Milhares e milhares de trabalhadores responderam ao apelo da CGTP-IN para fazer de 7 de Julho um dia nacional de luta e confluíram para a Praça Marquês de Pombal, em Lisboa. Sob um sol abrasador, a manifestação dirigiu-se para junto da Assembleia da República, enchendo as ruas com as exigências que, durante o último mês, tinham motivado greves, plenários e outras acções, em empresas e sectores. Com a mesma determinação, ficou garantido que a luta vai continuar.
No dia 8, a CGTP-IN saudou «calorosamente» os trabalhadores e o movimento sindical unitário que «fizeram uma extraordinária manifestação», caracterização que reflecte a muito forte mobilização. Pouco antes das 16h30 da passada quinta-feira, quando chegaram os primeiros grandes grupos de manifestantes (Interjovem e distrito do Porto), Libério Domingues, da Comissão Executiva da Intersindical, subiu ao palco móvel para apelar a que se deslocassem mais «lá para a ponta», porque a cauda da manifestação estava ainda no Marquês de Pombal.
A confederação reafirmou, nessa saudação, que «a luta vai continuar nos locais de trabalho, empresas e serviços, tendo já expressão nas lutas marcadas, em torno das reivindicações concretas dos trabalhadores e pela exigência de outro rumo para o País, de progresso e justiça social».
Naquela tarde, em que os termómetros na capital subiram aos 35 graus, ficou muito clara a determinação de não abrandar na luta.
Esta disposição fora já comprovada: em muitas das faixas e bandeiras, transportadas ao som de palavras de ordem pelas ruas Braamcamp e Alexandre Herculano, passando pelo Largo do Rato, para descerem a Rua de São Bento, reconhecemos vários nomes de empresas e sectores com lutas realizadas nos meses mais recentes.
O esforço de participação na manifestação – fazendo greve, viajando nalguns casos centenas de quilómetros, tornando a combatividade mais forte que o calor – representou também uma firme garantia para as próximas batalhas.
«Não aceitamos!»
A avaliação da situação no País foi no mesmo sentido. «Saímos à rua e estamos em luta porque não aceitamos a degradação das condições de vida e de trabalho, ao mesmo tempo que nada trava a escalada da especulação e dos lucros colossais das grandes empresas», disse a Secretária-geral da CGTP-IN, que interveio no final da manifestação, perante milhares de trabalhadores concentrados ao sol e nas poucas zonas de sombra, nas proximidades da escadaria do Parlamento – enquanto muitos outros não conseguiram chegar mais perto e ficaram parados, ocupando boa parte da Rua de São Bento, para lá dos limites do palácio.
Isabel Camarinha – que foi precedida de uma breve intervenção de Filipe Machado, dirigente da Interjovem – assinalou que «saímos à rua num momento em que ganha expressão o aumento da exploração».
«Primeiro, à boleia da pandemia, agora, com as sanções e a guerra, está em marcha uma tentativa de assalto aos direitos e aos salários, às pensões e aos serviços públicos», mas os trabalhadores respondem com «a grande participação na acção de luta nacional, que iniciámos no dia 27 de Maio, pelo aumento dos salários e das pensões, contra a subida do custo de vida e o ataque aos direitos, e que tem hoje esta grande manifestação».
A dirigente realçou que a acção de luta nacional «encheu o mês de Junho e a primeira semana de Julho, com dezenas de greves e paralisações, centenas de plenários em todos os sectores, muitas acções de luta à porta das empresas e serviços, do sector público e privado, das associações patronais e do Governo».
«Estamos em luta – sublinhou Isabel Camarinha – porque não aceitamos o aprofundamento deste modelo, que tira ao trabalho para dar ao capital, que agrava as desigualdades, que amarra o País às opções políticas da maioria PS e dos partidos da política de direita, da União Europeia e dos interesses instalados dos mais ricos e poderosos». E «estamos na rua e em luta, porque esta nossa acção é determinante para forçar a mudança, para construir um país mais justo e mais desenvolvido».
De igual forma, na Resolução, aprovada por aclamação depois das intervenções, os manifestantes declararam «o compromisso de continuar a lutar pelas respostas às suas reivindicações», «reforçar a unidade e continuar a intensificar a luta pela valorização do trabalho e dos trabalhadores e pela resposta aos problemas do povo e do País».
Conversa fiada de patrões e Governo
O patronato persiste nos baixos salários e na precariedade, «nomeadamente em sectores com milhões de lucros», chora «lágrimas de crocodilo pela suposta falta de trabalhadores», mas oferece «condições de miséria», a quem trabalha, «sejam trabalhadores de origem portuguesa ou imigrantes» – acusa-se na Resolução, denunciando outras contradições entre afirmações e prática.
O Governo PS «apregoa a sua preocupação com a vida dos trabalhadores e suas famílias, dos reformados e pensionistas», mas continua «a recusar o aumento dos salários e a valorização das carreiras e profissões, nomeadamente dos trabalhadores da Administração Pública», e mantém «a obsessão pela redução do défice e o insuficiente investimento nos serviços públicos e funções sociais do Estado, com consequências que começam a ser cada vez mais visíveis».
Proclama o Governo que «pretende assegurar melhores condições de vida, melhores salários, estabilidade no emprego e conciliação com a vida pessoal e familiar», mas não revoga e mantém «as normas gravosas da legislação laboral que agridem os trabalhadores e permitem ao patronato acentuar a exploração».
Na sua proposta de alteração à legislação laboral, o Governo do PS «não dá resposta às nossas reivindicações de revogação das normas gravosas da legislação laboral – o que, por si só, conduz ao agravamento da situação dos trabalhadores» – e «vem introduzir aspectos que ainda agravam mais o desequilíbrio das relações laborais a favor do patronato», como sucede com a limitação da actividade sindical na empresa. Nesta matéria, «o Governo, ao invés de clarificar, promove a confusão, para o patronato aproveitar e tentar limitar o direito de livre acesso aos locais de trabalho».
Isabel Camarinha considerou que foi «a pensar no capital, em cedência aos patrões, que o Governo agendou na Assembleia da República a sua proposta de alterações à legislação laboral».
A Secretária-geral da CGTP-IN contestou «a propaganda» sobre a intenção do Governo de «aumentar os salários por via de um acordo na Concertação Social», porque, «enquanto não for revogada a norma da caducidade e reintroduzido o princípio do tratamento mais favorável, o patronato terá esses instrumentos para travar o aumento dos salários, para negar a valorização das carreiras e profissões, para tentar impedir melhores condições de vida e de trabalho», uma linha que «só com a luta os trabalhadores têm contrariado».
«A contratação colectiva é o espaço fundamental do tão proclamado “diálogo social”», sublinhou a dirigente, acusando: «O que eles querem concertar, o diálogo que querem promover é o da retirada de direitos, é o de mais mecanismos para a exploração». Contra isso, frisou, «aqui nos têm em luta».
Saudação solidária do PCP
Com «uma presença solidária» na manifestação, o Secretário-geral do PCP dirigiu «uma saudação a estes homens, mulheres e jovens, que aqui estão, pela defesa dos seus interesses e direitos, pela valorização dos seus salários, pelo respeito pelos serviços públicos, designadamente o SNS e a escola pública, num quadro muito difícil», já que «os trabalhadores estão a ver, cada vez mais, o custo de vida a aumentar significativamente».
Jerónimo de Sousa, em declarações aos jornalistas, mostrou-se «profundamente preocupado, porque o primeiro-ministro, na altura da apresentação do Orçamento, dizia que a inflação seria meramente conjuntural e ontem, no debate realizado na Assembleia, reconheceu que a inflação era para ficar». Ora, isto «são más notícias para quem vive do seu salário, da sua reforma e da sua pensão».
«Este sentimento de injustiça e de indignação manifestou-se aqui claramente, a um dia de semana, nesta grande manifestação». E é também «uma demonstração de que, afinal, o PCP tinha razão, tendo em conta aquilo que se pretendia no Orçamento anterior». Agora «há um agravamento claro, na dimensão salarial e social», e «o Governo, hoje com uma maioria absoluta, continua a impedir que se avance numa solução».
Depois de o PS ter apelado a uma maioria absoluta, «o povo português tem o direito de perguntar para que é que está a servir essa maioria absoluta».
Para o PCP, «a questão dos salários é fundamental para os trabalhadores portugueses», os quais, «cada vez que vão ao supermercado, vêem o dinheiro desaparecer rapidamente, com uma vida mais cara». «Vemos os grupos monopolistas dos combustíveis ou da energia, a amassar fortunas, com lucros fabulosos, enquanto se nega o direito a uma vida mais digna por parte dos trabalhadores», protestou Jerónimo de Sousa.
O Secretário-geral esteve acompanhado por Fernanda Mateus, Francisco Lopes, Manuela Pinto Ângelo e Paulo Raimundo, membros dos organismos executivos do Comité Central do PCP.