Novos passes reclamam mais transportes público

MOBILIDADE Os novos passes sociais intermodais são um passo adiante na aposta no transporte público. Falta prosseguir com investimentos que aprofundem a nova realidade, sublinhou Jerónimo de Sousa, em iniciativas no sábado e na segunda-feira.

É necessário reconstituir um operador público nacional

Desde a passada segunda-feira, estão em vigor novos títulos de transporte que permitem utilizar todos os operadores e serviços, com um preço tabelado que significa a poupança de centenas de euros por parte dos trabalhadores e respectivas famílias, assim como por pensionistas, reformados e idosos.

Muitos dos que se dirigiram por estes dias aos locais habituais de compra do passe só acreditaram na hora de pagar e recolher o novo título, situação que se avolumou no dia de maior fluxo, a 1 de Abril, quando muitos utentes dos transportes públicos terão pensado tratar-se de uma partida do dia das mentiras.

Não é partida. É mesmo verdade. E embora esta incredulidade colectiva, assente na experiência popular de anos e anos de aumentos tarifários e destruição do serviço público de transportes, que sucessivos governos da política de direita impuseram, desta feita não há razão para desconfiar.

Isso mesmo foi sublinhado por Jerónimo de Sousa, que na segunda-feira se deslocou de comboio entre a Portela de Sintra e o Rossio, tendo, ao longo do percurso, testemunhado quer o sentimento dos utentes onde se misturam resquícios da descrença com a satisfação da realidade constatada, quer o reconhecimento pelo papel desempenhado pelo PCP no maior progresso na mobilidade em Portugal desde 1976.

No final da viagem, o Secretário-geral do Partido, já acompanhado por João Ferreira, cabeça-de-lista da CDU às eleições para o Parlamento Europeu, deu disso conta em declarações à comunicação social. Aproveitou além do mais a ocasião para colocar alguns pontos nos is, designadamente quanto à «paternidade» da medida e à sua tradução orçamental reforçada, bem como para reclamar que, depois do decréscimo do valor dos títulos, sejam dados passos adiante na recuperação e progresso de um sector que foi alvo de uma ofensiva sistemática às mãos dos executantes da política de direita e submissos à integração capitalista europeia.

Avançar

Investir decisivamente no transporte público para que os novos passes sociais intermodais se consolidem e prosperem, foi precisamente o eixo central do debate realizado no sábado, 30, no Centro de Trabalho Vitória. Presidentes de câmaras municipais onde comunistas e ecologistas estão em maioria nos distritos de Setúbal e Lisboa, mas também eleitos onde a CDU se encontra em minoria; trabalhadores e membros de organizações representativas do sector dos transportes; membros de comissões unitárias de utentes, dirigentes do PCP, entre os quais Jerónimo de Sousa, e o primeiro secretário executivo da AML, Carlos Humberto (a quem se deve em boa parte o trabalho de materialização, como valorizou no encerramento o Secretário-geral do Partido), debateram durante duas horas e meia o alcance da medida, mas também os constrangimentos à sua aplicação plena e os passos futuros que aquela reclama.

Assente, logo desde o início, ficou que estamos perante um avanço só possível devido à luta desenvolvida pelos trabalhadores e utentes contra as sucessivas vagas privatizadoras, de desmantelamento e degradação do serviço público de transportes e em defesa do direito à mobilidade. Combate em que o PCP e os seus eleitos, nas autarquias e na Assembleia da República, estiveram sempre. Tanto mais que a primeira proposta de alargamento do passe social intermodal surge em 1997, tendo desde então sido sucessivamente obstaculizada por PS, PSD e CDS, a última vez em 2016, votação na qual até o BE se absteve.

Os participantes no debate concordaram que é necessário mais e melhor investimento público para que a redução tarifária – válida para todo o o Portugal continental, ao contrário do que vociferam PSD e CDS – não faça esbarrar o previsível aumento da procura na incapacidade de resposta dos operadores.

Questão estratégica

Nesse sentido, todos defenderam a necessidade de requalificar e criar novas infra-estruturas, adquirir e reparar material circulante e contratar recursos humanos. Concordaram, ainda, na urgente reversão da lógica liberalizadora que abre caminho à exploração privada no sector (incluindo no sector complementar do taxi), no combate às assimetrias e desigualdades que se foram aprofundando, deixando milhares de pessoas isoladas ou manietadas na sua mobilidade, e na gestão pública de uma nova rede moderna, eficaz, com preços imbatíveis face ao transporte individual. O que, de resto, seria além do mais um enorme contributo na agora tão falada descarbonização, mas também no combate a défices que pesam na nossa economia – importação de veículos e combustíveis fósseis, fuga de investimento, etc..

Jerónimo de Sousa, ao intervir no encerramento do debate, não esqueceu nenhum destes aspectos. E por isso lembrou que «em boa verdade a redução tarifária e o alargamento do uso do passe seria uma daquelas medidas que há muito o Estado e a Administração Central já podiam e deviam ter implementado, como o PCP reclamava».

«Nada pode apagar o valor e alcance do que agora se conseguiu em redução de custos e aumento de mobilidade. Mas é o próprio alcance da medida que exige que, para que ela ganhe inteira projecção e extensão, seja acompanhada do aumento da oferta. Esse é um objectivo que exige respostas imediatas e a médio prazo», acrescentou, antes de defender «a necessidade da reconstituição de um operador público nacional».

O Secretário-geral comunista insistiu, por outro lado, que sendo esta uma medida para todo o País, «é necessário agora garantir da Administração Central, e do Governo em particular, as medidas que visem consagrar em legislação o regime de redução tarifária», e notou que «uma política alternativa, patriótica e de esquerda tem que olhar para a política de transportes e para o direito à mobilidade como uma questão estratégica».