Quem defende os interesses e direitos dos nossos emigrantes?
DIÁSPORA O dia 18 de Dezembro foi declarado como Dia Internacional dos Migrantes. Sem prejuízo de uma análise mais alargada a todas as dimensões deste problema, importa chamar a atenção para alguns dos problemas reais vividos pelos nossos emigrantes.
Não basta anunciar medidas que vão ao encontro das aspirações das pessoas. É necessário levá-las à prática
A abordagem jornalística do secretário de Estado das Comunidades, José Luís Carneiro, aos problemas das comunidades portuguesas e a apreciação da dimensão e importância da acção consular no estrangeiro, a partir da estatística dos actos consulares realizados, escamoteiam e lateralizam o tratamento dos reais problemas dos portugueses que vivem, trabalham ou estudam no estrangeiro, prosseguindo, assim, o traço dominante das políticas praticadas há muitos anos.
É que não será a abertura de museus, por muito efeito simbólico e mediático que possa ter, nem o alargamento dos futuros currículos de ensino a uma «história da emigração» que respondem aos problemas e desafios que se colocam na actualidade a quem procurou e procura, fora de seu país, melhoria de condições de vida e de trabalho, realização profissional e pessoal.
Louvar o número de actos consulares realizados e não falar das condições de trabalho dos trabalhadores consulares, do seu número reduzido para prestação deste serviço público com qualidade e celeridade, que evite as demoras na marcação telefónica para atendimento ou para execução de documentos, que combata a desumanização dos serviços de atendimento, com a implementação de call centers onde grassa a precariedade laboral, e não falar das medidas necessárias para encurtar as enormes distâncias que têm de ser percorridas para tratamento de problemas de maior complexidade, repondo consulados que encerraram indevidamente, abrindo mais postos consulares próximos dos utentes, melhorando e alargando as permanências consulares, é querer tapar o sol com a peneira.
Falta vontade política para resolver problemas
Não basta anunciar medidas que vão ao encontro das aspirações das pessoas. É necessário levá-las à prática e garantir que são postas em funcionamento com eficácia.
A intensificação do uso dos novos instrumentos tecnológicos à disposição dos humanos é positiva, mas o crescente número de pedidos de ajuda consular, como diz o próprio secretário de Estado, não dispensa a importância do contacto com um rosto, a existência de alguém que está ali para ajudar na resolução de um problema, para esclarecer uma dúvida, já para não falar nas pessoas que não estão à vontade para lidar com as novas tecnologias.
São muitas as situações que ilustram o que foi referido. Basta que o senhor secretário de Estado fale directamente com os emigrantes, ouça o que os membros do Conselho das Comunidades Portuguesas (CCP) têm a dizer, aprofunde os problemas que vêm a público, em Londres, na Suíça, na Bélgica, na França e noutros países, isto para falar só da Europa.
A contratação dos trabalhadores consulares em falta é condição obrigatória para garantir a qualidade dos serviços públicos a que os utentes têm direito.
E também é preciso não meter debaixo do tapete os problemas sócio-profissionais que se colocam a esses trabalhadores e para a resolução dos quais pouco se vê de medidas estruturais, desde logo o problema ligado com a relação remuneração/custo de vida do país respectivo, sobre a qual é aplicado o IRS, ignorando que aquele valor de remuneração resulta da colocação do trabalhador naquela situação concreta por razões ligadas a uma realidade concreta, e não por um qualquer aumento salarial sobre o qual incide, e bem, o respectivo imposto. É assim tão difícil resolver isto?
Não é! Não há é vontade política. Basta ver os resultados da votação da proposta do PCP para o Orçamento do Estado para 2018, de alteração ao código do IRS dos trabalhadores consulares e missões diplomáticas, que pretendia corrigir a «sobretributação» mediante a não sujeição a IRS de uma percentagem da remuneração destes trabalhadores: o PS votou contra, PSD e CDS abstiveram-se e só o PCP e BE votaram a favor, tendo sido a proposta rejeitada.
O ensino da Língua e Cultura portuguesas
Falar da importância mundial da língua portuguesa e, na prática, destruir o ensino de português no estrangeiro como língua materna ou «de herança» para os luso-descendentes, únicos alunos portugueses a pagar propina no Ensino Básico e Secundário, ao mesmo tempo que se favorece e estimula políticas de ensino de português como língua estrangeira, com incidências negativas na qualidade dos conteúdos lectivos e, em muitos casos, com professores pagos pelo Estado português a leccionar em cursos compostos maioritariamente por estrangeiros, é não estar a respeitar o preceito constitucional de garantir aos filhos dos emigrantes o ensino da língua materna. Ensinar português a estrangeiros é um objectivo importante para o nosso País mas sem pôr em causa a opção estratégica do ensino da Língua e Cultura portuguesas no estrangeiro. Daí a nossa insistência na abolição da propina, na distribuição gratuita dos manuais escolares aos estudantes, na necessidade de qualificar os professores do Ensino do Português no Estrangeiro (EPE) e de lhes garantir condições salariais, de evolução nas carreiras e direitos equiparados aos restantes professores.
É assim tão difícil resolver isto? Não é! Não há é vontade política.
Recorda-se que quando não estava no governo o PS era contra a propina, mas agora a proposta do PCP para abolição das propinas no EPE e para a gratuitidade dos livros escolares foi rejeitada com os votos contra do PS, PSD e CDS.
É preciso esclarecer e apoiar
Não se esgotam nestas matérias os problemas com que se confrontam os portugueses que vivem no estrangeiro e são grandes as preocupações em relação ao futuro.
A agudização da crise estrutural do capitalismo, nomeadamente na União Europeia, conduz ao aumento da exploração, da pobreza, das discriminações, do racismo e da xenofobia, e à adopção de medidas securitárias de restrição de liberdades e garantias dos migrantes.
Em situações como o Brexit no Reino Unido é necessário reclamar que, na negociação entre o Reino Unido e a União Europeia, bem como na intervenção do Governo português junto das autoridades britânicas, sejam salvaguardados os interesses dos cidadãos nacionais com a aprovação de medidas concretas e não apenas com declaração de intenções.
As medidas excepcionais de reforço consular devem ser acompanhadas por um esclarecimento actualizado da comunidade sobre a situação, nomeadamente no que respeita ao estatuto de residência permanente – o chamado setlled status –, como se vai processar o futuro, que condições são exigidas, o que têm de fazer, etc.
Uma política para as comunidades portuguesas no estrangeiro não pode passar por cima do crescente número de casos de portugueses a recorrer a apoios sociais dada a situação de pobreza em que se encontram, nem dos impactos que as regressões em matéria de direitos laborais, em curso em vários países, têm também nos portugueses que nesses países trabalham, nem dos casos de trabalho precário e ilegal, realizado tantas vezes em condições humanas deploráveis e a baixos salários.
O Movimento Associativo Emigrante
O Movimento Associativo Emigrante, inserido na vivência dos portugueses no estrangeiro, tem tido um papel muito importante que nem sempre é devidamente valorizado, estimulado e apoiado com meios materiais, técnicos e formação para a sua actividade.
Mas para um maior conhecimento, por parte das instituições portuguesas, dos anseios e aspirações das comunidades é necessário dar regularidade ao funcionamento dos órgãos por elas eleitos, como é o caso do Conselho das Comunidades Portuguesas, recusando a sua governamentalização e criando condições para o exercício das suas competências enquanto órgão consultivo do Governo para as políticas relativas à emigração.
O PCP, valorizando o papel insubstituível do CCP, apresentou uma proposta de reforço de verbas no
Orçamento do Estado para 2018, que foi derrotada pelos votos contra do PS e a abstenção do PSD e CDS.
O insubstituível papel do PCP
Afinal quem defende as «nossas comunidades espalhadas pelo Mundo»? São aqueles que fazem belos discursos e textos, ou quem propõe e luta por medidas que vão ao encontro da resolução dos problemas e das aspirações dos portugueses que vivem no estrangeiro?
Basta de conversa fiada! Pela parte do PCP podemos afirmar que defendemos uma política patriótica e de esquerda para as comunidades, que orientará a nossa intervenção política e a nossa luta. Sempre com os portugueses na defesa dos seus interesses e no apoio às suas justas aspirações.