A Revolução de Outubro vive e viverá!
SOCIALISMO Com a sessão evocativa de 9 de Dezembro no Porto em que, após um belíssimo espectáculo de música, dança e canto de denso conteúdo revolucionário, usou da palavra o Secretário-geral do Partido, encerrou-se o programa central de comemoração da Revolução de Outubro promovida pelo PCP. Ao longo de todo o ano de 2017, cumprindo a Resolução do Comité Central de 18 de Setembro de 2016, tiveram lugar centenas de iniciativas – acões de propaganda, exposições, conferências, debates temáticos, artigos, livros – em que é de salientar a realização do Seminário «Socialismo, exigência da actualidade e do futuro» e o grande Comício de 7 de Novembro no Coliseu dos Recreios de Lisboa precisamente cem anos depois das salvas do cruzador Aurora e do assalto ao Palácio de Inverno.
A dimensão das campanhas de falsificação da História é enorme
Perante um tão amplo e ousado programa, em que directamente participaram muitos milhares de pessoas, haverá quem pergunte porquê, num quadro político tão complexo e exigente, o PCP dedicou tanta atenção a esta efeméride. A resposta é muito clara.
Por simples questão de coerência revolucionária.
Por dever de memória perante aquele que foi o maior acontecimento libertador da história da Humanidade.
Porque só sabendo de onde vimos saberemos para onde vamos e o projecto comunista do PCP – partido que sendo criação do movimento operário português nasceu sob o impulso da Revolução de Outubro – deve muito a Lénine e ao partido bolchevique que criaram o primeiro governo de operários e camponeses e desbravaram o caminho da construção de uma sociedade nova sem exloradores nem explorados.
Porque a Revolução de Outubro e o empreendimento a que deu lugar na União Soviética, não é algo que deva arrumar-se no museu da História, algo de glorioso mas que fez o seu tempo. Não, a Revolução de Outubro vive e viverá pois ela encerra experiências e ensinamentos de grande valor e actualidade para a luta que hoje travamos pela superação revolucionária do capitalismo.
Porque se há uma questão em torno da qual a luta ideológica é particularmente aguda essa questão é a Revolução de Outubro com tudo o que lhe está associado: Lénine e o desenvolvimento do marxismo na época do imperialismo, o partido de novo tipo, a táctica e a estratégia revolucionária da classe operária, o poder dos trabalhadores como forma superior de democracia, a propriedade social ao serviço do povo, o direito dos povos à autodeterminação, uma política de paz e de solidariedade internacionalista.
Uma necessidade histórica
A grande dimensão das campanhas contra a Revolução de Outubro explica-se porque, deitando por terra todos os dogmas da ideologia burguesa, ela mostrou a possibilidade de arrebatar o poder económico e político ao Capital e reorganizar a sociedade sem o chicote da exploração de classe. Porque até Outubro todas as revoluções, por mais profundas que fossem, substituíam sempre uma classe exploradora por outra classe exploradora enquanto com o poder proletário se tratou de acabar definitivamente com a exploração do homem pelo homem. Tão grande audácia não podia passar sem uma violenta resistência da classe dominante. Sabemos dos milhares de escravos crucificados na via Ápia pelo império romano para que um novo Spartacus jamais tentasse acabar com a escravidão. Sabemos como a Revolução Francesa de 1848 e, sobretudo, a Comuna de Paris de 1871 foram afogadas em sangue. As classes exploradoras nunca recuaram perante nenhum crime para defender o seu poder. Assim foi também com a Revolução de Outubro – que Churchill queria a todo o custo matar no berço – com a invasão das 14 potências, com a guerra civil, com a sabotagem e o cerco económico e diplomático à URSS, com a invasão nazi-fascista, com a «guerra fria» e a chantagem nuclear que impôs ao país dos sovietes colossais despesas para se defender e defender a paz mundial.
Todas estas tentativas de destruir a Revolução de Outubro e os seus frutos fracassaram, o que diz muitíssimo sobre a correspondência desta revolução com as exigências do desenvolvimento histórico na Rússia e no mundo. Longe de ser um «erro», um «acidente» histórico, um «golpe» de conspiradores, a Revolução de Outubro correspondeu a uma necessidade histórica inaugurando a época da passagem do capitalismo ao socialismo. Os setenta anos de existência da União Soviética, as suas extraordinárias conquistas e realizações, a sua influência determinante na marcha do século XX, são a prova da importância histórica da Revolução de Outubro e da viabilidade, necessidade e superioridade do socialismo.
É certo que esta realidade está obscurecida pelas derrotas do socialismo na URSS e nos países do Leste da Europa, derrotas que são exploradas para «demonstrar» a inviabilidade do socialismo e do comunismo.
É por isso da maior importância mostrar que o desaparecimento da União Soviética não põe em causa o carácter histórico universal da Revolução de Outubro, não apaga as extraordinárias conquistas alcançadas por um país que sofreu duas guerras mundiais devastadoras e se transformou em tempo histórico muito curto numa potência mundial de primeiro plano, não diminuem a influência da URSS nas conquistas dos trabalhadores dos países capitalistas, no extraordinário ascenso do movimento de libertação nacional e derrocada dos impérios coloniais e, muito especialmente, na libertação da Humanidade do flagelo do nazi-fascismo.
Falsificação da História
Muitos estaremos bem lembrados das campanhas sobre a «morte do comunismo» e o «declínio irreversível do PCP» que acompanharam o desaparecimento da URSS e do campo socialista. O tempo passa mas há coisas que se diluem no tempo que é nosso dever dar a conhecer às novas gerações dentro e fora do Partido. O modo audacioso e de princípio como o PCP reagiu a tão avassaladora campanha constitui um ponto alto na história do nosso colectivo partidário. Ao contrário de outros partidos que renegaram a própria história, enveredaram pela social-democratização ou se auto-liquidaram, o PCP convocou um Congresso extraordinário em Maio de 1990, elaborou teses que foram discutidas em todo o partido, afirmou e confirmou a sua identidade comunista, sublinhou que o que foi derrotado não foi o socialismo mas um «modelo» que se afastou e entrou mesmo em contradição com os valores e ideais do socialismo e mostrou que as derrotas do socialismo teriam as mais graves consequências para o mundo.
Em Portugal tiveram lugar, além das iniciativas promovidas pelo PCP, muitas outras iniciativas sérias sobre a a Revolução de Outubro. Devem ser valorizadas. Mas a dimensão das campanhas de falsificação da História é enorme. Basta entrar numa livraria para ver o grande número de obras de propaganda anti-comunista e anti-soviética. A imprensa cumpre disciplinadamente o papel de divulgadora de obras de «investigação» de académicos e politólogos como aquela pérola que durante semanas o Expresso ofereceu gratuitamente ou as entrevistas de páginas e páginas a uns tais Figues ou Sebestians com que o Diário de Notícias e o Público brindaram os seus leitores e que chegam ao ponto de tentar confundir a luta libertadora dos comunistas com a acção terrorista do chamado «Estado Islâmico». Numerosos comentadores confortavelmente instalados nas suas «colunas de opinião» ao mesmo tempo que cobrem a Revolução de Outubro com os insultos mais soezes aproveitam a oportunidade para vomitar o mais recalcado e rasteiro ódio contra o PCP e o seu insubstituível papel na vida política nacional, como, sem surpresa aliás, se verificou como reacção ao importante discurso de Jerónimo de Sousa, de 7 de Novembro. Mesmo trabalhos que reconhecem que a Revolução de Outubro foi um acontecimento de grande impacto histórico, fazem-se acompanhar de prefaciadores e articulistas que dão largas ao seu anti-sovietismo e simpatias reformistas e trotskizantes. Na organização de debates e conferências «académicas» a voz dos comunistas e dos amigos da União Soviética é sistematicamente descriminada.
Entretanto os factos falam por si e há portanto que ignorá-los, escondê-los, deformá-los e, quando forçados a reconhecer a existência de realizações só possíveis pela superioridade do novo sistema económico e social, atribui-los a imposições de natureza ditatorial, mesmo sangrentas, transformando aquela que foi a mais democrática das formas de poder até então existentes – o poder proletário, os sovietes, a participação directa, activa e criadora das massas no processo de construção da própria vida – num «totalitarismo» semelhante ao nazi-fascismo se não mesmo ainda mais desumano e cruel.
O ataque sistemático ao ideal e ao projecto comunista conduzido pelos centros de produção e reprodução da ideologia dominante é tanto mais necessário ao capitalismo quanto cada dia que passa é mais evidente não apenas a sua congénita incapacidade para dar solução aos problemas dos trabalhadores e dos povos, mas a a tendência para a agudização das suas taras e contradições. A acentuação do carácter explorador, opressor, agressivo e predador do capitalismo aí está ameaçando a Humanidade de uma terrível regressão civilizacional e de conflitos militares de proporções devastadoras evidenciando os seus limites históricos e exigindo a sua superação revolucionária.
Luta de vida ou de morte
no plano das ideias
É certo que o processo de transformação social deu um gigantesco salto atrás com as derrotas do socialismo, embora haja países que como Cuba, China, Vietname e outros que persistem na via do socialismo e desempenham um papel de grande importância no processo de rearrumação de forças à escala mundial e no combate contra o imperialismo e contra a guerra.
Mas no meio de tantas dificuldades e perigos não podemos perder a perspectiva histórica e esquecer que vivemos a época da passagem do capitalismo ao socialismo que a Revolução de Outubro inaugurou, e que numa situação geral global em que se aprofunda a crise estrutural do capitalismo e amadurecem as condições materiais objectivas para a superação revolucionária do capitalismo, a grande tarefa dos comunistas é criar as condições subjectivas de organização, consciência e vontade política das massas sem cuja intervenção revolucionária nenhuma revolução é possível.
É em torno desta questão decisiva que se trava uma luta de vida ou de morte no plano das ideias. A classe dominante procura roubar-nos a memória e impor uma versão da história da Revolução de Outubro, das experiências do socialismo e da acção do movimento comunista internacional, como uma sucessão de acidentes, erros, fracassos e mesmo crimes, procura negar a necessidade e viabilidade do socialismo, tenta mesmo criminalizar a própria ideologia comunista. Matar o ideal comunista no próprio berço, semear a impotência e o conformismo entre as massas, impedir a recuperação e o fortalecimento dos partidos comunistas, é a obsessão da classe dominante. É a tudo isso que fazemos frente com convicção, defendendo a verdade histórica, aprendendo com as lições da experiência, persistindo na construção do Partido, na sua ligação com a classe operária e as massas, na luta pela realização do Programa de «Uma democracia avançada, os valores de Abril no futuro de Portugal», etapa actual da luta em Portugal pelo socialismo e o comunismo.
Sim, valeu a pena o tempo que dedicámos às comemorações da Revolução de Outubro. Como afirmou no Porto Jerónimo de Sousa «saímos destas comemorações mais fortalecidos, mais conhecedores e mais convictos da justeza da nossa luta».