<font color=0093dd>Fogo que devasta o centro do País era catástrofe anunciada</font>
INCÊNDIOS A maior tragédia humana provocada por fogos em Portugal assenta em razões estruturais para as quais o PCP tem vindo a alertar há anos e que, em face da catástrofe que se abate sobre o Centro do País desde sábado, 17, emergem das cinzas entre fenómenos que estão longe de explicar o que sucedeu.
O PCP tem vindo a alertar, a intervir e a produzir propostas assertivas
LUSA
Às 13h45 de sábado, em Pedrógão Grande, deflagrou um incêndio que rapidamente se propagou aos concelhos vizinhos de Figueiró dos Vinhos e Castanheira de Pera. A meio da tarde do dia 17, espessas colunas de fumo ofuscavam o sol trazendo uma escuridão que entrou noite dentro e só foi interrompida pelos clarões das chamas que provocaram a muitos a perda do mais precioso que tinham e avultados danos materiais.
Logo no domingo, 18, o Secretário-geral do PCP, expressou o profundo pesar do Partido, manifestou condolências aos familiares das vítimas, enalteceu o papel dos que enfrentavam as várias frentes de fogo e garantiu que os deputados do PCP na Assembleia da República e no Parlamento Europeu «vão fazer todos os esforços para que sejam avaliados e canalizados os meios que possam permitir às pessoas colmatar os prejuízos nas suas vidas, habitações e bens».
As labaredas lamberam inclusivamente a localidade de Avelar, concelho de Ansião, distrito de Leiria, para onde foi deslocado o posto de comando da Protecção Civil, o qual já tinha estado instalado na vila de Pedrógão.
Para além daquele, o fogo que continuava a lavrar no concelho de Góis, também desde sábado, por contágio do incêndio que galgou na Pampilhosa da Serra, registava um agravamento, obrigando à evacuação de mais de uma dezena de aldeias que se mantinham sem comunicações, água e electricidade desde o fim--de-semana. Cenário idêntico viveu-se em várias localidades por estes dias.
O Instituto Português do Mar e da Atmosfera (IPMA) voltou a declarar risco máximo de incêndio em Figueiró dos Vinhos, Castanheira de Pera e Alvaiázere, Vila Velha de Ródão, Proença-a- -Nova, Vila de Rei, Oleiros e Sertã , Penela, Miranda do Corvo, Lousã, Góis, Pampilhosa da Serra, Arganil e Ferreira do Zêzere, Abrantes e Mação, concelhos de quatro distritos por onde se estende o Pinhal Interior do território continental nacional (Leiria, Coimbra, Castelo Branco) ou que com este confinam (Santarém).
O IPMA tem vindo a sustentar que o espoletar da catástrofe que ontem todavia prosseguia se deve às condições meteorológicas adversas e extraordinárias. Elevadas temperaturas e baixíssimos índices de humidade, associados a um acumulado de baixa precipitação e a trovoada seca foram determinantes para a ignição em Pedrógão Grande, sugere o Instituto.
A Polícia Judiciária, por seu lado, afirma que já identificou a origem do incêndio na árvore que depois de ter sido atingida por uma descarga eléctrica se transformou numa tocha que espalhou o braseiro mortal e destrutivo. O Ministério Público, face à existência de vítimas mortais, abriu um inquérito criminal para apurar as causas do incêndio.
Fenómenos e estrutura
Na noite de segunda-feira, 19, perante a gravidade dos acontecimentos, o primeiro-ministro assinou um despacho em que exige ao IPMA que detalhe a conjugação de factores anormais que, de acordo com esta entidade, estarão na base do trágico incêndio iniciado em Pedrógão Grande. António Costa pretende igualmente esclarecer se houve ou não falhas no SIRESP – Sistema Integrado de Redes de Emergência e Segurança de Portugal (rede Estatal que custou cerca de 400 milhões de euros ao erário público), bem como sobre a razão do não encerramento da Estrada Nacional 236 na noite de sábado, embora, em relação a este último aspecto, já anteontem, em entrevista à TVI, o chefe do Governo tenha adiantado que o ocorrido na N236 foi «repentino e inusitado». A ser verdade, o facto pode ilibar a GNR e a cadeia de comando da Protecção Civil sobre a tragédia na agora chamada «estrada da morte», dando suporte aos relatos que indicam que o fogo era atiçado por uma espécie de furacão.
Na N236, que liga Castanheira de Pêra e Figueiró dos Vinhos, morreram na noite de sábado 47 das 64 vítimas mortais já confirmadas. Para além destas, estão contabilizados cerca de 150 feridos.
Da «estrada da morte» raros foram os que saíram com vida. A maioria dos que tentavam escapar ao fogo que consumia as comunidades adjacentes, em carros, entre o fumo, foi engolida e calcinada pelas chamas numa via asfaltada, mas sem aceiros regulamentares.
Famílias inteiras ficaram destroçadas pelo desaparecimento dos seus entes queridos. Os que sobreviveram permanecerão com marcas irreparáveis, conservando a memória da(s) perda(s), dos momentos de horror e desespero.
Quatro bombeiros que seguiam num carro de combate a incêndios e que foi abalroado precisamente na N236, encontram-se internados, alguns em estado grave. Além do mais, lamentam a morte de um camarada da corporação de Castanheira de Pera que não resistiu aos ferimentos. Como eles, venceu o pânico e abandonou a viatura para salvar vidas, mesmo sabendo que provavelmente defrontaria uma sentença fatídica.
A legislação obriga a que entre uma estrada e a primeira cortina arbórea distem 10 metros, e que cada linha de árvores esteja separada por pelo menos quatro metros. Na N236 aquela bitola normativa não era cumprida, o que se revelou fatal e, mais importante, coloca questões de responsabilidade, de competências, fiscalização e outras, designadamente estruturais.
Sobre este e outros episódios congéneres acontecidos e mais genericamente em torno da catástrofe que se abateu sobre o centro do País, a discussão tem sido acesa.
Nas primeiras horas dos incêndios em Pedrógão Grande, Castanheira de Pêra, Figueiró dos Vinhos, Góis e Pampilhosa da Serra, o comandante operacional da Protecção Civil e o presidente da Liga dos Bombeiros Portugueses foram céleres a declarar, em definitivo, que tudo o que podia ser feito foi feito, que os meios eram os adequados e que se tratava de um fenómeno extraordinário. Além das forças disponíveis e previsibilidade, portanto.
O Presidente da República procurou com a sua presença dar também um sinal de normalidade na coordenação, funcionamento e actuação dos meios intervenientes. Ficam igualmente a pairar entre as cinzas e os destroços materiais e humanos as razões de fundo que permitem explicar, para lá do contexto e das circunstâncias, porque é que tragédias destas se repetem em Portugal. Razões estruturais para as quais o PCP tem vindo a alertar há anos e sobre as quais tem vindo a intervir e a produzir propostas que hoje se revelam assertivas.