Rendimento Básico Incondicional: solução ou ilusão?

João Pimenta Lopes

Na pas­sada se­mana re­a­lizou-se na Uni­ver­si­dade do Minho uma con­fe­rência em torno do Ren­di­mento Bá­sico In­con­di­ci­onal (RBI). O RBI, ou Ren­di­mento Mí­nimo Uni­versal, ou Sa­lário de Dis­po­ni­bi­li­dade, pre­tende ser «uma pres­tação do Es­tado a cada ci­dadão, su­fi­ci­ente para uma vida digna e sem quais­quer con­di­ções», e «deve pre­venir a po­breza ma­te­rial» pelo que «de­verá, no mí­nimo, estar ao nível de risco de po­breza».

Esta tese tem sido abra­çada quer à di­reita quer à es­querda, pro­cu­rando res­ponder a uma su­posta crise do tra­balho as­sa­la­riado, mo­ti­vada pela ex­plo­ração e pela evo­lução e avanços tec­no­ló­gicos, no­me­a­da­mente face aos avanços no do­mínio da ro­bó­tica. O ins­tru­mento re­plica ex­pe­ri­ên­cias an­tigas em novas rou­pa­gens. Um ar­tigo do The New Yorker1 dá nota de al­gumas delas, como a da vila de Spe­e­nham­land no ano de 1795 em que se as­se­gu­rava a dis­tri­buição de uma quan­ti­dade fixa de pão pelas fa­mí­lias. Marx terá cri­ti­cado a pos­te­riori o sis­tema (que viria a ter o seu fim em 1834) por ter con­tri­buído para manter baixos os sa­lá­rios das classes tra­ba­lha­doras.

As for­mu­la­ções são di­versas, mas os riscos são evi­dentes. Qual­quer que seja o mo­delo para a sua con­cre­ti­zação, não de­vemos es­quecer que a sua im­ple­men­tação seria no quadro de um sis­tema ca­pi­ta­lista, cuja es­tra­tégia de ex­plo­ração é cada vez mais agres­siva, pro­cu­rando con­tra­riar a baixa ten­den­cial da taxa de lucro que re­sulta da sua crise es­tru­tural. Ou seja, a adopção de tal me­ca­nismo ser­viria em pri­meiro lugar não os in­te­resses dos tra­ba­lha­dores, mas os in­te­resses do ca­pital.

Assim, é pos­sível e plau­sível as­sumir que, a ser im­ple­men­tado, um ins­tru­mento destes ser­viria como um subs­ti­tuto aos be­ne­fí­cios so­ciais (edu­cação, saúde, re­formas) e mais um ataque aos sis­temas de Se­gu­rança So­cial, por re­dução das suas pres­ta­ções e apoios so­ciais que se­riam trans­fe­ridos para os «be­ne­fi­ciá­rios» do RBI.

A pressão do ca­pital seria tre­menda para a re­dução da massa sa­la­rial, já que o ren­di­mento de so­bre­vi­vência já seria as­se­gu­rado pelo Es­tado. Uma re­a­li­dade que com­pro­me­teria as con­tri­bui­ções para a Se­gu­rança So­cial e com isso a sua sus­ten­ta­bi­li­dade, com­pro­me­tendo a sua ca­pa­ci­dade re­dis­tri­bu­tiva no­me­a­da­mente através das pen­sões. O sis­tema fa­ci­li­taria o ca­minho para a in­di­vi­du­a­li­zação das re­la­ções la­bo­rais.

Há uma inul­tra­pas­sável con­tra­dição as­so­ciada ao RBI: é que teria que ser a ri­queza pro­du­zida pelo tra­balho hu­mano a sus­tentá-lo. O ca­pital teria assim um po­de­roso ins­tru­mento que fa­ci­li­taria não só a li­ber­tação de novas par­celas para a acu­mu­lação ca­pi­ta­lista, como ali­men­taria um exér­cito de mão-de-obra dis­po­nível para aceitar tra­ba­lhar por mi­ga­lhas que so­ma­riam ao já parco RBI.

Acresce, para ter­minar, que tais pro­postas tor­neiam a questão es­sen­cial: as causas das de­si­gual­dades e da ex­plo­ração. A va­lo­ri­zação do tra­balho, como parte es­sen­cial da dig­ni­fi­cação hu­mana, não passa por so­lu­ções que omitam as re­la­ções de ex­plo­ração, antes pelo tra­balho com di­reitos, pela exi­gência de sa­lá­rios dignos e da re­dução da jor­nada diária e por uma mais justa e equi­li­brada dis­tri­buição da ri­queza... que o tra­balho produz!

1https://​www.newyorker.com/​ma­ga­zine/​2018/​07/​09/​who-re­ally-stands-to-win-from-uni­versal-basic-in­come




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