Em Lisboa e no Porto enviou-se um abraço à Venezuela bolivariana
SOLIDARIEDADE Denunciar e rejeitar o golpe de Estado e as manobras que o procuram impulsionar, expressar solidariedade para com o presidente eleito e defender a legalidade democrática na Venezuela e o direito do seu povo a escolher livremente o seu futuro, foram consignas que mobilizaram centenas de pessoas em duas iniciativas realizadas a semana passada em Lisboa e no Porto.
«Que ditadura é essa que realiza 25 eleições em 20 anos?»
Depois de uma sessão no Porto na quarta-feira, 30 (ver caixa), na quinta-feira, 31, ao final da tarde, um dos salões da Casa do Alentejo foi pequeno para acolher todos aqueles que responderam afirmativamente ao apelo lançado por mais de duas dezenas de organizações. Apelo para que se repudiasse a tentativa de derrube do presidente venezuelano Nicolás Maduro, cujas estratégia, táctica e objectivos imperialistas espoliadores foram postos a nu.
Na fila da frente de uma moldura humana que se apinhava na sala e em todos os acessos, estavam representantes diplomáticos das repúblicas da Venezuela e de Cuba, da Palestina (outro povo heróico que luta pela sua emancipação e sabe ser solidário mesmo sobe cruel repressão e ocupação, viria a dizer o embaixador venezuelano), dirigentes do PCP e os oradores que foram sendo chamados por Gustavo Carneiro, da Direcção do Conselho Português para a Paz e a Cooperação (CPPC), a intervir na sessão.
A abrir, Amílcar Campos, também dirigente do CPPC, denunciou mais uma «descarada» vaga de «ingerência, pressão, chantagem, bloqueio, roubo, guerra mediática e ameaças contra a Venezuela bolivariana» movida «pelos EUA e por aqueles que se prestam a ser seus vassalos». O propósito, disse, é claro: «impor o domínio do imperialismo sobre os recursos naturais».
«O não reconhecimento do presidente democraticamente eleito Nicolás Maduro e o conjunto de ulteriores medidas ilegais adoptadas, são mais um episódio do longo processo de ingerência e desestabilização, promovido e levado a cabo pelos EUA e pela oligarquia venezuelana, com o apoio da UE», realçou em seguida Amílcar Campos.
Lembrando que ao contrário do que a campanha de intoxicação da opinião pública quer fazer crer, «a transparência do sistema eleitoral venezuelano é comprovada por instituições como o Instituto Carter», Amílcar Campos salientou não ter sido por acaso que no Conselho de Segurança da ONU e até na Organização dos Estado Americanos, o imperialismo falhou em impor o reconhecimento do auto-proclamado presidente Juan Guaidó.
«O que eles não perdoam, o que verdadeiramente lhes doí», acrescentou, «é o carácter soberano democrático e de conteúdo progressista» da revolução bolivariana, capaz, em duas décadas, de «colocar, pela primeira vez na história, as imensas riquezas do país ao serviço do desenvolvimento social, económico e cultural do povo».
A mesma opinião expressou Regina Marques, que usou da palavra em nome do Movimento Democrático de Mulheres, recordando, além do mais, que em 20 anos de processo transformador, a Venezuela garantiu alojamento condigno a mais de 2,5 milhões de pessoas, erradicou o analfabetismo, deu passos decisivos no combate à fome e assegurou uma elevada taxa de frequência universitária, entre outros feitos.
Do lado certo da história
Regina Marques, como já o havia feito o dirigente do CPPC, também lamentou a postura subserviente do Governo português face às manobras imperialistas de subversão da ordem constitucional na Venezuela, em desrespeito para com os preceitos da Constituição da República Portuguesa, tornando-se, assim, cúmplice das medidas que recaem brutalmente sobre as camadas populares venezuelanas, incluindo a numerosa comunidade portuguesa que reside e trabalha no território.
«Estão sempre do lado errado da história. É uma vergonha!», disse, antes de Regina Marques, Augusto Fidalgo, que falou aos presentes na sessão em nome da Associação de Amizade Portugal-Cuba.
Numa toada contundente, Augusto Fidalgo apelidou Juan Guaidó de «fantoche» dos EUA e da oligarquia reaccionária venezuelana, e chamou de «lacaios» àqueles que agem sob a sua batuta. Com o objectivo evidente de se apropriarem dos enormes recursos naturais da Venezuela: a maior reserva mundial de petróleo e a segundo de ouro», isto para além de importantes jazidas de «diamantes e outros minerais», gás, água doce, etc..
Os mesmos que hoje apoiam a tentativa de saque do povo venezuelano como antes apoiaram outras ofensivas de rapina contra outros povos, «são os mesmos que há décadas tentam e roubam direitos ao nosso povo», sublinhou ainda.
Similar acento tónico foi posteriormente deixado por Augusto Praça, que em nome da CGTP-IN considerou a Revolução Bolivariana «uma marco» na luta «dos trabalhadores latino-americanos».
A Intersindical não reconhece o «espantalho» Juan Guaidó porque este, ao contrário de Nicolás Maduro, «não representa a vontade do povo venezuelano», garantiu, antes de recordar que a central não esquece que «enquanto na Europa a contratação colectiva e outros direitos consignados na legislação do trabalho, os serviços públicos e funções sociais do Estado eram alvo de ataque, na Venezuela Bolivariana amplos direitos sociais e laborais eram consagrados».
Vencerá!
Ora, é justamente o exemplo de progresso soberano que o imperialismo pretende apagar na Venezuela, considerou, por seu lado, a embaixadora de Cuba, que, lembrando palavras do presidente daquela república socialista caribenha,Miguel Díaz-Canel, segundo o qual «a solidariedade entre os nossos povos é hoje medida pela atitude em relação à Venezuela», Mercedes Martinez reiterou o inquebrável apoio de Cuba ao «único presidente constitucional da Venezuela, Nicolás Maduro», bem como à «resistência inabalável do povo venezuelano na defesa da soberania nacional».
Visivelmente emocionado mas aproveitando para redobrar forças combativas, o embaixador da República Bolivariana da Venezuela, num discurso de improviso, agradeceu a todos os presentes pela impressiva manifestação de solidariedade que naquela ocasião se concretizava.
Lucas Rincón Romero não deixou, no entanto, de frisar alguns aspectos de contexto e de fundo sobre a situação criada na Venezuela. Primeiro acusando os EUA e os que os seguem de subverter a mais elementar lógica matemática. Desde logo ao considerarem ilegítimo um presidente [Nicolás Maduro] eleito em Maio do ano passado por mais de 6,8 milhões de venezuelanos (67 por cento), mas igualmente ao fazerem crer que a Venezuela está isolada quando a maioria dos países e organismos internacionais apoiam a legalidade democrática protagonizada por Nicolás Maduro.
Alertou, depois, para o extenso rol de mentiras e falsificações que proliferam. Desmentindo-as, atribuiu ao bloqueio e às sanções económico-financeiras e agora ao roubo descarado dos fundos venezuelanos as carências sentidas pela população. Do mesmo modo, asseverou que a comunidade portuguesa não é favorável à oposição e ao golpe de Estado em curso. «Muitos e muitos luso-descendentes dão a vida pela revolução bolivariana», atestou.
«Quando as bombas começarem a cair não vão matar somente os chavistas», advertiu por outro lado o general jubilado das forças armadas venezuelanas, que dando como exemplo o sucedido no Iraque ou na Líbia (países que o imperialismo dizia serem ditaduras para deitar mão ao petróleo, como pretende fazer agora com a Venezuela, com as consequência que estão à vista, aludiu), apelou ao combate à falsa ideia, amplamente difundida, de que na Venezuela se vive em ditadura.
«Que ditadura é essa que realiza 25 eleições em 20 anos, erradica o analfabetismo, combate a fome» ou põe em marcha «programas sociais para os mais pobres, os mais humildes», questionou, antes de terminar com um «Venceremos!» que tremulou na sala como uma bandeira de esperança.
Porto seguro da solidariedade
A anteceder a sessão realizada na Casa do Alentejo, decorreu no Porto, na quarta-feira, dia 30, uma iniciativa em tudo semelhante. Também no Centro Católico de Operários se fez ouvir de viva voz a solidariedade para com a Venezuela bolivariana e o seu bravo povo que resiste à ofensiva imperialista.
João Rouxinol apresentou o acto público em que intervieram Joana Rodrigues, em nome da União de Sindicatos do Porto, Conceição Mendes, do MDM, Jorge Sarabando, da Associação Conquistas da Revolução, Luísa Barateiro, em representação da Ecolojovem, e Ilda Figueiredo, presidente da Direcção Nacional do CPPC.
Perante cerca de uma centena de pessoas, Ilda Figueiredo reiterou o apoio unânime ao processo transformador no país sul-americano, que nas últimas duas décadas, pesem as várias tentativas de subversão, incluindo golpes de Estado, foi capaz de singrar e alcançar importantes patamares de progresso, usando para tal desiderato as receitas dos recursos soberanos.
A dirigente do CPPC qualificou de «inadmissíveis» quer o reconhecimento de Juan Guaidó como «presidente interino» da Venezuela, quer as sanções e o bloqueio impostos e agravados pelos EUA, os quais, denunciou, recaem sobre o povo venezuelano.
Num paralelismo com a guerra económica e a ingerência então movidas para derrubar o governo popular de Salvador Allende e instaurar no Chile uma ditadura, Ilda Figueiredo acusou Washington e aqueles que seguem a administração Trump de continuar a tratar a América Latina como se fosse o seu «pátio das traseiras».
Reafirmando o apoio ao presidente democraticamente eleito Nicolás Maduro, Ilda Figueiredo apelou a que se deixe «o povo decidir o seu futuro» e rejeitou que «países e grupos económicos» se socorram da «ingerência» para se «sobreporem à vontade» daquele.
CPPC e CGTP-IN criticam Governo
Reagindo ao reconhecimento por parte do governo português de Juan Guaidó como «presidente» da Venezuela, dada a conhecer segunda-feira, 4, pelo ministro dos Negócios Estrangeiros, Augusto Santos Silva, CPPC e CGTP-IN repudiaram nos mais fortes termos a decisão, tal como fez o PCP (ver página 27).
Em comunicado, o Conselho da Paz expressa «profunda indignação» e acusa o executivo liderado por António Costa de «frontal desrespeito pela Constituição da República Portuguesa e pelo Direito Internacional», e de assumir uma « condenável postura subserviente aos interesses dos EUA», o que o torna «não só cúmplice, como activo promotor, da manobra golpista em curso contra o legítimo Presidente da República Bolivariana da Venezuela, Nicolás Maduro e o regime constitucional venezuelano».
«Inaceitavelmente, oGoverno português optou pelo lado do agressor, da ingerência e da ilegalidade, contra o povo venezuelano, a soberania, a paz e o Direito Internacional», insiste o CPPC.
No mesmo sentido, a CGTP-IN «denuncia o grave passo na escalada golpista, dirigida pelos EUA e apoiada pela União Europeia (UE)», em que tal reconhecimento por parte das autoridades portuguesas se insere.
«Uma decisão que viola princípios constitucionais que regem as relações internacionais do nosso país, nomeadamente os princípios da independência nacional, da igualdade entre os Estados, da não ingerência nos assuntos internos dos outros Estados e da paz e da justiça nas relações entre os povos», detalha-se, e que arrasta «o nosso país para o campo dos subalternos daqueles que, como os EUA e a UE, procuram voltar ao tempo em que apenas alguns países ricos e poderosos determinavam a sorte de toda a Humanidade», prossegue a Intersindical Nacional.
A CGTP-IN qualifica ainda a decisão como «hipócrita» na medida em que «invoca uuma “profunda crise social” para escamotear as responsabilidades dos EUA pela situação e facilitar a sua estratégia de coacção da Venezuela e do seu povo», e lamenta que tome «partido por quem, como os EUA, não têm qualquer pejo em sancionar, bloquear e brandir a ameaça da agressão militar, ou pelos sectores da oligarquia venezuelana responsáveis pela violência, terrorismo, açambarcamento de bens essenciais, destruição de meios de produção e serviços públicos essenciais».