- Nº 2443 (2020/09/24)

Novo Banco: impõe-se a nacionalização!

Argumentos

No dia 17 de Setembro de 2020, o PCP agendou para o plenário da Assembleia da República um projecto de resolução para a reversão da alienação do Novo Banco e a sua transferência para a esfera pública. Esta iniciativa, tendo sido rejeitada com os votos contra de PS, PSD, CDS, IL e CH, teve o mérito de colocar em cima da mesa a questão fundamental relativa ao Novo Banco: é inadmissível que o banco seja limpo com o recurso a milhares de milhões de euros de todos os portugueses, mas no final o banco não seja nosso, não seja colocado ao serviço da economia nacional e do País – e tanta falta faria esse recurso, particularmente no momento actual.

Nos últimos meses, muito se tem dito e escrito sobre os inúmeros negócios obscuros do Novo Banco. Os perdões de dívidas a grandes empresas, o refinanciamento de activos problemáticos (mesmo contra os próprios pareceres de risco do banco), as vendas de imóveis e outros activos ao desbarato, as vendas a partes relacionadas com a própria Lone Star, entre outros, originaram perdas de milhares de milhões de euros, transferidas para o erário público. Esta actuação da administração do Novo Banco, e as falhas dos anunciados «mecanismos de controlo», têm dado muita força aos argumentos do PCP.

Os escândalos são muitos. Mas o maior dos escândalos é o facto de o Estado português ter já enterrado perto de nove mil milhões de euros no Novo Banco, para que este seja, no final, entregue a um qualquer grupo financeiro internacional, muito provavelmente espanhol. O mesmo aconteceu com o BPN ou o Banif: nacionalização dos prejuízos; privatização (e captura pelo capital estrangeiro) dos activos mais lucrativos.

O PCP não rejeita nem obstaculiza auditorias ou comissões parlamentares de inquérito que se venham a constituir, mas não escamoteamos a questão essencial, que está a montante de quaisquer conclusões desse âmbito. A questão essencial é saber se um banco, uma vez que foi limpo com nove mil milhões de euros de recursos públicos, deve ser integrado na esfera pública, ou se, pelo contrário, o Estado «paga» mas não «manda».

Fraudes, passa-culpas e soluções

As manifestações de estupefação, de indignação, o habitual passa-culpas a que vamos assistir, sobre se a responsabilidade é do governo PSD/CDS ou do Governo PS interessa pouco aos portugueses e já está há muito identificada pelo PCP: é de ambos!

A resolução, decidida pelo governo PSD/CDS, e avalizada pelo Banco de Portugal, foi uma autêntica fraude. Disse-se aos portugueses que era possível resolver um banco que tinha passivos na sua holding internacional de 12 mil milhões de euros, com os 4,9 mil milhões de euros, que correspondiam aos fundos sobrantes da troika. Foi vendida a ideia de uma resolução sem custos, a partir da divisão entre um «banco mau» e um suposto «banco bom». Ainda estamos a pagar a factura dessa mentira, agravada com a decisão do Governo PS de entregar o banco a custo zero ao fundo abutre Lone Star, dando uma garantia pública de 3,9 mil milhões de euros.

Como era de esperar, a gestão da Lone Star tem tido como objectivo usar toda a garantia pública (e se possível ultrapassá-la, a pretexto da pandemia), despedir trabalhadores, encerrar balcões, e entregar o «bife do lombo» do negócio – os bons activos, já que os maus pagamos nós – a um grupo financeiro privado.

Desde a sua privatização, consumada em 1991, o BES foi o retrato da ascensão e queda de um grupo monopolista, das suas redes na alta finança e nos governos da política de direita ao seu serviço, da corrupção endógena ao capitalismo. Por muito que os responsáveis políticos se tentem encobrir em encenações e bodes expiatórios, o Novo Banco é a continuação desse retrato, como o desfecho da votação desta iniciativa do PCP bem demonstra.


Duarte Alves