Inventados duelos
A seis meses das eleições autárquicas, o esquema de cobertura mediática parece estar montado. Os critérios editoriais dos media já começam a alinhar-se e surge de novo, como em todas as eleições, a definição dos «duelos» que vão merecer intenso e abundante tratamento em páginas de jornais e longas horas na antena de rádios e televisões.
As direcções dos principais órgãos de comunicação social ainda não se aperceberam da realidade posta a nu após as últimas legislativas: um acto eleitoral não é uma qualquer corrida, em que o que importa é saber quem chega à frente. Apesar das diferenças entre o sistema eleitoral para a AR e para as autarquias, no Outono também vamos eleger vereadores e membros de assembleias municipais e de freguesia.
Vejamos o exemplo de Lisboa. No dia em que a CDU realizou o seu acto público, onde foi apresentado um projecto autárquico para todo o País e não uma colecção de cromos de caderneta, ignorado pela RTP no seu Telejornal, a estação pública emitiu uma peça em que resumia as eleições para a Câmara da capital a três corridas: o presidente (que ainda não é candidato), pode ou não ser eleito; à «direita», as candidaturas do CDS e do PSD supostamente iriam disputar o segundo lugar, ocultando que o primeiro dispõe de menor representação do que a CDU; depois, há a «corrida à esquerda», entre João Ferreira e o candidato do Bloco, ignorando o pequeno pormenor de arrumar no mesmo saco quem tem e não tem representação na vereação.
A redução da cobertura mediática aos «duelos» traz consigo uma segunda entorse ao que de facto está em causa, reduzindo o número de municípios que interessam para a contabilidade. Na mesma peça, as eleições para 308 municípios são reduzidas a meia dúzia: Lisboa, Porto, Coimbra, Oeiras, Sintra e Maia. Nada de novo, se atendermos que qualquer disputa interna do PSD tem tido maior atenção dos media do que a apresentação de candidaturas em concelhos de maioria CDU. Exemplos? Para não sair da Área Metropolitana de Lisboa (onde a CDU detém a maioria das presidências de Câmara), basta lembrar que tanto no Barreiro como em Loures já há candidaturas apresentadas, em iniciativas monumentalmente ignoradas.
Mas para justificar e condimentar a leitura enviesada que se pretende impor das próximas autárquicas surgem ainda os «independentes». Há dias, o Público titulava que os «independentes são quarta força autárquica». A própria peça desmentia o título: não são força autárquica, já que cada um corre por si; nem sequer são independentes, mas sim cidadãos eleitores que, na maioria dos casos, ou são ex-militantes de partidos ou correm com o apoio de partidos. E se falamos de independentes, quantos cidadãos independentes concorrem em listas da CDU?
Estes elementos contribuem para uma estratégia de redução da pluralidade que existe no poder local a simples disputas para ver quem chega à frente, em meia dúzia de concelhos escolhidos por um suposto mediatismo de um ou outro concorrente.
Mas contribuem particularmente para o apagamento das candidaturas da CDU, uma força (esta sim!) que, com trabalho, honestidade e competência, tem provas dadas na gestão autárquica de Silves a Vilar de Mouros.