CGTP-IN promove acção em defesa do SNS e projecta mês de mobilização e luta

O pro­testo que há uma se­mana se re­a­lizou em Lisboa em de­fesa do Ser­viço Na­ci­onal de Saúde (SNS) coin­cidiu com o início do mês de mo­bi­li­zação e luta, a que a se­cre­tária-geral da CGTP-IN, pre­sente na ini­ci­a­tiva, deu pro­jecção. Isabel Ca­ma­rinha es­teve, an­te­ontem, no Porto, numa tri­buna pú­blica igual­mente em de­fesa do SNS, pro­mo­vida pela União De Sin­di­catos do Porto (USP/​CGTP-IN), da qual da­remos nota na pró­xima edição.

O pro­blema mais grave do SNS é, sem dú­vida, a falta de pro­fis­si­o­nais

Da Praça Duque de Sal­danha ao Mi­nis­tério da Saúde, tra­ba­lha­dores e utentes des­fi­laram, ao início da tarde do pas­sado dia 15, em de­fesa do SNS. Jus­ta­mente neste dia, as­si­nala-se o ani­ver­sário da lei que criou o sis­tema pú­blico de saúde, facto que não foi es­que­cido por in­ter­ve­ni­entes na ini­ci­a­tiva, nem tão pouco por Ber­nar­dino So­ares, membro do Co­mité Cen­tral do PCP que es­teve no pro­testo e prestou de­cla­ra­ções à co­mu­ni­cação so­cial (ver caixa).

Mas ao longo destes 43 anos, o SNS tem sido alvo de uma ofen­siva com o ob­jec­tivo de, pri­meiro, não con­cre­tizar os seus pro­pó­sitos fun­da­dores, de­cor­rentes de Abril e da Cons­ti­tuição que con­sa­grou con­quistas e re­a­li­za­ções da re­vo­lução, e, de­pois, de o des­fi­gurar e des­man­telar, abrindo ca­minho à pre­va­lência dos pri­vados no sector. É esta se­gunda fase que se de­sen­volve com par­ti­cular vi­o­lência nos úl­timos anos, de­nun­ci­aram os ma­ni­fes­tantes em panos, pan­cartas e pa­la­vras de ordem, nas quais também se re­cla­mavam so­lu­ções e se ape­lava à de­fesa do di­reito de todos à saúde, in­de­pen­den­te­mente da sua con­dição sócio-eco­nó­mica, e à sal­vação do ins­tru­mento que o ma­te­ri­a­liza: o SNS.

Aliás, finda a marcha, frente ao Mi­nis­tério da Saúde, agora com uma nova tu­tela (o recém no­meado ti­tular da pasta go­ver­na­tiva Ma­nuel Pi­zarro), Célia Matos, do Sin­di­cato dos En­fer­meiros Por­tu­gueses, foi pau­tando a apre­sen­tação da ini­ci­a­tiva e dos ora­dores com as mesmas pa­la­vras de ordem – «a saúde é um di­reito, não é um ne­gócio», «pú­blico é de todos, pri­vado é só de al­guns», «mi­nistro, es­cuta, utentes e tra­ba­lha­dores em luta», «SNS sim, PPP não».

Da tri­buna, a di­ri­gente sin­dical também lem­brou a ur­gência de «de­fender e re­forçar o SNS» e o seu ca­rácter «pú­blico, gra­tuito e uni­versal», através do qual «Por­tugal con­se­guiu di­mi­nuir a mor­ta­li­dade in­fantil e au­mentar a es­pe­rança média de vida». Mais re­cen­te­mente, foi com o SNS, «apesar das di­fi­cul­dades e in­su­fi­ci­ên­cias», e com «o em­penho e de­di­cação dos seus pro­fis­si­o­nais», que «se con­se­guiu com­bater a COVID-19», ao mesmo tempo que «o sector pri­vado teve um com­por­ta­mento ver­go­nhoso fe­chando as portos no com­bate à epi­demia», acres­centou, antes de de­nun­ciar al­gumas das ma­leitas de que sofre o SNS, fruto de op­ções po­lí­ticas de su­ces­sivos go­vernos vi­sando a sua li­qui­dação, e in­dicar a te­ra­pêu­tica ne­ces­sária.

Causas e so­lu­ções que, no final, Isabel Bar­bosa, em re­pre­sen­tação da Pla­ta­forma Lisboa em De­fesa do SNS, viria a re­petir ao ler a re­so­lução apro­vada pela massa hu­mana que ocu­pava quase to­tal­mente aquela zona da Ave­nida João Cri­sós­tomo.

Lutar para o SNS salvar

Antes, porém, Célia Por­tela, em nome da União de Sin­di­catos de Lisboa (USL/​CGTP-IN), que pro­moveu a acção com o apoio da já re­fe­rida Pla­ta­forma e o Mo­vi­mento dos Utentes dos Ser­viços Pú­blicos (MUSP), re­cordou que «podem mudar os mi­nis­tros, mas se não mudam as po­lí­ticas, o re­sul­tado é ri­go­ro­sa­mente igual». Isto porque, con­si­derou, «O Go­verno teima em não dar res­posta às rei­vin­di­ca­ções dos pro­fis­si­o­nais de saúde, o que con­tribui para a de­gra­dação do SNS e para a pro­moção do ne­gócio pri­vado da saúde em Por­tugal», nada faz quando é «ur­gente adoptar me­didas para atacar os pro­blemas ime­di­atos, mas também os es­tru­tu­rais para que os prin­cí­pios ge­rais con­sa­grados na Cons­ti­tuição se ma­te­ri­a­lizem».

Nesse sen­tido, Célia Por­tela in­sistiu que «a si­tu­ação crí­tica em que se en­con­tram os ser­viços de saúde, as­so­ciada à cam­panha de­sen­ca­deada nas úl­timas dé­cadas contra o SNS, con­voca-nos a todos para a luta em de­fesa e pelo re­forço do SNS».

Apelo à mo­bi­li­zação foi o que deixou, igual­mente, Ce­cília Sales, do MUSP, para quem «as pes­soas não são al­ga­rismos de contas certas», Cal­culou, ainda, em cerca de 700 mil o nú­mero de utentes sem mé­dico de fa­mília na re­gião de Lisboa e Vale do Tejo, exemplo da de­gra­dação de um sis­tema pú­blico que era «de re­fe­rência mun­dial» e hoje está ame­a­çado pela «falta de in­ves­ti­mento em meios, e equi­pa­mentos e pro­fis­si­o­nais».

Ur­gente

Ora, na re­so­lução apro­vada na ini­ci­a­tiva, já de­pois de ter in­ter­vindo Isabel Ca­ma­rinha, se­cre­tária-geral da CGTP-IN (ver caixa), su­blinha-se que «o SNS ne­ces­sita de um forte im­pulso no in­ves­ti­mento para re­solver pro­blemas de há muito co­nhe­cidos». So­lu­ções, aduz-se, que «de­viam ter sido an­te­ci­pa­da­mente im­ple­men­tadas para evitar atingir de forma re­cor­rente si­tu­a­ções crí­ticas, quer nos cui­dados de saúde pri­má­rios quer nas uni­dades hos­pi­ta­lares».

«O pro­blema mais grave do SNS é, sem dú­vida, a falta de pro­fis­si­o­nais de saúde, es­pe­ci­al­mente de mé­dicos e en­fer­meiros», o qual «foi-se agra­vando» com a «sua des­va­lo­ri­zação pro­fis­si­onal e as más con­di­ções de tra­balho, que têm pro­vo­cado des­mo­ti­vação e des­con­ten­ta­mento» e têm con­du­zido «a que muitos emi­grem ou se trans­firam para o sector pri­vado», diz-se ainda no texto, antes de se de­ta­lhar as con­sequên­cias neste as­pecto, no caso na re­gião de Lisboa:

  • Con­cursos abertos para pre­en­chi­mento de vagas de mé­dicos, em maior nú­mero para Lisboa e Vale do Tejo, sempre com atrasos e que não con­se­guem atrair pro­fis­si­o­nais;

  • Pro­moção da pre­ca­ri­e­dade, como é o caso da con­tra­tação de en­fer­meiros «ao abrigo da covid», cul­mi­nando na ex­clusão de 152 vagas para a ARS Lisboa e Vale do Tejo;

  • Ritmos de tra­balho vi­o­lentos e carga ho­rária grande, com muitas horas ex­tra­or­di­ná­rias re­a­li­zadas.

Exi­gên­cias

Outro as­pecto cri­ti­cado na re­so­lução é a perda de ca­pa­ci­dade do SNS em re­sul­tado «de in­ves­ti­mentos in­su­fi­ci­entes e de sub-or­ça­men­tação, da res­pon­sa­bi­li­dade do PSD e do PS, com o claro ob­jec­tivo de subs­ti­tuir o SNS pelo sector pri­vado». Uma «re­a­li­dade de anos», como é, também, a re­le­gação dos cui­dados de saúde pri­má­rios «para um papel se­cun­dário, fa­lhando muitas vezes na sua missão pre­ven­tiva, saúde pú­blica e co­mu­ni­tária», com os cen­tros de saúde a serem «es­va­zi­ados de vá­rias va­lên­cias», o que eli­mina «uma mais-valia na in­ter­venção do mé­dico fa­mília e de di­mi­nuição de ur­gên­cias».

Do mesmo modo, «nos cui­dados hos­pi­ta­lares houve uma re­dução de mi­lhares de camas e en­cer­ra­mento de ser­viços es­pe­ci­a­li­zados e de ur­gên­cias. Os tempos de es­pera para con­sultas, ci­rur­gias e tra­ta­mentos são muito longos», afirma-se igual­mente, antes de se sa­li­entar que «é comum aos cui­dados pri­má­rios e aos cui­dados hos­pi­ta­lares a aqui­sição de­fi­ci­ente de equi­pa­mentos clí­nicos, muitos já ob­so­letos, e a de­gra­dação de muitos lo­cais de tra­balho», e de se dar conta de en­cer­ra­mentos de uni­dades e va­lên­cias ocor­ridas na re­gião de Lisboa nos úl­timos 20 anos, que «cons­ti­tuíram perdas ir­re­pa­rá­veis na oferta de cui­dados de saúde pres­tados aos ci­da­dãos».

Neste con­texto, a USL/​CGTP-IN e a Pla­ta­forma Lisboa em de­fesa do SNS, exigem:

  • Que seja res­pei­tada a Lei de Bases da Saúde, ga­ran­tindo o prin­cípio da gestão pú­blica e de­mo­crá­tica dos es­ta­be­le­ci­mentos e ser­viços do SNS e o ca­rácter su­ple­tivo dos sec­tores pri­vado e so­cial;

  • A va­lo­ri­zação das car­reiras dos pro­fis­si­o­nais de saúde, dos seus sa­lá­rios e con­di­ções de tra­balho, com a apli­cação da de­di­cação ex­clu­siva no sen­tido de atrair e fixar tra­ba­lha­dores;

  • O in­ves­ti­mento em infra-es­tru­turas e a ren­ta­bi­li­zação dos re­cursos pú­blicos exis­tentes no sen­tido de di­mi­nuir a de­pen­dência com o sector pri­vado;

  • A aposta nos ser­viços de pro­xi­mi­dade, in­ves­tindo nos cui­dados de saúde pri­má­rios com a im­ple­men­tação de me­didas que as­se­gurem uma res­posta cé­lere e eficaz dos ser­viços pú­blicos de saúde, me­lho­rando o seu fun­ci­o­na­mento e or­ga­ni­zação e re­for­çando a ca­pa­ci­dade de saúde oral e vi­sual, saúde ma­terno-in­fantil e ju­venil e saúde mental, ser­viços de re­a­bi­li­tação e do­mi­ci­liá­rios;

  • O fim dos en­cer­ra­mento de hos­pi­tais e a aber­tura, sem adi­a­mentos dos novos hos­pi­tais de Lisboa Ori­ental e Sintra,com mais va­lên­cias e camas, sem que im­pli­quem o en­cer­ra­mento de ou­tras uni­dades.


In­te­ressa a quem tra­balha

In­ter­vindo no final da acção em de­fesa do SNS, que se re­a­lizou em Lisboa, Isabel Ca­ma­rinha as­se­gurou que «vamos con­ti­nuar a lutar para que se cumpra a nossa Cons­ti­tuição, para que a Saúde não seja um ne­gócio». Luta, deixou claro, que tanto é do in­te­resse de utentes e pro­fis­si­o­nais como de todos os tra­ba­lha­dores, já que, chamou a atenção, «os tra­ba­lha­dores por­tu­gueses e as suas fa­mí­lias são os que na União Eu­ro­peia mais sentem o de­sin­ves­ti­mento na Saúde e os que mais com­par­ti­cipam para as des­pesas no sector».

Do in­te­resse de quem tra­balha, é, do mesmo modo, o mês de luta que a CGTP-IN está a pro­mover até 15 de Ou­tubro, nas em­presas e lo­cais de tra­balho, nos ser­viços e na rua, e que cul­mina com duas ma­ni­fes­ta­ções em Lisboa e Porto. Nesse sen­tido, Isabel Ca­ma­rinha ex­plicou que entre os ob­jec­tivos da cam­panha estãoa va­lo­ri­zação das car­reiras e pro­fis­sões, o au­mento geral dos sa­lá­rios como emer­gência na­ci­onal (do SMN em 800 euros no ime­diato e em pelo menos 90 euros para todos os tra­ba­lha­dores), das re­formas e das pen­sões para dar res­posta a este brutal au­mento do custo de vida e re­dução do poder de compra.

 

PCP sempre pre­sente

Na pri­meira linha em de­fesa do SNS, o PCP es­teve re­pre­sen­tado na ma­ni­fes­tação por Ber­nar­dino So­ares, que ma­ni­festou o «em­penho dos co­mu­nistas por­tu­gueses» em com­bater para «re­forçar os di­reitos dos pro­fis­si­o­nais, as suas car­reiras e re­mu­ne­ra­ções, in­vestir o que tem de ser in­ves­tido e ga­rantir o fi­nan­ci­a­mento ne­ces­sário, apli­cando no SNS os re­cursos pú­blicos que hoje se des­tinam ao sector pri­vado, nos hos­pi­tais, nos cen­tros de saúde».