Evocar Vasco Gonçalves também é defender os valores de Abril
A Associação Conquistas da Revolução (ACR) realizou, no dia 9, uma sessão comemorativa do centenário do nascimento do General Vasco Gonçalves, na Voz do Operário, em Lisboa. O PCP marcou presença através do Secretário-geral.
«Cada um é quem é. Nós somos gente de Abril»
A sessão de domingo foi, seguramente, o ponto alto do amplo programa de iniciativas dinamizadas pela ACR – algumas organizadas apenas pela associação e muitas outras em parceria com diferentes entidades – em torno da celebração dos 100 anos de Vasco Gonçalves, cumpridos no passado dia 3.
À entrada para o grande salão da Voz do Operário, aquele no qual se lê em grandes letras o lema Trabalhadores, Uni-vos!, era grande a emoção daqueles, novos e velhos, que ali foram lembrar, homenagear e festejar o eterno companheiro do povo. Pela frente tinham uma rica programação cultural, constituída por seis momentos distintos.
Sensivelmente a meio da sessão, o presidente da direcção da ACR, José Baptista Alves, dirigiu algumas palavras aos presentes, felicitando a realização daquela iniciativa, desde logo «pela teimosia em não permitir que as dificuldades muitas que houve que vencer» os vencessem. «Nem o silêncio dos poderes instituídos, nem o ostracismo a que a comunicação social nos votou, nem a situação pandémica que nos fustiga, foram capazes de nos fazer desistir», afirmou o militar de Abril.
«Estamos hoje a viver, a recordar e reviver o tempo que foi de Abril, o tempo que foi do povo e dos militares, o tempo que foi das conquistas da revolução, o tempo que foi do Companheiro Vasco», acrescentou.
Percurso inapagável
Depois de vários cumprimentos (com uma saudação especial a familiares do General que também estiveram presentes) e agradecimentos, Baptista Alves prosseguiu, assegurando que o sem número de iniciativas realizadas em torno das comemorações deste centenário só foi possível graças ao «excepcional carinho e admiração que a figura ímpar do General Vasco Gonçalves desperta em todos nós».
«Sabemos que a figura de Vasco Gonçalves, pelo muito que deu a este povo que somos, mereceria muito, muito mais, não fora a maleita, ou melhor as maleitas que nos assolam», afirmou, referindo-se aos «adversários de Abril». Para o dirigente da ACR, por muito que estes adversários se esforcem «não vão conseguir apagar a sua vida exemplar, o seu passado antifascista, a sua participação no movimento dos capitães – tendo sido um dos responsáveis pela elaboração do Programa do MFA – e a sua importante participação em todo o processo que conduziu ao 25 de Abril e ao derrube da ditadura».
Da mesma forma que nunca irão conseguir apagar o seu excepcional desempenho enquanto primeiro-ministro de quatro dos seis Governos Provisórios, no período mais criativo da Revolução», concluiu.
«Existem alguns que nos inspiram a seguir a seu lado»
Já antes, Manuel Begonha, presidente da mesa da Assembleia Geral da ACR, tinha tomado a palavra. «Na verdade, Vasco Gonçalves não se deixava iludir pelos sonhos. O futuro que queria para Portugal era fundamentado numa reflexão profunda e num vasto conhecimento político e social», explicou.
«Como homem isento e íntegro que era, lutou com determinação para criar algo diferente e motivar o País com mudança», «dedicou-se a erradicar o elevado grau de pobreza, de ignorância e de injustiça existente, demonstrando um alto sentido de governação e dedicação ao povo, defendendo sempre a soberania nacional», acrescentou.
«Se hoje temos uma Constituição progressista, em grande parte a ele o devemos» e «foi também pelo seu exemplo, um valioso contributo para a emancipação e conquista de direitos das mulheres em Portugal», disse Manuel Begonha, antes de terminar, enumerando alguns dos traços mais relevantes do percurso político (e das qualidades pessoais) do Companheiro Vasco.
Viver Abril através do «engenho e arte»
Antecedida pela projecção de um vídeo com parte da festa do 70.º aniversário do General Vasco Gonçalves e uma intervenção sua sobre a nacionalização da banca, a componente cultural da sessão comemorativa começou com uma saudação de abertura realizada por Carmen Santos, destacada actriz e dobradora portuguesa, e pela leitura do poema O Comum da Terra, de Eugénio de Andrade, dedicado a Vasco Gonçalves.
Seguiu-se um momento musical a cargo de Sofia Lisboa, Vanessa Borges e Manuel Pires da Rocha, que interpretaram temas como A luta vai ser dura companheiro,do Grupo Outubro;P’ró que der e vier, de Fausto; e Prá Frente, de Adriano Correia de Oliveira.
Carmen Santos subiu de novo ao palco para ler Nome de Vasco, poema de Armando Silva Carvalho. No salão entoaram os versos «Teu nome está de pé como um mastro / de cal rubra. / Estás aqui, entre nós, no meio do teu País. / Connosco vais contigo porque o povo assim o quis».
De seguida, actuou o projecto Música com Paredes de Vidro, de novo com Manuel Pires da Rocha, acompanhado então por Fausto Neves, Carlos Canhoto e Alexandre Branco. Do repertório apresentado constaram Cantar Alentejano e Grândola, Vila Morena, de José Afonso, e a emblemática canção de intervenção chilena El pueblo unido jamás será vencido.
Por fim, o Coro Lopes Graça encerrou a sessão, com alguns dos seus temas mais característicos, o Acordai e Canta, Camarada, Canta.
PCP presente na homenagem ao companheiro do povo
Para Jerónimo de Sousa, que prestou algumas declarações no final da sessão, Vasco Gonçalves era «um homem que tinha um amor profundo pelo seu povo e, particularmente, pelos trabalhadores».
Nas palavras do Secretário-geral, o PCP reconhece e não subestima a abrangência unitária daquela iniciativa. «Obviamente que existem aqui muitos democratas que não são comunistas e que acompanharam Vasco Gonçalves nas suas decisões e no seu empenhamento», afirmou.
«Naturalmente que estou aqui, até pela admiração profunda que tenho por aquele homem que, em seis governos provisórios, foi quatro vezes primeiro-ministro».
Jerónimo de Sousa ainda relembrou alguns dos muitos «avanços significativos e conquistas» levadas a cabo pelos governos que o General dirigiu, tal como a valorização do Salário Mínimo Nacional, que quase duplicou durante aquele período.