ENTREVISTA Adelina Escandell e Alba Blanco, respectivamente membro da Comissão Executiva e responsável pelas relações internacionais dos Comunistas da Catalunha, explicaram ao Avante! a complexa situação que se vive na Catalunha e as perspectivas e tarefas dos comunistas.
A situação da Catalunha tem preenchido nos últimos anos páginas de jornais e tempo de antena nos noticiários. Numa sociedade crescentemente polarizada, os comunistas esforçam-se por manter a unidade e a defesa dos direitos sociais.
Avante! – Como avaliam o desenvolvimento da situação na Catalunha na sequência da mudança de governo em Espanha?
Alba Blanco (AB) – Com esperança. Estávamos a viver uma situação de retrocesso nos direitos sociais e democráticos com o anterior governo do Partido Popular, que reiteradamente e por razões eleitoralistas boicotava os direitos do povo a decidir, a manifestar-se e a expressar as suas aspirações.
Adelina Escandell (AE) – Inclusivamente negava o direito ao diálogo institucional entre o governo regional e o governo central...
AB – … e com atitudes irresponsáveis, por exemplo em matéria de segurança. O governo do PP não autorizou contactos entre os serviços de segurança catalães e as polícias federais. E tivemos o atentado nas Ramblas de Barcelona... Segundo parece, os serviços secretos do Estado Espanhol sabiam que havia uma célula terrorista na Catalunha e que esta iria atacar, mas não informaram. Esperamos que as coisas mudem com o governo do PSOE.
Como se posicionam os Comunistas da Catalunha em relação à questão nacional?
AE – Os comunistas sempre se bateram pelo direito dos povos à autodeterminação. Reivindicamos a celebração de um referendo sobre a independência. Não estamos pela independência e não a vamos defender, mas temos muito clara a ideia de que o povo catalão é um sujeito político que deve poder decidir do seu destino. Queremos um Estado mais confederal, onde possamos decidir do nosso futuro de igual para igual com o governo central e não como subordinados.
Mas a causa da independência tem vindo a ganhar expressão...
AB – Em 2006, o Parlamento da Catalunha aprovou o Estatuto de Autonomia, que foi referendado e enviado às Cortes (parlamento federal), que o rejeitaram. A justificação foi a consagração, no Estatuto, da Catalunha como nação dentro do Estado espanhol. Este é um problema histórico, que vem do franquismo, cuja tese central era a de que a Espanha era «una, grande e livre».
A tensão agudizou-se a partir daí?
AB – O apoio ao independentismo na Catalunha situa-se historicamente nos 12 por cento e, em momentos mais intensos, atingia 20 por cento. Ou seja, era relativamente baixo. Mas a rejeição do Estatuto, a degradação dos direitos nacionais e a estratégia do PP de polarizar as questões nacionais para daí retirar dividendos eleitorais (como antes tinha sido feito com o País Basco) fez crescer como espuma o apoio ao independentismo, que está hoje nos 48 por cento.
AE – O pacto de Estado pós-transição democrática assentava num determinado funcionamento: o Parlamento da Catalunha aprovava o seu Estatuto, havia um referendo e as Cortes aprovavam-no. Ora, este pacto quebrou-se e muita gente que não era independentista passou a olhar para a independência como forma de defender os direitos nacionais do povo catalão. Há pessoas presas por «rebelião», quando não houve qualquer tipo de violência. Nem sequer um caixote do lixo foi queimado... Houve, sim, manifestações imensas, com reivindicação e festa. O independentismo tem vindo a crescer por todas estas razões. A sociedade está muito polarizada.
Numa sociedade tão polarizada, qual o espaço político dos comunistas?
AB – O povo está dividido: em todas as famílias há constitucionalistas e independentistas. Pensamos que um dos papéis dos comunistas é conseguir que os catalães continuem a ser um único povo e garantir que os direitos nacionais e os direitos de classe estejam sempre relacionados. Não podemos permitir que se divida os trabalhadores pela sua posição face à questão nacional.
AE – A favor da independência há burgueses e trabalhadores e o mesmo sucede entre os constitucionalistas.
AB – A defesa dos valores democráticos é outra das nossas bandeiras. Por mais que não acompanhemos a reivindicação de independência, reconhecemos o direito aos independentistas de o serem. Temos uma postura de radicalidade democrática. Não temos nenhum dirigente preso, mas seria pouco responsável fingir que não víamos o que se está a passar.
AE – O nosso Secretário-geral está a braços com um processo judicial por ter defendido, enquanto deputado, que se discutisse no Parlamento a questão da independência. E, como já dissemos, nós não somos independentistas, mas como não discutir no Parlamento o que se debate na rua, o que preocupa as pessoas?
Como avaliam a União Europeia?
AB – No nosso congresso, a discussão sobre a Europa, a UE e as alternativas ocupou grande parte do debate. Entendemos que a UE não corresponde aos interesses dos trabalhadores e dos povos, pois só dá resposta aos interesses do grande capital e dos fluxos financeiros. Queremos explorar alternativas que conduzam à construção de outro modelo de cooperação no marco europeu mais conforme aos interesses dos povos.
Qual será o posicionamento dos Comunistas da Catalunha nas eleições do próximo ano para o Parlamento Europeu?
AB – Como partido não concorremos a eleições, mas integramos a plataforma eleitoral Esquerda Unida e Alternativa. Neste momento procuramos construir a unidade entre forças de esquerda catalãs, expressa na plataforma Catalunha em Comum, além de termos uma aliança eleitoral com o Podemos. Ainda não falamos em candidatos e lugares, mas em ampliar ao máximo as bases sociais do movimento.