Centenário de Agostinho Neto, os caminhos da luta de libertação em África

No próximo dia 17 de Setembro passam precisamente 100 anos sobre o nascimento de Agostinho Neto, efeméride que o PCP não podia deixar de assinalar nesta Festa do Avante! contando com a participação (que o Partido agradece e valoriza) de representantes do MPLA, do PAICV, do PAIGC, da Frelimo e do MLSTP, as forças políticas que conduziram os seus povos à conquista da independência e com quem o PCP teceu fortes laços de amizade e solidariedade na luta contra o inimigo comum, o fascismo e o colonialismo português.

Vida e obra de Agostinho Neto encerram ensinamentos e motivos de inspiração para o prosseguimento da luta

 

Sobre África e os caminhos da sua libertação é aos nossos camaradas africanos que cabe a palavra principal. Foram os seus movimentos e partidos que, à custa de grandes sacrifícios, libertaram os seus povos das grilhetas coloniais e empreenderam o difícil mas exaltante caminho de construção de novos países independentes. São eles, cada um nas concretas situações dos seus países, que agem hoje para vencer definitivamente o atraso secular em que o colonialismo os mergulhara e para defender e afirmar o seu direito a um desenvolvimento soberano e de justiça social.

Na opinião do PCP vivemos no plano internacional tempos de grande instabilidade e incerteza que não são fáceis para as forças que lutam pela democracia, o progresso social e o socialismo. São tempos bem diferentes daqueles em que, tendo a URSS e o campo socialista como rectaguarda segura, a poderosa vaga libertadora que se seguiu à II Guerra Mundial pôs praticamente fim ao colonialismo.

Tempos em que a independência e a soberania dos Estados e até a própria paz mundial estão a ser postas em causa pelas grandes potências imperialistas e as organizações internacionais ao seu serviço como o FMI e o Banco Mundial.

Tempos em que se aprofunda o fosso entre ricos e pobres nos planos nacional e mundial, enquanto os flagelos da fome, da doença, do desemprego se propagam, as multinacionais arrecadam lucros fabulosos e as chamadas transições «energética» e «digital» estão a acelerar a corrida às riquezas do continente africano e a servir de pretexto para a imposição de refinados mecanismos de exploração e domínio neocolonial. Não é por acaso que a África tem sido tema destacado nas recentes cimeiras da União Europeia, do G7 e mesmo da NATO. Sim, tempos difíceis e em que se impõe ter presente e afirmar os valores e o élan revolucionário que esteve na origem dos processos de libertação africanos.

Vida inspiradora

Não duvidamos porém que, como a própria História ensina e a superação de insuportáveis contradições sociais exige, serão encontrados os caminhos de uma nova e vitoriosa vaga de avanço na emancipação nacional e social que ponha finalmente as imensas riquezas do continente ao serviço do desenvolvimento económico e do progresso social dos seus povos.

É com esta convicção – a convicção de um partido que reconhece que o processo libertador dos trabalhadores e dos povos é irregular e acidentado mas que em termos históricos avança para níveis superiores de libertação – que a vida e a obra de Agostinho Neto encerram ensinamentos e motivos de inspiração para o prosseguimento da luta, sempre inacabada, pela libertação da Humanidade das cadeias da exploração e da opressão de classe e nacional.

Nascido em 17 de Setembro de 1922 numa aldeia angolana; profundamente identificado com o sentir e a vida do seu povo como a sua notável obra poética espelha em poemas de grande beleza e tocante sensibilidade humana; patriota ardente que entregou toda a sua vida à causa libertadora do povo angolano; fundador e dirigente do movimento que conduziu uma luta armada heróica contra o colonialismo.

Primeiro Presidente da nova Angola livre e soberana, a República Popular de Angola, Agostinho Neto, com a sua inteligência, firmeza de princípios e coragem revolucionária teve um papel decisivo na construção e afirmação do MPLA como vanguarda do povo angolano, no combate ao racismo, ao tribalismo e ao regionalismo, na derrota das forças que, invadindo Angola pelo Norte (o regime sanguinário de Mobuto) e pelo Sul (os racistas sul-africanos), tentavam chegar a Luanda para impedir a proclamação da independência, combate decisivo em que as FAPLA, as Forças Armadas Populares de Libertação de Angola contaram com a ajuda solidária dos internacionalistas cubanos. Agostinho Neto ganhou por tudo isso o justo título de fundador da nação angolana.

Luta comum

Tal como o PCP, também Agostinho Neto sempre considerou que o povo português e o povo angolano eram aliados na luta comum contra o fascismo e o colonialismo português, pois as classes dominantes em Portugal exploravam e oprimiam ambos os povos. Perseguido pelo fascismo em Angola e em Portugal, conhecido a prisão por quatro vezes e tendo sido deportado para Cabo Verde, Agostinho Neto, ao mesmo tempo que organizava a luta do seu povo, participava simultaneamente na luta do povo português nomeadamente na actividade do MUD Juvenil e na luta em defesa da paz e contra a NATO.

É com legítimo orgulho que recordamos as relações de estreita amizade e cooperação que a luta comum forjou entre o PCP e o MPLA e que tiveram no dizer de Álvaro Cunhal «um dos momentos mais altos» na arriscada operação organizada pelo PCP a pedido do MPLA, para retirar clandestinamente Agostinho Neto de Portugal e conduzi-lo para junto dos seus companheiros para dirigir a sua luta. Relações que são inseparáveis da posição de princípio dos comunistas portugueses em relação à questão colonial, o único partido que sempre reconheceu o direito dos povos das antigas colónias portuguesas à independência e se bateu pelo fim das criminosas guerras coloniais. O único partido a estar solidariamente presente em Luanda em 11 de Novembro de 1975 na proclamação da independência de Angola.

Agostinho Neto foi um amigo sincero do povo português e dos comunistas portugueses. Evocando a sua memória o PCP lembra também outros heróicos combatentes pela independência dos seus países como Amílcar Cabral e Eduardo Mondlane, vilmente assassinados pela PIDE, assim como Samora Machel primeiro Presidente da República Popular de Moçambique, e também eles dirigentes destacados do movimento de libertação africano. E sobretudo não esquece que a Revolução de Abril e a conquista da independência pelos povos das colónias portuguesas são inseparáveis e que, se o império colonial português foi o último a desaparecer, foi porque o fascismo contou com o apoio da NATO para prolongar a opressão do povo português e as guerras coloniais.

Quando hoje a classe dominante pretende, como está a acontecer em relação à guerra no Leste da Europa, fazer passar por pacífica e defensiva esta aliança agressiva de que o Portugal fascista foi em 1949 membro fundador e que está a estender os seus tentáculos a todos os continentes, creio ser necessário e oportuno recordá-lo.

Termino renovando a convicção de que os povos africanos, inspirados pela vida e obra de revolucionários como Agostinho Neto, superando atrasos e dificuldades, avançarão pelo caminho do progresso social e da paz. O PCP, partido patriótico e internacionalista, não lhes faltará com a sua amizade e solidariedade.

 

(Contribuição do PCP no debate «Centenário de Agostinho Neto – os caminhos da luta de emancipação em África», realizado no dia 4 de Setembro, no Espaço Internacional da Festa do Avante!, e proferida por Albano Nunes, membro da Comissão Central de Controlo do PCP.

Subtítulos da responsabilidade da redacção)

 

Havemos de voltar

Às casas, às nossas lavras

às praias, aos nossos campos

havemos de voltar

 

Às nossas terras

vermelhas do café

brancas de algodão

verdes dos milharais

havemos de voltar

 

Às nossas minas de diamantes

ouro, cobre, de petróleo

havemos de voltar

 

Aos nossos rios, nossos lagos

às montanhas, às florestas

havemos de voltar

 

À frescura da mulemba

às nossas tradições

aos ritmos e às fogueiras

havemos de voltar

 

À marimba e ao quissange

ao nosso carnaval

havemos de voltar

 

À bela pátria angolana

nossa terra, nossa mãe

havemos de voltar

 

Havemos de voltar

 

À Angola libertada

Angola independente

 

Agostinho Neto