Aprovadas medidas do PCP em defesa da floresta, dos agricultores e do mundo rural

PROPOSTAS O Parlamento aprovou dois projectos de lei do PCP sobre as faixas de gestão de combustível florestal, um dos quais prevê a indemnização aos proprietários pelas áreas afectas a esse efeito.

Vítimas dos incêndios têm de ser ressarcidas dos prejuízos sofridos

LUSA


No outro diploma, relativo ao regime excepcional daquelas faixas, são revogadas cirurgicamente as normas que impõem às autarquias um prazo para assegurarem a limpeza em caso de incumprimento dos proprietários. A acompanhar o PCP no voto favorável em ambos os diplomas estiveram PEV e PSD, votando contra PS e PAN, enquanto BE e CDS optaram pela abstenção.

Além deste dois projectos de lei estiveram ainda em debate e votação na passada sexta-feira, 13, quatro outras iniciativas legislativas da bancada comunista, sob a forma de projecto de resolução, três das quais vieram também a ser aprovadas (ver caixa).

Garantida foi assim luz verde em cinco de seis diplomas do PCP, de um total de 24 textos legislativos de todas as bancadas (17 dos quais aprovados, que baixaram à comissão da Agricultura e Mar, para apreciação na especialidade) que estiveram neste debate centrado em temáticas relacionadas com a prevenção dos incêndios, defesa da floresta e do mundo rural, e protecção civil.

Na base do projecto de lei que estabelece os critérios de indemnização aos proprietários pela concretização das servidões administrativas para criação de faixas de gestão de combustível está o reconhecimento de que a afectação da área para esse fim impõe perdas de rendimento que, no actual quadro legislativo, não são compensadas.

«No caso das propriedades florestais, em minifúndio, esta obrigação pode mesmo inviabilizar a exploração florestal, favorecendo o abandono do mundo rural do interior norte e centro do País», alertou João Dias, justificando o diploma da sua bancada com o qual se altera a lei de 2006 do Sistema Nacional de Defesa da Floresta Contra Incêndios.

Situação que a bancada do PS não quis admitir, argumentando, pela voz de Santinho Pacheco, que a «actual legislação já estipula que as faixas secundárias previstas nos planos municipais de defesa da floresta contra incêndios podem ser declaradas de utilidade pública».

Não à chantagem

Já quanto ao projecto de lei sobre o regime excepcional das redes secundárias de faixas de gestão de combustível, o que o PCP propõe é a revogação de três normas do artigo do OE de 2018 que determina que até 31 de Maio de 2018 as câmaras municipais garantem a realização de todos os trabalhos de gestão de combustível, devendo substituir-se aos proprietários e outros produtores florestais que não tenham procedido à limpeza dos terrenos.

Tal como estão obrigadas, ainda segundo o mesmo artigo, a efectuar a limpeza em torno da rede eléctrica, exigência que na óptica do PCP não tem qualquer sentido, uma vez que essa é uma responsabilidade da REN e da EDP, empresas cujos lucros milionários são, além do mais, bem conhecidos.

Do mesmo modo que é «inaceitável», foi ainda João Dias a afirmá-lo, que os municípios que não tenham procedido a essa gestão de combustível no prazo de 75 dias fiquem sujeitos à retenção de 20 por cento das transferências do OE no âmbito do Fundo de Equilíbrio Financeiro.

A todas estas propostas o PS se opôs, alegando que a revogação dessas normas é «descabida e extemporânea», dá um «sinal errado aos proprietários e autarquias», é «voltar atrás ao tempo de deixa andar».

Tese que Jorge Machado contrariou insistindo que as normas em causa dizem respeito a «processos de chantagem», primeiro «sobre as pessoas», depois «sobre as autarquias», que não têm os «meios suficientes» para cumprir essas imposições do Governo.

E a este respeito perguntou se o PS acha mesmo que as reformas na floresta podem concretizar-se à custa de «chantagem e de cortes financeiros às autarquias» ou, ao invés, o caminho passa pelo «envolvimento de todos» nesse projecto colectivo de prevenção estrutural.

Ressarcir prejuízos

Num debate onde as bancadas à direita se desdobraram em críticas ao Governo, acusando-o de «manobras de propaganda nunca vistas», de ter estado no «epicentro das falhas dos incêndios», e de «não estar a fazer o suficiente» - e em que se assistiu a um passa-culpas entre PS e PSD no que toca às medidas estruturais que nenhum tomou anteriormente -, foi ainda o PCP, tal como o PEV, a ter em consideração os que sofreram com a tragédia do ano passado e a ver aprovada uma resolução (com as abstenção de PS, CDS e PAN e os votos favoráveis das restantes bancadas) onde se recomenda ao Governo a reabertura das candidaturas para apoio às vítimas dos incêndios, bem como a fixação de um calendário para o seu pagamento e «clarificação e extensão» dos respectivos critérios.

«Abra-se um novo período de candidaturas, para garantir que as vítimas dos incêndios são ressarcidas dos prejuízos sofridos, e para que não sejam excluídos cidadãos apenas porque não foram capazes ou não puderam candidatar-se numa primeira fase», foi o apelo deixado no debate por João Dias.

Urge alterar modelo de protecção civil

São 20 as medidas que integram o projecto de resolução do PCP «Para uma nova política de protecção civil», o único dos seis diplomas seus em debate que foi reprovado, devido à conjugação dos votos contra do PSD com a abstenção do PS, CDS e PAN.

A alteração do actual modelo conceptual do Sistema de Protecção Civil é hoje uma necessidade inquestionável, mais de dez anos depois da sua adopção na sequência dos trágicos incêndios de 2003 e 2005, mas Jorge Machado rejeitou que essa discussão possa estar «refém de calendários mediáticos» ou feita «à margem dos agentes de protecção civil».

Daí que, não por acaso, a primeira das vinte medidas preconizadas pelo PCP para uma profunda alteração do modelo vigente seja precisamente a que advoga a «efectiva participação» quer de todos os agentes de protecção civil quer da população por via de um debate público.

«Qualquer alteração do modelo feita em gabinetes sem o contributo e a valorização dos Bombeiros Portugueses é o caminho para o desastre», reiterou o parlamentar comunista, antes de enumerar algumas das principais medidas que constam do diploma, abrangendo questões tão diversas como a dotação de meios e recursos, técnicos e humanos, para o desempenho das missões; a elaboração de cartas de risco; o financiamento das câmaras municipais e a revisão da lei de financiamento das associações de bombeiros; as condições sócio-profissionais dos bombeiros; a informação e sensibilização necessárias à melhoria dos níveis de auto-protecção e à redução dos riscos.

Audições são para cumprir

O PCP quer ver concretizadas as audições trimestrais a ministros sobre matérias relacionadas com os fogos florestais, tendo apelado nesse sentido ao presidente da Assembleia da República.

Trata-se de fazer cumprir o requerimento da bancada comunista, aprovado por unanimidade em Janeiro último, para que sejam ouvidos de forma regular, na comissão de Agricultura e Mar, os ministros das Finanças, da Agricultura, Florestas e Desenvolvimento Rural e do Planeamento e Infra-estruturas quanto ao acompanhamento e monitorização das medidas de prevenção e da legislação produzida em matéria de floresta, na sequência dos incêndios de 2017.

«As audições têm sido sistematicamente adiadas ou com pretextos de imperativos de agenda dos ministros - como se não tivessem obrigação de prestar contas à Assembleia da República - ou por iniciativa dos grupos parlamentares de PS, PSD, CDS e BE, que se manifestaram indisponíveis para realizá-las fora do agendamento regular» dos trabalhos da comissão, refere o PCP na carta enviada a Ferro Rodrigues, onde considera ainda que «não se pode admitir que os membros do Governo se furtem à fiscalização pela Assembleia da República e à prestação de contas a que estão obrigados, muito menos é admissível numa matéria tão importante».

Esta fuga à prestação de contas por parte de membros do Executivo foi também criticada no debate pelo deputado comunista João Dias, que considerou o atraso «já muito significativo e provavelmente irrecuperável», defendendo que a «propaganda do Governo pelo País não substitui o questionamento, a contraposição de factos e opiniões e a fiscalização pelos deputados eleitos».

Atrasos por explicar

Anunciada por Jorge Machado no decurso do debate foi a apresentação nesse mesmo dia, na primeira comissão, de um requerimento para que o ministro da Administração Interna e o presidente da Protecção Civil prestem esclarecimentos no Parlamento sobre a «preparação, meios e respostas» para a fase mais crítica de incêndios que se aproxima.

De acordo com informações e relatos que lhe têm chegado, o Grupo Parlamentar comunista considera haver justificadas razões de preocupação para os «atrasos que se verificam na preparação da protecção civil para a época mais crítica de incêndios».

Pondo de lado as medidas de fundo, cuja aplicação demora necessariamente mais tempo, o que está em causa são atrasos na resolução de questões mais imediatas e incontornáveis como sejam o incremento das «equipas permanentes», «definição das directivas operacionais», «problemas nas comunicações» (SIRSP), atrasos nos concursos públicos para a aquisição de meios aéreos», sumariou Jorge Machado.

 Respostas aos problemas

Além dos dois projectos de lei da sua autoria - um, sobre o regime excepcional das redes secundárias de faixas de gestão de combustível; o outro, relativo aos critérios de indemnização pela concretização das servidões administrativas para criar faixas de gestão de combustível - , o Grupo parlamentar do PCP viu ainda aprovados três projectos de resolução.

Um deles recomenda ao Governo a criação e manutenção actualizada de um portal electrónico onde seja divulgada informação relacionada com as respostas criadas na sequência dos incêndios florestais de 2017.

A reabertura das candidaturas para apoio às vítimas desses fogos, bem como o estabelecimento de um calendário adequado para pagamento desses apoios e a clarificação e extensão dos seus critérios, é outra das recomendações que a AR faz ao Governo por proposta do PCP.

Avançadas, num terceiro diploma, são «medidas de apoio à agricultura familiar como opção estrutural para a defesa e desenvolvimento do mundo rural, em especial nas zonas atingidas pelos incêndios».





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