Alegria e confiança no espectáculo comemorativo do Centenário do PCP

A cidade do Porto acolheu, no domingo, 28, um espectáculo único, de uma beleza singular, comemorativo do Centenário do PCP, onde se revelou a importância da cultura como componente intrínseca da democracia e dos factores da transformação da realidade. Às diversas expressões artísticas, da poesia à dança, à música clássica e popular, ao jazz, ao fado e às mornas, juntou-se a força da luta dos trabalhadores e do povo.

«Continuaremos certos que o futuro tem Partido, pelo seu ideal, pelo seu projecto, porque esta é força da esperança que está todos os dias ao teu, ao vosso e ao nosso lado em todos os domínios da nossa vida colectiva», sublinhou o Secretário-geral do PCP.

A cultura é um factor de democratização da sociedade

Muitas iniciativas comemorativas dos 100 anos da história do PCP foram pontuadas por momentos culturais. Mas nenhum como este. No Teatro Rivoli, um dos importantes polos culturais da cidade do Porto, situado na Praça D. João I, estiveram muitas centenas de pessoas vindas de todo o País.

Foi com um arranjo original de A Internacional – hino magnificamente interpretado por Alexandre Branco (flauta), Hugo Brito (violino) e Luís Pedro Madeira (acordeão) – que se iniciou o espectáculo. «De pé, ó vítimas da fome! De pé, famélicos da terra! Da ideia a chama já consome. A crosta bruta que a soterra», acompanhava a plateia.

Seguiu-se a intervenção de Jerónimo de Sousa, Secretário-geral do PCP, muito centrada na valorização «do papel dos homens e mulheres das artes e da cultura». «Ao longo de praticamente toda a sua história, o nosso Partido tem acompanhado e intervindo sobre as questões da cultura, exprimiu publicamente opinião acerca das dinâmicas e políticas culturais, reivindicou a democratização da cultura e combateu a sua elitização e isolamento em relação às aspirações populares», afirmou.

Deu particular atenção às últimas quase cinco décadas de regime democrático, que «mudou muito a face cultural do País», nomeadamente as «condições de acesso e fruição», as «expectativas e reivindicações em relação à cultura», os «consumos e práticas culturais», em «processos que envolvem significativas alterações nos níveis de escolarização e profundas mudanças sócio-culturais».

Sem esquecer e valorizando o que se avançou, o Secretário-geral do PCP considerou que se «poderia e deveria ter avançado muito mais». «Não foi essa a opção das políticas de direita empreendidas por sucessivos governos, dirigidos maioritariamente ora do PS, ora do PSD, agravando até limites insustentáveis a asfixia financeira, a instrumentalização clientelar, a desresponsabilização do Estado, a elitização, a integração internacional subalterna e estéril, a entrega ao mercado das políticas culturais», criticou.

Alertou, também, para o «agravamento» da situação social e profissional de muitos trabalhadores artísticos, em particular na área dos trabalhadores dos espectáculos, onde se generalizou a instabilidade, a precariedade e a insegurança», tendo manifestado a «solidariedade» do PCP a «todos os profissionais da cultura» e reafirmado que «para nós a cultura não é, nem pode ser, descartável», pois representa «um potencial e um valor insubstituíveis de desenvolvimento, de libertação e emancipação, individual, social e de afirmação nacional».

«Aqui estamos, cem anos cumpridos de vida, e aqui continuamos preparados para prosseguir a luta, sejam quais forem as circunstâncias em que tenhamos que intervir e assumir todas as responsabilidades que o povo nos queira confiar nos urgentes combates de agora e nos combates do futuro, pela elevação das condições de vida e de trabalho do nosso povo, pelo desenvolvimento do País», assegurou Jerónimo de Sousa.

Homenagem à cultura
Ao palco subiram depois os Coralistas do Porto, com o pianista Fausto Neves, para desempenhar Va Pensiero, também conhecido como o Coro dos Escravos Hebreus, do terceiro acto da ópera Nabucco, de Giuseppe Verdi.

Após este momento emocionante, entra em cena um operário, interpretado por André Levy, que agarra uma corrente que circunda o coro, coloca-a em cima de uma bigorna e, após três marteladas, quebra aquele símbolo de opressão. Em uníssono, os membros do coro, dirigidos pelo maestro José Luís Borges Coelho, batem com os pés no chão. Ouve-se a música Acordai, de Fernando Lopes Graça. «Acordai; acordai; raios e tufões; que dormis no ar; e nas multidões; vinde incendiar; de astros e canções; as pedras do mar; o mundo e os corações», são palavras, escritas por José Gomes Ferreira, que jamais se esquecerão.

Por ambos os lados do palco entram percussões, mas também cavaquinhos, concertinas, gaita de foles, do projecto Terra Solta, grupo de Coimbra composto por Camila Dias, Carolina Rocha, Diogo Lobo, Inês Bártolo, João Monteiro, João Rodrigues, Maria Dias, Rita Brás e Tiago Ferreira, proporcionando um momento de Festa de liberdade, de música e de dança.

A voz-off de André Levy, que vai apresentando o espectáculo, informa: João Monge, poeta e dramaturgo, escreveu para aquele momento marcante das comemorações do Centenário do PCP um texto original em oito partes (O primeiro dia; Um punhado de trigo; mortalhas e lápis de cor; Livro em branco; Casa sem morada; O dia mais bonito; O livro da lei; O futuro tem Partido), intitulado 100 anos que passaram, 100 anos que hão-de vir, lido – com grande emoção, e muitas vezes de punho bem erguido – pela actriz Maria João Luís.

Volta a Música com Paredes de Vidro (Alexandre Weffort, flauta; Carlo Canhoto, saxofone; Fausto Neves, piano; Hugo Brito, violino; Manuel Pires da Rocha, violino), com os temas La Varsovienne (Plawinsky), Cantar Alentejano (José Afonso), Canción del Poder Popular (Julio Rojas/Luis Advis) e El Pueblo Unido Jamás Sera Vencido (Quilapayún). Este colectivo adaptou o nome do projecto que produziu em 2013, dedicado a Álvaro Cunhal, na celebração do seu centenário.

Momentos singulares
José Gomes Ferreira disse um dia que «nunca ouviu cantar um alentejano sozinho...». Foi o que ali aconteceu, com a actuação do Grupo Coral dos Mineiros de Aljustrel, que ali apresentou três modas, destacando-se o Hino dos mineiros, que evoca uma das profissões mais difíceis, duras e perigosas do mundo. Os temas deram lugar à leitura dos poemas Elogio do Comunismo, de Bertolt Brecht, Entre patrões e operários, de Armindo Rodrigues, e Antes que seja tarde, de Manuel da Fonseca, por Olga Dias.

Seguiu-se a performance de Paulo Vaz de Carvalho (guitarra), Pedro Marques (voz) e Manuel Pires da Rocha (violino), que interpretaram temas de José Afonso – Tinha uma sala mal iluminada, e de Adriano Correia de Oliveira – As balas. De seguida subiu ao palco o pianista Carlos Azevedo, grande interprete de jazz, que «encheu» a sala com um notável improviso de Avante, camarada!. Dedicou a sua actuação a Manuel Jorge Veloso, músico, compositor e crítico musical português, militante do PCP, falecido em Novembro de 2019.

Mais adiante, os 60 anos da histórica fuga de Caxias, que ocorreu a 4 de Dezembro de 1961, foram assinalados por Catarina Moura, acompanhada por Fausto Neves (piano) e Manuel Pires da Rocha (violino), com o Hino de Caxias. «Vá camarada mais um passo; que já uma estrela se levanta; cada fio de vontade são dois braços; e cada braço uma alavanca», cantou também o público.

Avança-se em voz-off com mais motivos de interesse: «No dia 6 de Março de 1921, após a reunião que deu origem ao Partido, cantou-se o Fado. 100 anos passados, também é no Fado que continuamos», com Hélder Moutinho, fadista e poeta português, acompanhado por Ricardo Pereira (guitarra portuguesa), Miguel Silva (viola) e Ciro Bertini (baixo). Amor sem lugar foi um dos temas que levantou toda uma sala com um gigantesco aplauso.

Celebrar a liberdade
Outro momento «mágico» aconteceu: Bruno Costa, acompanhado porLuís Pedro Madeira, tocou Verdes Anos, da autoria de Carlos Paredes, para sentir os movimentos expressivos dos dançarinos Júlio Cerdeira e Cátia Nicolau. Num espetáculo sem interrupções, entra a Marcha do MFA, tocada pela Banda Filarmónica Matosinhos-Leça, dirigida pelo maestro Arnaldo Costa. São distribuídos por todos cravos de Abril, e todos cantam, num maravilhoso coro, Grândola, Vila Morena, que acabou por se tornar o «hino» da Revolução de Abril. Seguiu-se mais um momento de poesia, com o actor Júlio Cardoso a dar voz a grandes escritores portugueses profundamente ligados ao 25 de Abril de 1974: José Saramago – Manual de Pintura e Caligrafia; Sophia de Mello Breyner Andresen – 25 de Abril; Ary dos Santos – As portas que Abril abriu.

Abril foi também liberdade para outros povos. As «mornas» de Cabo Verde, símbolo de um povo e de uma música de sentimentos, património imaterial da humanidade, estiveram igualmente em palco pela voz da Maria Alice, acompanhada ao piano por Humberto Ramos.

Os sons quentes, verdadeiramente ricos e únicos, dão lugar a um outro grande momento de diversidade cultural, proporcionado pelo raper Nuno Teixeira – FUSE, referência obrigatória da cultura hip-hop nacional. Paixão que fulmina e Provavelmente acrescentaram ritmos fortes.

Quase a terminar, TIM, o baixista e vocalista dos Xutos & Pontapés, manifestou grande felicidade por estar naquela «festa fantástica». Ali tocou Voar, Homem do Leme e Postal dos Correios, temas tão queridos para um público maravilhoso. Entre canções, assinalou a importância da Festa do Avante!, uma «referência» no panorama nacional e internacional.

Após a interpretação dos temas Firmeza e Jornada, pelos Coralistas do Porto, ao palco subiram todos os artistas. Acarinhados deste o primeiro segundo, receberam um grandioso e contínuo aplauso. Em ambiente de alegria entraram 10 jovens com bandeiras vermelhas e uma do PCP, enquanto Catarina Moura, acompanhada por Fausto Neves e Manuel Pires da Rocha, interpreta o tema Avante, Camarada!. Num enorme ecrã lia-se: «Liberdade, Democracia, Socialismo. O futuro tem Partido».

«Assim se vê a força do PCP», entoavam, firmes, unidos e combativos, aqueles que assistiram a uma espetáculo único.

 

O Futuro tem Partido

(parte 8, do texto «100 anos que passaram, 100 anos que hão-de vir», de João Monge)

- Pai!?

- Diz, João!

- Lembras-te quando foste a Lisboa, à Rua da Madalena?

- Lembro-me muito bem! Foi há 100 anos, mas lembro-me como se tivesse sido ontem.

- Quando chegaste a casa falaste-me de grilhetas, correntes de amarrar, e puas de colar ao chão.

- Explicaste-me isso enquanto jantávamos uma sopa de couve com batatas…

- É verdade, meu filho! Foi a luta e a memória que nos trouxeram aqui.

- E agora, pai? Conta-me tudo…

- Agora, ainda não nos livrámos delas… mas podemos cerrar os punhos à porta da fábrica e erguê-los em todas as praças.

- Somos todos iguais na hora do nascimento. Um minuto depois parece que temos o destino traçado.

- Uns, como o pai, têm de trabalhar muito para essa sopa que tens à frente. Outros têm quem lhes ponha a mesa com comidas e vinhos finos. Já não são nossos donos, mas ainda são donos de grande parte do nosso trabalho.

- Achas que um dia deixará de ser assim?

- Tenho a certeza, meu filho! Tenho a certeza!

- Mas quando, pai? Quando?

- Não sei, João! Apenas sei que hoje é o primeiro dia dos próximos 100 anos.

- Pai, vou fazer um desenho desse dia!

- Faz! Quando estiver terminado leva-o para a nossa casa, aquela que tem a bandeira à entrada, e pendura-o na parede por cima da estante. Assim, quando algum de nós estiver desanimado poderá olhar para o teu desenho e sorrir com a certeza que o Futuro tem Partido.

 



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