EUA e UE: da unidade aparente ao agudizar de contradições

Contrariando a posição de Washington, a Alemanha considera vital para a Europa comprar gás, petróleo e carvão da Rússia. No mesmo sentido, a UE anunciou que não tenciona parar, pelo menos para já, as importações energéticas oriundas da Rússia. Os EUA insistem na agudização do conflito, mas do lado de cá do Atlântico nem todos alinham da mesma maneira.

Alemanha contraria posição dos EUA em relação ao petróleo e gás russos

É impossível para a Europa garantir o abastecimento de combustíveis de que necessita sem contar com as importações de energia da Rússia, advertiu o chanceler federal alemão, Olaf Scholz. O chefe do governo de Berlim – uma coligação liderada pelo Partido Social-Democrata – contrariou a posição dos EUA e de alguns países da União Europeia de suspender a compra de recursos energéticos russos em resposta à intervenção militar de Moscovo na Ucrânia.

Scholz afirmou, numa declaração escrita publicada por vários meios de informação alemães, no dia 7, que a compra de gás, petróleo e carvão é essencial para garantir «a vida diária dos cidadãos» na União Europeia. «O fornecimento de energia para a produção de calor, mobilidade, electricidade e indústria na Europa não pode ser garantido neste momento de outra forma», sublinhou o governante, esclarecendo que o seu governo trabalha «para encontrar alternativas».

No mesmo sentido pronunciaram-se vários ministros alemães, entre os quais a titular dos Negócios Estrangeiros, Annalena Baerbock; o da Economia, Robert Habeck; e o das Finanças, Christian Lindner. Do partido Os Verdes, Baerbock considerou que seria contra-producente cortar a aquisição de gás, petróleo e carvão se, depois, «em três semanas descobrimos que só temos electricidade para alguns dias».

EUA e Reino Unido

boicotam petróleo, UE não

O presidente dos EUA, Joe Biden, anunciou o boicote das importações de petróleo da Rússia. «Proibimos todas as importações de petróleo, gás e energia russos. Isso significa que o petróleo russo já não será aceite nos portos dos EUA», disse, na terça-feira, 8.

Segundo Biden, a decisão conta com o apoio de ambos os partidos no Congresso (Democrata e Republicano). Explicou que a medida foi adoptada em estreita consulta com os aliados de Washington, incluindo os da Europa. Os EUA «compreendem» que muitos deles podem não estar em condições de juntar-se a esta proibição. Acrescentou que o boicote não está isento de custos para o povo dos EUA, com a subida do preço do combustível.

O presidente norte-americano pediu ao Congresso para aprovar a lei autorizando o fornecimento à Ucrânia de 12 mil milhões de dólares em «assistência» militar, económica e humanitária. E informou que os EUA estão a trabalhar com os parceiros europeus para «desenvolver uma estratégia de longa duração para reduzir a dependência da energia russa».

Minutos depois do anúncio do boicote dos EUA ao petróleo russo, Bruxelas fez saber que não tenciona interromper, pelo menos no imediato, as importações energéticas oriundas da Rússia. O chefe da diplomacia da União Europeia, Josep Borrell, confirmou que «não vamos proibir as importações de energia russa», clarificando que «não acompanhamos Biden neste assunto».

Já o Reino Unido vai deixar de importar crude e produtos petrolíferos russos até ao final de 2022, anunciou o ministro da Economia e da Energia, Kwasi Kwarteng. «Esta transição vai dar às empresas e cadeias de fornecimento mais tempo para substituírem as importações russas, que representam oito por cento da procura no país», indicou.

Entretanto, no dia 5, a agência de notação financeira Moody’s baixou em dois níveis a classificação da dívida ucraniana e anunciou que a mesma permanece sob avaliação, podendo cair ainda mais no futuro.

Assassinado em Kiev

negociador ucraniano

O Ministério da Defesa da Ucrânia confirmou no dia 6 a morte de Denis Kireev, um membro da delegação de Kiev que participou nas duas primeiras rondas de negociações com delegados da Rússia, das três já realizadas, em território da Bielorrússia. Nas fotografias dessas reuniões, aparece junto de outros membros da delegação ucraniana.

Kireev, que ocupou vários cargos relacionados com finanças, foi presumivelmente preso por acusações de traição, noticiou a agência russa Sputnik.

O negociador foi assassinado a tiro perto do centro da capital, Kiev, de acordo com vários meios de informação ucranianos. Mas as causas da sua morte não foram confirmadas pelas autoridades.

Fontes ucranianas informaram que Kireev foi preso pelo Serviço de Segurança da Ucrânia (SBU), acusado de traição. Um deputado da Rada Suprema, Alexandr Dubinski, revelou que os agentes policiais mataram o perito em finanças durante a sua detenção.

Kireev desempenhou funções como vice-presidente da direcção da Caixa de Poupança Estatal da Ucrânia, entre 2010 e 2014, e foi também membro da direcção do Banco Nacional de Exportação-Importação da Ucrânia, entre 2006 e 2012.

 

Entre a escalada e o desanuviamento

Além de enviar toneladas de armas e milhões de dólares às forças militares ucranianas, os EUA continuam a aumentar o número de militares na Europa, a pretexto da guerra. O secretário de Estado de Defesa, Lloyd Austin, revelou em Bruxelas que foram destacados para a Europa mais 500 militares norte-americanos. O objectivo é aumentar as forças militares junto às fronteiras da Ucrânia.

O recente destacamento de tropas elevou o número de militares norte-americanos na Europa, tanto em missões rotativas como permanentes, para cerca de 100 mil efectivos.

Mas também neste aspecto particular, há quem não aposte na escalada do conflito. O ministro dos Negócios Estrangeiros da Áustria, Karl Nehammer, anunciou que o país permanecerá neutral face ao conflito na Ucrânia, pois «a neutralidade austríaca presta um bom serviço». Após lamentar que a Europa viva actualmente uma das piores crises da sua história desde a II Guerra Mundial, Nehammer acrescentou que a Áustria, foi, é e permanecerá neutral.

Previamente, a líder do Partido Social-Democrata da Áustria, Pamela Rendi-Wagner, manifestou-se totalmente a favor da posição assumida por Viena e considerou que o país deve manter uma neutralidade activa e comprometida com a diplomacia e a paz.

Outro país da União Europeia, a Hungria, também membro da NATO, decidiu vedar o território húngaro ao transporte aéreo ou terrestre de armas para a Ucrânia mas autorizou o envio de tropas da Aliança Atlântica para o oeste do país. O primeiro-ministro húngaro, Viktor Orbán, justificou a sua decisão com a necessidade de zelar pela segurança do seu país e de manter a Hungria «fora da guerra».

Na segunda-feira, a primeira-ministra da Suécia terá afastado a possibilidade de o país se candidatar à NATO. Magdalena Andersson realçou que este passo, para mais tomado neste momento, poderia criar ainda maiores problemas de segurança na região: «Se a Suécia escolhesse candidatar-se à NATO enquanto esta situação decorre, iria haver uma desestabilização nesta área da Europa e aumentar a tensão.»





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