CONTRADIÇÕES O Irão vive uma situação política, económica e social complexa. Enfrenta ingerências do imperialismo, ao mesmo tempo que, no plano interno, surgem expressões de descontentamento popular.
As manifestações populares no Irão, nas últimas duas semanas, que se estenderam a diversas cidades do país, entre elas Teerão, Mashhad, Isfahán e Rassht, provocaram pelo menos uma vintena de mortos. Os manifestantes protestavam contra a subida dos preços de produtos alimentares e outros, como o gás, contra a pobreza, o desemprego, a corrupção.
As autoridades consideram que os protestos, de início pacíficos, degeneraram em distúrbios quando «grupos de sabotadores, alguns armados, destruíram propriedades públicas e privadas». Atribuem as culpas da violência à ingerência estrangeira e denunciaram uma conspiração que visa desestabilizar o Irão, urdida pelos Estados Unidos, Israel e Arábia Saudita, depois dos seus fracassos na Síria e no Iraque.
O presidente iraniano, Hasan Rohani, reconheceu as dificuldades económicas do país e reafirmou que a população tem o direito de organizar manifestações de protesto, desde que pacíficas e de acordo com as leis da República Islâmica.
O parlamento iraniano, já esta semana, criou um grupo para estudar a ingerência exterior nos protestos anti-governamentais. O porta-voz da Comissão de Segurança Nacional e Política Externa, Husein Naqavi Huseini, assegurou que há documentos «fidedignos e firmes» sobre a influência estrangeira nos distúrbios. E anunciou que os deputados trabalharão «para satisfazer as necessidades do povo, acabar com os possíveis factores de descontentamento e evitar as provocações (…) e assim impedir outras conspirações».
Uma visão distinta dos acontecimentos é a do Partido Tudeh do Irão, ilegalizado. Os comunistas consideram que a pobreza crescente, a subida dos preços e o desemprego crónico, «que arruinaram as vidas de um largo sector da população e em particular da juventude», a «completa bancarrota económica» do regime teocrático e a «escalada das pressões externas» criaram «uma situação muito crítica e explosiva» na sociedade.
Em diversos comunicados, o Tudeh testemunha a importância das manifestações populares «contra a subida de preços, a opressão e as injustiças». Não considera que tais protestos sejam «conspirações» mas denuncia «a reacção regional», apoiada pelos EUA e por Israel, que procura explorar as contradições no Irão para «mudar o actual regime reaccionário por outro regime reaccionário». E apela ao reforço da luta organizada de diferentes sectores sociais – «dos operários e todos os trabalhadores aos jovens, estudantes, mulheres e intelectuais progressistas».
Fracasso dos EUA
Logo que se registaram os primeiros protestos no Irão, os EUA apoiaram publicamente os distúrbios e convocaram de urgência o Conselho de Segurança das Nações Unidas.
O ministro iraniano dos Negócios Estrangeiros, Mohamad Yavad Zarif, qualificou de «fracasso» para os EUA essa reunião, no passado dia 5, em Nova Iorque. O diplomata revelou que a maioria dos 15 membros do Conselho de Segurança pronunciou-se pela não ingerência nos assuntos internos do Irão.
De acordo com Zarif, ao longo da sessão, a maioria dos oradores considerou as manifestações uma questão interna do Irão e propôs que se discutissem antes temas como a luta contra o terrorismo, a paz no Médio Oriente e as crises na Síria, Iraque e Iémen.
Já o embaixador de Teerão na ONU, Gholam Ali Khoshroo, evocou perante membros do Conselho de Segurança a «longa história» de ingerência de Washington nas questões internas da nação persa. Recordou que «a ingerência no caminho da democratização» do Irão começou em 1953, quando os EUA organizaram «um golpe contra o primeiro-ministro legítimo» do país, uma referência ao derrube de Mohammad Mosaddeq.
Khoshroo afirmou que, desde então, os EUA «apoiaram tentativas de golpes militares e sabotagens no Irão, impuseram várias sanções ilegais e anti-humanitárias contra os iranianos».