- Nº 2366 (2019/04/4)

O Artigo 13.º e os Direitos de Autor

Europa

A discussão em torno da Directiva dos Direitos de Autor no Mercado Único Digital, aprovada a semana passada no Parlamento Europeu, teve uma forte projecção mediática, que se centrou fundamentalmente no chamado Artigo 13, na liberdade da internet e na remuneração dos autores. A discussão polarizou-se procurando, deliberadamente, entrincheirar posições entre os a favor ou contra as grandes plataformas como a Google e dos lucros gigantescos que resultam da apropriação de conteúdos, ou entre a liberdade ou a censura na internet.

Ao fazê-lo desvia-se a atenção do quadro mais geral que o texto aprovado, com os votos de PSD e CDS e a maioria dos deputados do PS, consagra. Ofuscou o alcance e dimensão desta Directiva, que vai regular o acesso, partilha e utilização de conteúdos sujeitos a direitos de autor, em entidades tão diversas como bibliotecas, museus, escolas, entidades de gestão de património, as unidades de investigação ou os jornais. Trata-se de mais um instrumento que consagra o chamado mercado único digital, contribuindo para uma maior concentração e monopólio neste meio, impondo um quadro legal na União Europeia que se sobrepõe às leis nacionais (o PCP apresentou uma proposta que consagrava o princípio da não regressão de leis nacionais mais favoráveis aos direitos dos criadores e utilizadores que não foi aprovada), e que salvaguardará, em primeiro lugar, os interesses das grandes potências e das grandes multinacionais. É mais um passo na mercantilização e normalização culturais. O que esteve em causa com esta directiva foi uma disputa pela apropriação das receitas geradas pela disseminação de conteúdos entre as plataformas como a Google e os produtores de conteúdos, que têm visto as suas margens de lucro escapar nos últimos anos. Estes são os mesmos que apropriando-se do acto criativo de artistas, autores, intérpretes, entre outros, alimentam profundas desigualdade, precariedade e dependência dos criadores intelectuais, distribuindo migalhas dos ganhos que resultam do seu trabalho. A garantia de uma justa distribuição de rendimentos seria possível de alcançar, consagrando de forma inequívoca na legislação a responsabilização das empresas, quer de disseminação quer de produção de conteúdos, por uma obrigatória e justa remuneração dos criadores intelectuais– outra proposta do PCP que não foi aprovada. Simultaneamente, a implementação do dito Artigo 13.º (agora Artigo 17), coloca a responsabilidade às multinacionais a decisão do que pode ou não ser carregado, com meios que só elas possuem e têm os recursos para desenvolver. Condiciona-se a liberdade de fruição e partilha da cultura e do conhecimento e com isso limita-se a própria liberdade criativa. Por isso falámos da possibilidade de práticas hipervigilantes e até de censura na internet e apresentámos propostas que rejeitavam a aplicação de filtros.


João Pimenta Lopes