MUNDO O sétimo e último capítulo do Programa Eleitoral do PCP, intitulado Portugal na Europa e no Mundo. Soberania, Desenvolvimento, Progresso, Paz e Cooperação, afirma o direito do País ao desenvolvimento soberano e os eixos de uma política externa consonante com a Constituição da República.
Hoje, talvez até mais do que noutros momentos, o contexto internacional e a posição de Portugal no mundo condicionam fortemente as suas possibilidades de desenvolvimento. Num momento marcado pelo aprofundamento da crise estrutural do capitalismo e por uma instabilidade e insegurança crescentes, que decorrem da ofensiva imperialista, o País está colocado perante «grandes desafios», para os quais terá de estar preparado, adverte o PCP logo no início do capítulo.
É assim que, neste quadro complexo, a «adopção de políticas que permitam defender o direito ao desenvolvimento tem uma importância crescente e central na vida nacional». A política patriótica e de esquerda que propõe ao País parte da premissa – tantas vezes comprovada pela História – que a emancipação social dos trabalhadores e dos povos (no caso o português) é «indissociável da defesa da soberania nacional».
Para o Partido, Portugal deve afirmar-se no plano internacional «defendendo e respeitando a soberania e independência das nações, apostando e contribuindo para um quadro internacional assente em relações mutuamente vantajosas, na cooperação, no progresso, na solidariedade, na segurança internacional e na paz». A política patriótica e de esquerda que propõe responde assim, «com uma visão progressista, ao grande desafio de colocar a política externa portuguesa ao serviço dos trabalhadores e do povo».
A defesa de relações internacionais «baseadas na igualdade entre estados, na justiça e na paz» e o combate a derivas reaccionárias e nacionalistas são opções centrais do PCP, para quem Portugal pode «cooperar em pé de igualdade na construção de um Mundo mais justo, seguro, pacífico, desenvolvido e sustentável». Os constrangimentos a este rumo são imensos e poderosos, desde logo a União Europeia e a NATO. Mas a força dos povos em movimento pela sua libertação, essa, é imparável.
Portugal e a integração europeia
A União Europeia está confrontada com uma crise séria que nem os seus mais esforçados defensores conseguem esconder, restando-lhes ocultar as suas causas e apontar falsas soluções. Ora, para o PCP, é claro que a crise na e da UE radica na sua própria natureza como «instrumento de domínio do grande capital e das grandes potências».
Por mais que a procurem «pintar» com tons mais ou menos sociais, o que a realidade mostra é que a UE «continua a dotar-se de um conjunto de instrumentos que a configuram como um bloco económico, político e militar de natureza imperialista». A realidade dos últimos anos, aliás, mostrou como ela procura contrariar qualquer vontade de afirmação soberana, por mais ténue que seja.
Certo de que são «necessárias e possíveis outras relações entre estados e povos da Europa», assentes no respeito, na democracia, no progresso e coesão social, na defesa do meio ambiente, na paz, na cooperação e na solidariedade, o PCP aponta um conjunto de prioridades para Portugal face à União Europeia:
reconsideração do enquadramento institucional da UE, nomeadamente por via de esforços concertados com outros estados, visando a convocação de uma conferência intergovernamental para a revisão dos tratados;
defesa dos direitos sociais e laborais como factores centrais da cooperação na Europa. Adopção de um Pacto de Progresso Social e pelo Emprego, que substitua a Estratégia UE 2020 ou o Pilar Social Europeu;
renegociação das dívidas públicas nos seus prazos, juros e montantes, estabelecendo encargos com o serviço das dívidas compatíveis com o desenvolvimento económico e social de cada país;
revogação da União Bancária e a rejeição das imposições da Governação Económica, Semestre Europeu e Pacto de Estabilidade e rejeição de «impostos europeus»;
defesa de um programa de apoio aos países cuja permanência no euro se tenha revelado insustentável, prevendo compensações e enquadrando a saída negociada da moeda única;
preparação do País para o libertar da submissão ao euro (de preferência em coordenação com outros estados) e recuperação da sua soberania monetária, cambial, orçamental e fiscal;
rejeição do aprofundamento do mercado único e das políticas visando a privatização e concentração de sectores estratégicos e serviços públicos;
revisão profunda da Política Agrícola Comum, Política Comum de Pescas, Política de Comércio Externo e política industrial da UE e adopção de um programa de adesão voluntária que vise a correcção de défices produtivos e tecnológico;
retirada da política comercial da esfera das competências exclusivas da UE e revogação ou abandono dos acordos de «livre comércio»;
exigência de reforço do orçamento comunitário no Quadro Financeiro Plurianual 2021-2027, que resulte de contribuições dos estados tendo por base os respectivos rendimentos nacionais brutos, e da sua função redistributiva;
defesa do princípio da igualdade entre estados – um país, um voto –, com direito de veto em questões fundamentais, e da representação permanente de cada um dos estados, em pé de igualdade e com direito de veto, na Comissão Europeia;
rejeição da militarização da UE, da Política Europeia de Segurança e Defesa (PESD), da Política Externa de Segurança Comum (PESC), da Cooperação Estruturada Permanente (PESCO) de âmbito militar, do Exército Europeu e da utilização de meios financeiros da UE para o militarismo, a corrida armamentista e o intervencionismo.
Uma política externa de paz e cooperação...
A Constituição da República Portuguesa estabelece, no seu artigo 7.º, os princípios que devem reger a política externa portuguesa, nos quais o PCP sustenta o seu Programa Eleitoral, destacando entre muitos outros o respeito pela independência nacional, a solução política e diplomática dos conflitos internacionais e a autodeterminação dos povos.
A política externa portuguesa que o PCP defende tem assim como prioridades a «defesa do interesse nacional e toma partido contra o imperialismo, o colonialismo e quaisquer outras formas de agressão, domínio e exploração nas relações com os povos». Ao mesmo tempo, combate «todas as formas de discriminação e defende os direitos dos povos – à vida, à saúde, à educação, à alimentação, a uma habitação digna, à paz, à segurança e ao emprego».
Para o PCP, a actual situação internacional obriga Portugal a «estar preparado para cenários de grande instabilidade e incerteza e diversificar as suas relações externas».
… democratizada
A política externa que o PCP defende – e que no fundo a Constituição da República Portuguesa consagra – deve ser «participada e democrática», com a articulação dos órgãos de soberania e ampla consulta das forças políticas e organizações sociais. Também ao contrário do que hoje sucede, ela deve ser diversificada, «rejeitando o alinhamento com blocos ou grandes potências» e, assim, tirar partido das vantagens de Portugal para se adaptar à internacionalização da economia e da profunda divisão internacional do trabalho.
Deve, assim, ser dada especial atenção às relações de Portugal com os PALOP, Brasil e Timor-Leste; os países do Magrebe e da bacia do Mediterrâneo; a China e a Índia; a África do Sul, Venezuela e outros países com uma numerosa emigração portuguesa; e outros países da Europa (desde logo Espanha), Ásia e América Latina.
O PCP defende ainda que a política externa portuguesa seja exercida por diplomatas escolhidos pela sua real competência e espírito democrático e não por critérios partidários discriminatórios.
Por relações justas e mutuamente vantajosas
Nesta que é uma questão de primordial importância no mundo actual, o PCP apresenta um conjunto de propostas, desde logo defendendo a diversificação das relações comerciais de Portugal e a defesa de políticas comerciais orientadas para o benefício mútuo, respeitadoras dos interesses, especificidades e necessidades de cada país, orientadas para a complementaridade e não para a competição, seja esta entre produções, produtores ou países.
Paralelamente, o PCP defende a rejeição das políticas de sanções que mais não visam, do que o «domínio económico, político e geoestratégico», e a reversão das lógicas prevalecentes no comércio internacional, rejeitando linhas desreguladoras e liberalizadoras.
O Partido defende, ainda, a adopção de um pacto de cooperação, no âmbito da ONU, com vista à regulação dos mercados financeiros, à tributação das transacções financeiras, ao combate à evasão e elisão fiscais e à extinção dos «paraísos fiscais». Outras propostas nesta área são a participação em projectos multilaterais de benefício comercial mútuo, o incremento das verbas destinadas à ajuda ao desenvolvimento e a anulação das dívidas aos países menos desenvolvidos.
Pela paz, contra o militarismo e a guerra
A defesa da paz e da segurança internacional e afirmação da amizade entre os povos assumem, no tempo presente, uma importância primordial. O PCP, no seu Programa Eleitoral, reafirma – e actualiza – propostas que há muito vem fazendo neste sentido.
À cabeça surge a «defesa dos direitos dos povos, dos princípios da Carta das Nações Unidas e do Direito Internacional», entre os quais realça o respeito pela soberania dos estados e pela sua integridade territorial, a não ingerência nos assuntos internos e o respeito pelo direito dos povos à autodeterminação, ao desenvolvimento e gestão soberana dos seus recursos e sectores estratégicos. O PCP aponta ainda a necessidade de uma «reforma democrática da ONU».
A dissolução da NATO é outra proposta central do PCP, que defende a sua articulação com o processo de desvinculação do País das suas estruturas e reconhece o inalienável direito de Portugal – como de qualquer outro Estado – a decidir da sua saída. O Partido rejeita a participação militar portuguesa em missões de ingerência e agressão contra outros povos e exige o seu fim.
A redução dos gastos militares, o desarmamento e a proibição e destruição das armas nucleares e de destruição massiva são igualmente propostos pelo PCP, que quer ainda ver limitado o uso de veículos militares não tripulados apenas ao território nacional do Estado que os possui. A publicitação obrigatória de todos os meios militares não convencionais é também defendida pelo Partido, para quem a instalação no espaço de meios militares devia ser proibida.
Combater as causas das migrações em massa
O PCP defende uma política de migrações, nomeadamente na União Europeia, que respeite os direitos humanos, incluindo os sociais e laborais, e de desenvolvimento dos povos. Daí combater a instrumentalização das migrações e a abordagem militarista da política de «Europa Fortaleza».
Para o Partido, é fundamental combater as «reais causas das migrações em massa», que residem fundamentalmente nas políticas neocoloniais, nos processos de ingerência externa, nas guerras de agressão e no saque dos recursos naturais dos países de origem.