Tartufos e jogo de Poker

Anabela Fino

«Errar é humano». «Quem escorrega também cai». «Quem nunca pecou que lance a primeira pedra», etc., etc., etc. O que não faltam na civilização judaico-cristã são ditos que exprimem compreensão e implícita desculpa das humanas fraquezas.

Presume-se, naturalmente, que em cada caso nunca os faltosos perderam de vista os limites da decência, da moral, dos bons costumes, da ética, enfim. Quando tal não sucede – e se eles podem ser difusos, tais limites! – o que fica exposto é a hipocrisia nua e crua de quem já perdeu o sentido do que é a seriedade e a lisura.

Os últimos dias são a prova disso e bem que podiam ser baptizados como os dias dos tartufos. Veja-se os contorcionismos feitos por CDS e PSD para «explicarem» que não-votaram-a-favor-daquilo-que-votaram-a-favor-mas-que-afinal-não-era-aquilo-com-que-estavam-a-favor-porque-sempre-foram-a-favor-de-não-votar-a-favor na questão do tempo de serviço dos professores, e que esta posição, pela sua coerência, demonstra não haver qualquer incoerência, trafulhice, aldrabice, intrujice e muito menos infâmia em desdizer à tarde o que se afirmou de manhã.

E tudo isto porque o PS, qual jogador de Poker, fez uma jogada que Cristas e Rio, jogadores apertados, não atinaram em decidir se era bluff ou mesmo a sério, pelo que arriaram, quer dizer, desistiram do jogo. Para quem não está a par destas coisas, diga-se que fazer bluff é levar o adversário a crer que se tem cartas diferentes das que efectivamente se tem para que aquele desista ou aposte erradamente. O resultado está à vista, a final é para a semana na AR.

O Tartufo de Molière devia corar de inveja se visse como a direita portuguesa actua no palco da nossa política nacional.




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