União em defesa dos direitos do povo brasileiro e da democracia no Brasil
FRENTE Uma ampla frente democrática para enfrentar a ameaça fascista e defender a democracia no Brasil foi proposta pelo PCdoB face à eleição de Bolsonaro, candidato de extrema-direita como presidente da República.
Construir uma ampla unidade popular, democrática e patriótica
O Partido Comunista do Brasil (PCdoB) considera que a eleição de Jair Bolsonaro «instaura um novo período político no país, marcado por ameaças à democracia, ao património nacional, à soberania da nação e aos direitos do povo». E avisa que «foi eleito um presidente da República declaradamente determinado a instaurar um governo de conteúdo ditatorial para implementar, a ferro e fogo, um programa ultraliberal e neocolonial».
Num documento intitulado «Por uma ampla união em defesa da democracia, do Brasil e dos direitos do povo», divulgado na noite de 28 de Outubro, a presidente do PCdoB, Luciana Santos, lembra que a candidatura de Fernando Haddad e Manuela d’Ávila obteve cerca de 47 milhões de votos e lançou «as bases de uma oposição vigorosa que começa agora».
A dirigente comunista constata que houve uma viragem «em direção a um retrocesso, à desconstrução e mesmo à destruição de históricas realizações e conquistas sobre as quais, a despeito de graves problemas que persistem, se ergueram e floresceram o Brasil e o povo brasileiro». Isso ficou bem explícito na fase final da campanha para a segunda volta, quando instituições da República, com o Supremo Tribunal Federal e o Tribunal Superior Eleitoral, foram ameaçadas. De igual modo, foram atacadas garantias básicas da Constituição, como a liberdade de imprensa, de manifestação e de organização partidária. «A autonomia das universidades foi pisoteada. O presidente eleito, durante a campanha, foi um pregoeiro da violência, da intolerância e do ódio entre os brasileiros e jurou encarcerar ou banir do país os cidadãos e as cidadãs “vermelhos” que dele divergirem e criminalizar movimentos e entidades do povo».
«O gatilho de tudo isto foi o golpe de Agosto de 2016 [o afastamento de Dilma Roussef], que agora se consolida com a assunção da extrema-direita ao governo da República. Há um corte na construção da democracia, reiniciada em 1985 após o fim da ditadura militar, por meio de um processo eleitoral que transcorreu com o Estado Democrático de Direito sufocado pelo Estado de Excepção. A pregação de matriz fascista do candidato eleito emergiu nesse leito, não sem ser confrontada pelas forças da democracia – uma tendência que certamente se fortalecerá neste novo cenário político», escreve a presidente do PCdoB.
Oposição vigorosa
Os comunistas brasileiros denunciam que «a lisura do pleito foi corrompida para favorecer a candidatura da extrema-direita, por intermédio de expedientes ilegais, ao estilo da denominada guerra híbrida que estimula o uso em grande quantidade das falsas notícias, as chamadas fake news, expediente financiado criminosamente, conforme denúncias da imprensa, por grandes empresários». Tais ilicitudes, entre outras, interferiram no resultado das urnas e, com toda razão, «estão em processo de inquérito na Justiça Eleitoral, da qual se espera profunda e ágil instrução com decisões consoantes a gravidade do ocorrido».
Para o PCdoB, face às ameaças contidas na actual situação no Brasil, a resistência das forças democráticas, progressistas, populares e patrióticas começa respaldada pela expressiva votação obtida pela candidatura Fernando Haddad-Manuela d’Ávila e na tomada de posição de personalidades e instituições que ergueram a voz para defender a democracia e a Constituição.
A resistência, a oposição vigorosa, defendem os comunistas, deve ser organizada no âmbito de toda a vida política e social do país, a começar pelo Congresso, estendendo-se para os movimentos sociais, as organizações da classe trabalhadora, segmentos do empresariado, o universo académico, a intelectualidade, os artistas, o mundo jurídico, sectores religiosos e inclusive para os integrantes de instituições da República, como governadores e prefeitos do campo democrático.
Com base na experiência da luta das forças progressistas contra «todos os governos e regimes autoritários e tiranos que infestaram a história da República», o PCdoB transmite ao povo brasileiro a certeza e a confiança de que, apesar das graves ameaças que pairam sobre o país, não será fácil a Bolsonaro realizar a obsessão de sepultar a democracia brasileira, já que ela «deitou raízes profundas no solo pátrio, custou à nação muitas lutas e vidas». E manifesta confiança que, progressivamente, a partir dos milhões que apoiaram a candidatura de Haddad e Manuela, «uma maioria se levantará para defender a democracia e ela vencerá mais uma vez».
Para tal, o PCdoB dirige-se «ao povo e às forças democráticas do país» conclamando que «a construção de uma ampla unidade com o objetivo de descortinar horizontes a uma jornada cívica, patriótica, democrática e popular e a formação de barreiras contra a volta de um regime de Estado de excepção e em defesa da democracia, do Brasil e dos direitos do povo».
O PCP apela ao fortalecimento
da solidariedade do povo brasileiro
«O resultado obtido pela candidatura de Bolsonaro nas eleições presidenciais no Brasil representa – na sequência do golpe de Estado institucional que destituiu a legítima presidente Dilma Rousseff em 2016 e da prisão arbitrária e do impedimento da candidatura de Lula da Silva – um gravíssimo desenvolvimento da ofensiva contra os direitos dos trabalhadores e do povo brasileiro, corporizado num programa de intensificação da exploração e ataque aos direitos sociais, de agressão às liberdades e à democracia, de abdicação da soberania nacional e subordinação ao imperialismo, de promoção de valores profundamente reaccionários e de imposição de um poder de cariz ditatorial no Brasil» – considera o Partido Comunista Português, em nota do seu Gabinete de Imprensa, divulgada a 28 de Outubro, depois de conhecidos os resultados da segunda volta das eleições presidenciais no Brasil.
Denunciando as responsabilidades dos grandes grupos económicos e financeiros, do grande latifúndio e dos sectores mais retrógrados e golpistas pela degradação da situação no Brasil, o PCP sublinha que este resultado «é inseparável da sistemática acção de branqueamento dos reais objectivos e de apoio à candidatura de Bolsonaro promovida pelos grandes meios de comunicação social – incluindo em Portugal – e através das redes sociais».
O PCP saudou «os comunistas e as demais forças democráticas e progressistas brasileiras que convergiram na candidatura de Fernando Haddad e Manuela d'Ávila pelo expressivo e importante resultado obtido, em condições extraordinariamente difíceis. Um resultado que é, em si mesmo, um valor para continuar a enfrentar com determinação a ameaça fascista e defender a democracia». E apelou «ao fortalecimento da solidariedade com as forças democráticas e progressistas brasileiras, com os trabalhadores e o povo brasileiro e a sua luta para retomar e aprofundar o caminho de progresso social, de desenvolvimento soberano, de cooperação e de paz aberto em 2002 com a eleição de Lula da Silva como presidente do Brasil».
Continuar a luta, defender
os direitos e a democracia
Com a eleição de Jair Bolsonaro para a presidência da República, o Brasil entra num período de acrescidos perigos quanto ao futuro do seu regime democrático, dos direitos dos trabalhadores e do povo brasileiro e da sua soberania nacional, que as referências à Constituição, à democracia e à liberdade feitas nos primeiros discursos pós-eleitorais de Bolsonaro não conseguem esconder.
A vitória do candidato da extrema-direita é o culminar de uma prolongada e violenta ofensiva dos grandes grupos económicos e financeiros, do grande latifúndio e dos sectores mais retrógrados e golpistas brasileiros, em aliança com o imperialismo, contra as conquistas económicas e sociais alcançadas a partir do início deste século, conquistas que beneficiaram os trabalhadores e amplas camadas populares do Brasil. A reacção das classes dominantes brasileiras começou logo que o antigo operário metalúrgico e sindicalista Lula da Silva, à frente do Partido dos Trabalhadores (PT), venceu as eleições presidenciais em Janeiro de 2002.
Apesar de não ter maioria no Congresso e no Senado e de ter assumido diversos compromissos para formar governo, os executivos liderados por Lula da Silva e o PT puseram em marcha uma política de desenvolvimento económico e de redução das desigualdades. O Brasil registava taxas de crescimento de mais de sete por cento e implementava programas sociais de erradicação da pobreza extrema que beneficiaram 36 milhões de pessoas ao longo dos 13 anos das presidências de Lula da Silva, entre 2003 e 2011, e de Dilma Rousseff, de 2011 a 2016.
Crise, manipulação e golpe
Com o aprofundamento do impacto da crise do capitalismo na economia brasileira e de crescentes contradições, no segundo mandato de Dilma Rousseff, forças que estavam no governo, como o PMDB, uniram-se a outros sectores da «social-democracia» e à direita e extrema-direita revanchista, com o activo papel de políticos golpistas e sem escrúpulos como o vice-presidente Michel Temer ou o ex-presidente do parlamento Eduardo Cunha, mergulhados em acusações de corrupção, e com o apoio do grande capital, dos grande agrários, dos grandes media, como a rede Globo, de seitas religiosas, como a IURD, e de herdeiros da ditadura, como Bolsonaro.
Juntos, manipularam a opinião pública fazendo crer que problemas endémicos como a corrupção ou a violência nas ruas eram resultado da «governação do PT» para desecandear o golpe de estado institucional, concluído em Agosto de 2016, que destituiu a legítima presidente da República, Dilma Rosseff. Em simultâneo, implementaram a perseguição política a Lula da Silva nos tribunais, que levaria à sua prisão arbitrária e ao impedimento da sua candidatura às eleições presidenciais, que aparecia nas sondagens como a grande favorita da grande maioria do povo brasileiro.
A curta governação de Temer, depois do golpe, evidenciou a natureza das forças golpistas que o apoiaram. No plano interno, começaram a ser aplicadas as velhas receitas neoliberais – cortes salariais e ataque aos direitos dos trabalhadores, incluindo com a «reforma» das leis laborais. Ao mesmo tempo, no plano externo, o Brasil regredia à submissão ao imperialismo norte-americano, retomando por exemplo a negociação da instalação de uma base militar norte-americana na Amazónia.
Bolsonaro não é, pois, «resultado das más políticas do PT», como alguns pretendem, mas antes uma criação das forças golpistas e dos grandes interesses que estas representam. São as mesmas forças que, instrumentalizando erros e contradições das forças progressistas e tirando proveito de problemas reais agravados pelo aprofundamento da crise do capitalismo e exacerbados pela política de intensificação da exploração e da acumulação da riqueza após o golpe de 2016, se opuseram e combateram as presidências de Lula e Dilma.
Ameaça fascista
A candidatura de Bolsonaro instigou os seus apoiantes ao ódio e à violência; ameaçou fechar tribunais e jornais que o critiquem e expulsar «os marginais vermelhos» (o anti-comunismo sempre foi um instrumento do grande capital para impor os seus interesses de classe); deu voz à extrema-direita militar com elogios ao golpe de 1964 e à tortura; sugeriu a liberalização da venda de armas para «resolver» a questão da da insegurança; acusou o Movimento dos Sem-Terra (MST), que defende os camponeses e a Reforma Agrária, de ser uma organização com «actividade terrorista»; utilizou a Internet para difundir mentiras através de redes sociais, com o financiamento ilegal de grandes empresas.
Bolsonaro presidente representa o regresso ao poder em Brasília dos sectores mais reaccionários do grande capital brasileiro e dos grandes agrários aliados ao imperialismo; representa o perigo de uma nova ditadura, com ou sem generais, e de uma política económica neoliberal do tipo da que, a partir de 1973, foi imposta no Chile pelos Chicago Boys do ditador Pinochet.
Paira, pois, uma ameaça fascista sobre o Brasil, importa dizê-lo com clareza. Uma ameaça que, a concretizar-se, apontará como alvo os comunistas e outras forças de esquerda, progressistas e democráticas, os sindicatos, os movimentos sociais, as organizações populares e, de um modo geral, os trabalhadores e o povo brasileiro.
Um governo de extrema-direita no Brasil constitui, também, uma acrescida ameaça à paz na América Latina, já que Bolsonaro será um submisso seguidor do imperialismo norte-americano, que mantém o bloqueio económico, financeiro e comercial contra Cuba, ameaça intervir militarmente contra a Venezuela bolivariana, a quem impõe igualmente um bloqueio económico e financeiro, hostiliza a Nicarágua e a Bolívia, investe contra qualquer país que defenda uma via soberana de desenvolvimento ou ouse resistir à ofensiva de Washington contra os povos, no continente americano e no mundo.
Reafirmar e reforçar solidariedade
Numa situação que coloca grandes exigências, importa reafirmar e reforçar a solidariedade para com os comunistas e outras forças democráticas e progressistas, com os trabalhadores e o povo brasileiro, na sua luta em defesa da democracia, do progresso social e da soberania nacional.
Tal como no passado, os trabalhadores e o povo brasileiro, com as suas organizações políticas, sindicais e sociais, saberão resistir à opressão, enfrentar as ameaças, defender os seus direitos, continuar a luta pela democracia e pelo progresso social. E, pela luta, serão criadas de novo condições para uma «virada» como a de 2002, que permitiu a conquista de mais direitos para os trabalhadores e o povo brasileiro e o desenvolvimento e afirmação soberana do Brasil.