ANO LECTIVO Pese embora estejamos longe dos sobressaltos verificados durante os anos do anterior governo PSD/CDS, o início deste ano lectivo evidenciou que muita coisa tem de fazer o actual executivo, considerou o PCP.
O debate ocorrido na sexta-feira, 21, sobre a abertura do ano lectivo, foi requerido com carácter de urgência pelo PCP, que, desta forma, confrontou no plenário da Assembleia da República o ministro da Educação, Tiago Brandão Rodrigues.
Os «problemas graves» que «subsistem» na Escola Pública estiveram em evidência, considerando o Partido que, não se tendo assistido ao «quadro agravado» do período de governação de PSD/CDS, todavia «não é também possível afirmar que tudo corre sobre rodas». Impõe-se, por isso, da parte do Governo, as respostas que exigem «os trabalhadores, os alunos e as suas famílias». As palavras da deputada Ana Mesquita, logo na abertura dos trabalhos, deram o mote para a abordagem do debate por parte da bancada comunista.
Detalhando, a eleita pelo círculo de Lisboa começou por questionar Tiago Brandão Rodrigues a respeito da contagem do tempo de serviço dos professores, notando que «não pode o Governo dizer que nunca houve qualquer compromisso», designadamente no artigo 19.º do Orçamento do Estado em vigor (OE 2018). «E não vale dizer que “é muito simples, não temos dinheiro para todo o tempo de serviço”, porque andamos a pagar 23,9 milhões de euros de juros da dívida por dia», acrescentou.
Ana Mesquita instou ainda o responsável governamental a esclarecer se pretende resolver a situação dos descontos para a Segurança Social dos professores contratados a termo com horário incompleto, a respeito da qual o «Tribunal Administrativo e Fiscal condenou o Ministério a contabilizar todos os 30 dias de trabalho mensais».
Por outro lado, quis saber o que vai fazer a tutela para suprir as carências de funcionários não-docentes, uma vez que se sucedem «relatos de manifesta impossibilidade de cumprimento efectivo dos rácios por falta de substituição de trabalhadores em situação de baixa ou até de aposentação - e o recurso a horas de limpeza, tempos parciais e contratação a termo não é a resposta», sublinhou»; ou que iniciativas assume Tiago Brandão Rodrigues a respeito da situação dos técnicos especializados de educação.
A falta de pessoal e as matérias relacionadas com o ensino inclusivo foram, durante o período de debate parlamentar, alvo de intervenções por parte das deputadas Diana Ferreira e Ângela Moreira, bem como de iniciativas por parte do Partido (ver caixas), tendo Ana Mesquita, na intervenção inicial, reivindicado igualmente a simplificação e desburocratização do processo de distribuição de manuais escolares gratuitos, medida, reclamou com justiça, que avançou «por proposta do PCP nos Orçamentos do Estado de 2016, 2017 e de 2018, e que queremos alargar ao 3.º ciclo e Ensino Secundário».
Discurso evasivo
Abrindo a primeira ronda, e, depois, também numa segunda ronda de perguntas e respostas, Tiago Brandão Rodrigues procurou contornar o fundamental do que estava em causa no debate de urgência solicitado pela bancada do PCP.
Ora aproveitando as intervenções laudatória do partido do Governo, o PS, ora a desfaçatez de PSD e CDS – que sem pudor para com a prática do governo Passos/Portas cavalgaram numa alegada instabilidade nunca antes vista na abertura de um ano escolar (Pedro Pimpão, PSD), estribando argumentos nos problemas com os manuais gratuitos, na falta de pessoal e, até, na «memória dos professores» quanto ao congelamento das carreiras (Ilda Novo, do CDS) –, o Ministro da Educação foi evasivo. Para fazer a apologia dos méritos do Governo minoritário do PS na área da Educação, socorreu-se mesmode uma medida conquistada devido à persistência dos comunistas portugueses: a gratuitidade dos manuais escolares.
Tiago Brandão Rodrigues tirou ainda «da manga» as «cartadas» da autorização [dada quinta-feira, 20, às escolas] de abertura de concursos para a regularização de 2700 funcionários que se mantinham precários, e da decisão de contratar mais 200 não-docentes face às queixas da comunidade educativa quanto à falta de pessoal, situação que levou inclusivamente à não abertura de vários estabelecimentos.
A deputada do PEV, Heloísa Apolónia, que uma e outra vez insistiu para que o ministro desse réplica às suas questões, nomeadamente quanto à contagem do tempo de serviço dos professores, tendo aquele reiterado a intransigência governamental em acolher a reivindicação dos docentes, os quais exigem a contagem dos nove anos, quatro meses e dois dias congelados, razão, aliás, que sustenta o pré-aviso de greve entregue por dez organizações representativas dos professores.
Concretizar
A encerrar o debate, Paula Santos, em nome do Partido, realçou que os problemas trazidos a hemiciclo pelo PCP «não se resolvem com boas intenções, mas com respostas concretas, que o Governo continua a não dar».
Salientou, designadamente, que o que o OE 2018 determina é a negociação, com os sindicatos dos professores acerca do tempo e do modo de descongelamento de todo o tempo de serviço efectivamente prestado. Realçou, também, a urgência em contratar «os auxiliares de acção educativa e os técnicos especializados em falta nas escolas, respeitando os seus direitos», e a necessidade de «alargar e valorizar» a gratuitidade dos compêndios.
«O actual ano lectivo não se inicia com o caos que marcou outros momentos», contudo, «normal seria que todas as escolas iniciassem o ano lectivo dotadas dos meios adequados para assegurar um processo de ensino/aprendizagem com qualidade. E isso não aconteceu», acrescentou Paula Santos, antes de concluir que para «ir mais longe» e materializar a «escola pública, gratuita e de qualidade para todos, verdadeiramente democrática e inclusiva», o Governo minoritário do PS tem de «se liberta dos constrangimentos que estão a impedir o investimento», aludindo, assim, aos condicionalismos e instrumentos da UE a que o executivo liderado por António Costa se mantém fiel.
Necessidades dos alunos
valem mais do que rácios
Questões relativas à falta de auxiliares de acção educativa e técnicos especializados, bem como os termos da respectiva contratação ou não contratação nesta fase de arranque do ano lectivo, foram colocadas a Tiago Brandão Rodrigues durante o debate de urgência pelas deputadas Ângela Moreira e Diana Ferreira.
A primeira, solicitando ao ministro respostas concretas, quis saber como este justifica, então, que dias depois de ter declarado publicamente que «”o Governo cumpria o rácio legal sobre o número de funcionários nas escolas”» e de ter garantido que estavam «”reunidas as condições para o ano lectivo começar com normalidade, temos serviços de apoio às escolas que não funcionam em pleno, temos escolas fechadas e muitas queixas da comunidade educativa quanto à falta destes trabalhadores».
E se «o Governo tem afirmado que cumpre os rácios, mas que há um grande número de baixas prolongadas», então «porque não são estes trabalhadores substituídos conforme está previsto na Lei Geral do Trabalho de Funções Públicas?«, prosseguiu Ângela Moreira, revelando, ali mesmo, que o Partido tem «tido conhecimento de que têm sido recusadas estas substituições quando requeridas», e quando sucedem substituições, estas ocorrem com recurso a contrato a tempo parcial.
Objectos de questionamento pela deputada do PCP foi ainda a situação laboral dos técnicos especializados da educação, os quais «se mantêm anos consecutivos com vínculo precário» ou não viram os respectivos vínculos serem renovados, disse Ângela Moreira, isto depois de ter perguntado se aquele membro do Governo não considerava que, confrontado com a realidade, devia rever o rácio de auxiliares por escola visando o seu reforço.
Intervir
No dia anterior, também em plenário (quinta-feira, 20), Ângela Moreira já havia defendido o projecto de resolução apresentado pelo PCP, a 6 de Setembro, no qual se recomenda precisamente ao Governo que «proceda à revisão da portaria de rácios, promovendo a contratação de auxiliares de acção educativa em falta nas escolas públicas, adequando estes trabalhadores à tipologia dos edifícios escolares, bem como ao adequado funcionamento regular dos serviços de apoio e integrando-os na carreira com vínculo efectivo, pondo fim aos regimes de contratação com vínculo precário», e se insiste «na necessidade de auxiliares de acção educativa com formação adequada ao acompanhamento de alunos com necessidades especiais».
O projecto acabou por baixar à comissão especializada com os votos favoráveis do PCP, BE, PEV e PAN, e a abstenção de PS, PSD e CDS. Mas para a bancada comunista as questões suscitadas mereceram nova intervenção e, tendo Tiago Brandão Rodrigues no debate de urgência já referido, Diana Ferreira pressionou a obtenção de respostas. «É que não há educação inclusiva sem os meios humanos e materiais, sem os meios pedagógicos e técnicos necessários para responder às necessidades de todas e de cada uma destas crianças com necessidades especiais».
«Há terapias que foram interrompidas de um ano lectivo para o outro. Estão lá as necessidades mas faltam os profissionais», denunciou ainda Diana Ferreira.
Agir
Sem perder tempo e face à escassez de respostas ministeriais sobre esta matéria, o grupo parlamentar do PCP fez, entretanto, entrar na AR um pedido de apreciação parlamentar ao decreto-lei que estabelece o regime jurídico da educação inclusiva.
«É a escola que tem de se adaptar à diversidade dos seus alunos, o que significa uma reforma significativa em várias matérias, como currículos, avaliação, pedagogia, além dos referidos meios humanos», defende o Partido, para quem, após a publicação desta nova disposição, subsistem «profundas preocupações».
Preocupações quanto ao «desaparecimento da expressão “necessidades educativas especiais”, passando a figurar “necessidades de saúde especiais”», explica-se no pedido de apreciação parlamentar.
Contesta-se, igualmente, a omissão sobre a «inclusão e integração dos jovens com necessidades especiais no Ensino Superior», a manutenção de «unidades “segregadoras” dentro das escolas» e do conceito de «escolas de referência (todas o deviam ser)», a falta de capacidade inspectiva da entidade competente, e ainda quanto ao desconhecimento e ausência de orientação para as insuficiências nos estabelecimentos ou as várias referências de raiz assistencialista contidas no documento, afirma-se no pedido de apreciação requerido pelo PCP.