Das criminosas respostas às migrações (I)
Ao dia quinto do mês de Novembro, segundo dados da Organização Internacional de Migração (OIM), haviam morrido na travessia do Mediterrâneo, 1989 pessoas. Desde o primeiro de Janeiro de 2014, terão perdido a vida (pelo menos) 17.336 pessoas, ao arriscarem uma travessia em condições de segurança que estão para lá de inexistentes. É uma das mais terríveis expressões da grave crise humanitária dos refugiados e das consequências das políticas criminosas da União Europeia na resposta às migrações.
Desde 2015 fez caminho a revisão de todo o edifício legislativo da UE sobre asilo e migrações, tornando cada vez mais restritivo o acesso ao asilo, criminalizando os migrantes, impondo um dito retorno «voluntário» - obrigando o retorno para países de onde fugiram. Avançou o bloqueio de fronteiras e a pulverização de muros da vergonha e morte (que já vinham sendo construídos e que estão dispostos nas fronteiras de países como a Grécia, a Espanha, a Áustria, Bulgária, Hungria entre outros), ou a criação dos chamados «hotspots», locais que seriam de acolhimento de refugiados e que logo se converteram em autênticos campos de concentração que ainda hoje persistem, nomeadamente nas ilhas gregas. Aqui se acumulam ainda hoje milhares de pessoas em condições desumanas.
Recordamos o criminoso acordo UE-Turquia, que consolidou, entre outras coisas, a militarização das acções de patrulhamento do Mediterrâneo e a efectivação dos chamados «push-backs», repulsões de embarcações para a costa de onde partiram, em violação do direito internacional. A par, a consolidação da chamada externalização de fronteiras da UE, empurrando as fronteiras marítimas para países terceiros e criminalizando a resposta humanitária de resgate e salvamento em mar.
À Turquia, onde se concentram cerca de 4 milhões de migrantes e refugiados, muitos retidos em campos onde são expostos a intensas práticas de exploração laboral, junta-se hoje a Líbia. País destruído pela agressão militar (legitimada pelo Parlamento Europeu) que está hoje pulverizado em territórios controlados por milícias, cuja guarda costeira é patrocinada pela UE e alguns governos europeus para garantir a interrupção dos fluxos migratórios, fazendo concentrar milhares de pessoas em campos onde os relatos de tortura e trabalho escravo são recorrentes. Uma estratégia de externalização de políticas que se estende já a vários países do Norte e Centro de África.
Toda esta estratégia alimenta questionáveis ou sórdidos negócios. Alimenta o negócio securitário, que se alimenta das políticas da UE que impõem controlos cada vez mais sofisticados tecnologicamente. Alimenta um sórdido negócio de tráfico de seres humanos, que alimenta as necessidades de mão de obra barata (escrava em muitas situações) e que alimenta a exploração sexual de mulheres e crianças. Mas não esqueçamos também alguma nebulosidade em torno de organizações que intervém e competem pelos fundos para uma resposta humanitária de que os Estados se demitem.