Razões redobradas para a luta com o PCP sempre do lado certo

«Continuaremos do lado certo da luta, ao lado dos trabalhadores e do povo, porque é com eles e com a defesa dos seus direitos e interesses o nosso primeiro e principal compromisso», garantiu Jerónimo de Sousa, dia 28, num comício realizado em Évora, o primeiro após a proposta de Orçamento do Estado ter sido chumbada na Assembleia da República, na véspera.

O magnífico Teatro Garcia de Resende encheu-se para acolher o comício do PCP: ali esteve gente de todas as idades e percursos diversos, unidos pela determinação em dar resposta aos graves problemas que afectam o País e o seu povo. Em pancartas distribuídas por alguns participantes eram visíveis exigências centrais do PCP para responder a esses problemas: o aumento dos salários, o efectivo reforço do Serviço Nacional de Saúde, a garantia de creche gratuita para todas as crianças, a urgente regulação dos preços dos combustíveis. No palco, a servir de pano de fundo, um lema que, sendo de hoje, seria válido para os cem anos de história e luta do PCP: «Ao teu lado todos os dias!».

De tudo isto falou o Secretário-geral do Partido na sua intervenção, naturalmente muito centrada na questão do Orçamento do Estado e na situação decorrente do seu chumbo. A este propósito, Jerónimo de Sousa respondeu a quem questiona se não teria sido melhor deixar passar o Orçamento «para evitar uma crise política», lembrando que nada obriga a que desta situação decorra a dissolução da Assembleia da República e a convocação de eleições, como nada impede que o Governo em funções «responda ao que tem de responder no mais imediato». Além disso, acrescentou, as propostas do PCP – que o Governo recusou, uma após outra – não são factor de crise, antes pelo contrário, correspondem às aspirações do povo. É a ausência de resposta que «traz crise e instabilidade para casa de cada um», garantiu.

Após realçar aquilo a que o Governo não quis dar resposta, Jerónimo de Sousa realçou que «já se levanta a ponta do véu» acerca do que conduziu à rejeição do Orçamento, pela voz do próprio primeiro-ministro, no discurso de encerramento do debate parlamentar, quando pediu «uma maioria estável e duradoura para o PS». Ou seja, acusou o dirigente comunista, «não há Orçamento porque o PS quer uma maioria absoluta para, sem condicionamentos, não responder aos problemas do País e poder livremente manter os seus compromissos com o défice e o grande capital, em prejuízo do que interessa aos trabalhadores e ao povo».

Da mesma forma que «quem escancara as portas à direita, quem lhe estende a passadeira vermelha, é quem não quer dar respostas aos problemas com que o povo está confrontado».

Consequências e ilações

O Orçamento do Estado não está destinado a ser rejeitado, desde que contenha «as respostas de que o País precisa». Para Jerónimo de Sousa, o Governo «deve retirar ilações» do que aconteceu e optar: apresenta uma nova proposta de OE e assume «os compromissos necessários para além dele» ou então continua a recusar «o que faz falta ao País» e retira daí definitivamente as suas conclusões.

Também o Presidente da República terá de assumir, «de forma clara e com brevidade», as inevitáveis consequências da sua opção de dissolver a Assembleia da República e convocar eleições antecipadas, caso a mantenha. Lembrando que nada obriga a que tal suceda, se for essa a posição de Marcelo Rebelo de Sousa, que tanto a promoveu e anunciou, que seja tomada rapidamente, pois não seria compreensível que, depois de tudo o que foi dito, se arrastasse o processo para «favorecer estratégias que são estranhas aos interesses do povo português».

Se o PCP «não se bate por eleições», o Secretário-geral destaca que também não as teme e tem «razões para as encarar com confiança»: aquela que emana de um «percurso de intervenção que pôs sempre, mas sempre, em primeiro lugar», os interesses, direitos e aspirações dos trabalhadores e do povo.

Como uma vez mais ficou evidente na discussão do Orçamento do Estado para 2022.

Responder ao que falta

Distanciando-se dos que, durante o debate orçamental e para lá dele, procurarem esconder os conteúdos do Orçamento e da política do Governo atrás da ameaça de «crise» e «instabilidade», insistiu em recolocar o debate «em torno do que interessa»: do salário e da pensão que não chega ao fim do mês, dos direitos que são roubados por causa do cutelo da caducidade da contratação colectiva, da defesa do Serviço Nacional de Saúde, dos direitos dos pais e das crianças, da garantia dos direitos à habitação, aos transportes e à mobilidade, dos caminhos para uma maior justiça fiscal, da dinamização da actividade económica, da valorização da produção nacional enquanto factor estratégico para o desenvolvimento do País.

O que é incompreensível, garante, não é a posição do PCP, mas a razão pela qual, «havendo meios e condições para o fazer, o Governo recusa respostas e soluções para responder às exigências de uma vida melhor».

Antes do Secretário-geral, falou Patrícia Machado, da Comissão Política e responsável pela Organização Regional de Évora do PCP, exemplificando com situações do distrito de Évora o que Jerónimo de Sousa diria depois. Denunciando investimentos que tardam, serviços públicos que definham e direitos que se degradam, Patrícia Machado reafirmou que, também ali, é com o PCP que as populações contam para defender a região. O caso do Hospital Central do Alentejo é disto exemplo maior, com o PCP a ser fundamental para garantir que das promessas se passava, como passou, à obra concreta.

Rita Anjos, da JCP, revelou a existência de escolas a aguardar obras há mais de uma década, os jovens trabalhadores das fábricas e dos campos com salários baixos e vínculos precários, as rendas elevadas, as dificuldades em constituir família, os transportes que faltam e que obrigam muitos ao isolamento a partir de certa hora e aos fins-de-semana.

Antes das intervenções, Nuno do Ó, Ivo Cruz e José Russo evocaram canções e poemas de resistência e luta – a mesma que, em condições diversas, prossegue hoje e no futuro por acção dos comunistas e do seu Partido.

Se não há Orçamento
é porque o Governo não quis

«E perguntámos o que é que o aumento do Salário Mínimo Nacional que propusemos e defendemos tem a ver com crise política. Por que caminhos é que a revogação da caducidade da contratação colectiva pode conduzir a uma crise? Como é que medidas para defender o SNS e valorizar a carreira e as condições de trabalho dos médicos, enfermeiros e de outros profissionais de saúde podem provocar uma crise política? (...)

O que milhões de portugueses não compreendem é porque, havendo meios e condições para o fazer, o Governo recusa respostas e soluções para responder às exigências de uma vida melhor.

O que os portugueses não compreendem é que as horas extraordinárias que um trabalhador faz não sejam pagas pelo justo valor, porque o Governo do PS não quer afrontar os interesses do capital.

Os portugueses não compreendem que as centenas de milhar de trabalhadores da Administração Pública depois de mais de uma dezena de anos a perder poder de compra do seu salário continuem a não o ver recuperado porque o Governo dá prioridade ao défice.

Os portugueses não compreendem que quando se dirigem ao Centro de Saúde ou ao Hospital sejam remetidos para as listas de espera para a sua consulta, o seu exame ou a sua cirurgia, porque o Governo insiste em não fixar profissionais e prefere deixar florescer e financiar o negócio da doença pelos grupos privados.

Os portugueses não compreendem que quando precisam de abastecer combustível vêem o preço que não pára de aumentar, à mesma velocidade que aumentam os lucros da Galp, que já chegam aos 327 milhões de euros.

Os portugueses não compreendem que se mantenha sem garantia do direito à habitação a milhares de famílias porque se quer manter a instabilidade do contrato de arrendamento e os preços são cada vez mais incomportáveis, porque o Governo rejeita alterar a lei do arrendamento que facilita os despejos e precariza o direito a ter um tecto.

Os portugueses não compreendem que continue a haver milhares de alunos sem professores em muitas disciplinas e milhares de professores desempregados sem turma nenhuma porque o Governo não investe na Escola Pública, não aposta na vinculação dos professores, não dota as escolas do pessoal auxiliar e outros necessários. (...)

Nós fizemos o que nos competia, honrámos o património de intervenção e luta em defesa dos trabalhadores e do nosso povo. O País só não tem Orçamento porque o PS não quis.

Não quis desamarrar o País das limitações e constrangimentos da União Europeia e do euro, que servem de justificação para impedir opções para defender o interesse nacional.

Não quis afrontar os interesses do grande capital, que contam com o respaldo do Governo para agravar a exploração.

Não quis tratar o aumento dos salários como a emergência nacional que é, e nós nem fizemos finca pé na justa proposta dos 850 euros, admitindo a sua fixação em 755 euros.

Não quis defender o Serviço Nacional de Saúde do brutal ataque a que está sujeito pelos grupos económicos dos negociantes da doença.

Não quis assegurar a todos o direito a uma vida mais digna, com habitação, com transportes e mobilidade. (...)

da intervenção de Jerónimo de Sousa

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Palavras que iluminam combates

«Negar a luta de classes

é negar a evidência

de um mundo de duas faces

de miséria e de opulência.»

Armindo Rodrigues

«E o que não presta é isto, esta mentira

Quotidiana.

Esta comédia desumana

E triste,

Que cobre de soturna maldição

A própria indignação

Que lhe resiste.»

Miguel Torga

«O que é preciso é gente

que atire fora com essa gente

Essa gente dominada por essa gente

não sente como a gente

não quer

ser dominada por gente

NENHUMA!

A gente

só é dominada por essa gente

quando não sabe que é gente»

Ana Haterly

«Transforma-se o mundo, na sua realidade, trabalhando-lhe a entranha. De molde a remover os impedimentos que inviabilizam que ele de outra maneira possa ser, e a criar para uma vida humana dos humanos – colectiva, e de cada um – condições enriquecidas de humanização. É neste estaleiro de obras, militante e revolucionário – mesmo nos períodos de maré baixa – que se desdobra, e exerce, a sua carteira de ofícios.»

José Barata-Moura

Excertos de alguns poemas ditos e cantados na sessão por Nuno do Ó, Ivo Luz e José Russo. A citação de José Barata-Moura surgiu na intervenção de Patrícia Machado




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