Como tornar público um bloco de propaganda mascarado de informação

Alguém, um dia, decretou o Verão como a silly season mediática, porventura como forma de esconder a falta de iniciativa de alguns, que se acentua neste período. Neste verão um dos principais jornais diários nacionais decidiu levar o epíteto – que, em português, será qualquer coisa como «temporada palerma» – a um outro nível.

Pelas páginas desse jornal, os «critérios de rigor» e a independência «de ordem ideológica, política e económica» (constantes no seu estatuto editorial) deram lugar à palermice: ou seja, transformando-se num órgão de propaganda partidária. É ver como um acampamento de jovens (como se fazem dezenas por todo o País, com maior participação, mas sem qualquer repercussão mediática) deu direito a uma página inteira num dia, outra no dia seguinte, mais meia passados três dias, acompanhadas de textos submergidos não em informação mas sim em opinião, prenhes de poéticos (mais rigorosamente, patéticos) assomos elogiosos.

Ou ainda as muitas páginas que foram sendo oferecidas ao longo do último mês e meio a alguns candidatos às eleições para a Assembleia da República a propósito de tudo um pouco. Tivemos uma entrevista de quatro páginas a uma candidata por Lisboa à boleia do seu activismo, ou ainda duas páginas (uma das quais com a sua fotografia a toda a largura) a outra candidata pelo mesmo círculo sobre os livros que levou para férias – em ambos os casos com generosa chamada à primeira página.

Pelo meio, mais uma página inteira dedicada a um outro candidato, este pelo círculo eleitoral do Porto. Neste caso não se percebe bem porquê: se pela profissão, pela orientação sexual, se pelas causas que abraça, se pelo activismo «com diferentes extensões», se pela inconfessada admiração que perpassa em todo o texto.

Diga-se que o problema não está na admiração ou falta dela, ou nas preferências ou opções políticas e partidárias de quem escreve – é natural que os jornalistas as tenham. O que já não é aceitável é que estas se transformem em orientação editorial, como se revelou, de forma particularmente gritante, no último mês e meio.

Uma realidade tornada ainda mais gritante quando comparado o tratamento dado às propostas eleitorais de umas e outras forças políticas: nuns casos, por exemplo sobre os direitos das pessoas com deficiência, estas são amplamente explanadas com destaque ainda para candidatos «activistas destes direitos»; no caso da CDU, seja sobre a saúde visual ou a política do medicamento, o silêncio absoluto. Mais do que critérios mediáticos, ainda assim injustificáveis face às obrigações que os órgãos de comunicação social assumem no esclarecimento (com particulares exigências na aproximação do período eleitoral), sobressai a tal opção por uns e o preconceito para com outros.

De tal forma que até numa peça sobre as bordadeiras da Madeira a tal preferência inopinadamente (e inexplicavelmente) surge.




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