberdade e grunhidos de vergonha! vergonha!, lá vão, os quatro, juntos, servindo os mesmos.
É coisa séria, este passatempo...