A valorização da Agricultura Familiar (a pequena e média agricultura), através de medidas concretas, continua a ser uma linha de acção e um objectivo de que o PCP não abdica.
Isso mesmo ficou recentemente patente no debate de uma iniciativa legislativa sua onde preconizava um conjunto de prioridades tendentes ao estabelecimento de um Estatuto da Agricultura Familiar Portuguesa.
Em coerência com os interesses de classe que defendem - os interesses das grandes explorações, da agricultura de cariz industrial -, as bancadas do PSD e do CDS votaram contra o projecto de resolução do PCP, o que combinado com a abstenção do PS veio a impedir a sua aprovação pelo Parlamento.
Uma obstrução por parte dos partidos mais à direita que em boa verdade não causa estranheza e é coincidente com o que foi a sua acção no governo nos últimos quatro anos. Uma acção destrutiva que PSD e CDS procuraram camuflar no debate argumentando que foi o seu executivo quem «teve a coragem de atacar os problemas de frente (como o da Casa do Douro)», quem «deixou preparado o Programa 2020», ou quem «melhorou significativamente a balança comercial», como referiu António Lima Costa, do PSD.
«O que fez foi governar para o grande agro-negócio, enquanto obrigava a pequena agricultura a inscrever-se nas Finanças para vender umas couves», contrapôs o deputado comunista João Ramos, lembrando que ao defunto governo se deve, por exemplo, a Lei da eucaliptização (em favor das celuloses), a destruição da Casa do Douro (com desregulação das relações entre a produção e a comercialização) ou a retirada dos secadores de arroz de Alcácer do Sal à Associação de Agricultores de Setúbal para os entregar aos grandes proprietários da região.
Mas as consequências das opções de política agrícola neste quadriénio não se ficaram por aqui. O deputado do PCP pôs igualmente em relevo os mais de 153 mil empregos destruídos na agricultura durante este período; a acentuação da brutal desigualdade na distribuição dos apoios – 300 agricultores recebem 60 milhões de euros, o que é mais do que aquilo que recebem os 120 mil agricultores mais pequenos –; a aceitação cúmplice do fim das quotas leiteiras, asfixiando assim muitos produtores; o incremento do processo com vista ao fim dos direitos de plantação da vinha; a absoluta inércia no limitar da acção abusiva da grande distribuição, que recolhe 75% do valor produzido pelo sector agro-alimentar, ficando o agricultor apenas com dez por cento.
É neste quadro, e num contexto em que Portugal precisa de produzir mais, que ganha ainda maior acuidade e valor a mais de meia centena de propostas da autoria do PCP em defesa da Agricultura Familiar.
Sumariadas por João Ramos, tais medidas abrangem a área fiscal, a redistribuição de apoios, a garantia de preços justos à produção, a recuperação da capacidade de intervenção do Ministério da Agricultura, a valorização dos serviços públicos no Interior do País.
Propostas do PCP
Estão agrupadas em nove áreas distintas as medidas concretas preconizadas pelo PCP com vista à valorização da agricultura familiar. O direito a produzir é uma dessas áreas, nela se encontrando medidas como, por exemplo, a garantia do direito à água e a defesa do direito à utilização, aquisição troca e venda das sementes próprias. A garantia de escoamento a preços justos à produção familiar é a medida que surge logo à cabeça entre a mais de uma dúzia de propostas no capítulo da comercialização de produtos e rendimento, enquanto em matéria de financiamento à lavoura e seguros surgem medidas que vão desde a criação de uma linha de crédito agrícola de emergência com baixa taxa de juro até à criação de um seguro nacional público às explorações agropecuárias, financiado no caso da agricultura familiar pelo Estado, pela União Europeia e, em parte menor, pela lavoura.
Já no domínio da assistência técnica, ensino e formação, realce para medidas como a do reforço do papel do Ministério da Agricultura, reabrindo serviços entretanto encerrados, ou para a que advoga o lançamento de campanhas de prevenção e combate às doenças do gado, ou ainda para a que aposta no apoio técnico às organizações da lavoura, nomeadamente com o funcionamento da um serviço de extensão rural que dinamize o associativismo agrícola.
O direito ao acesso à terra é garantido, por seu lado, por medidas onde sobressai a que defende uma lei de arrendamento rural que garanta rendas economicamente justas e a estabilidade de quem cultiva a terra, sendo de destacar no domínio da fiscalidade propostas como a adequação à agricultura familiar das taxas aplicadas aos consumos energéticos e respectivo pagamento apenas nos meses de consumo, ou a que prevê que qualquer imposto sobre as pequenas e médias explorações agro-rurais tenha em conta o seu rendimento líquido.
No quadro de preocupações da bancada comunista está também a manutenção e reforço dessa entidade secular que são os Baldios, área onde se inscrevem medidas como a do apoio do Estado em termos económicos e técnicos à sua exploração, de acordo com a vontade dos compartes. No plano das obras e melhoramento rurais, registe-se a proposta que garante às juntas de freguesia os meios financeiros necessários para melhoramentos locais.
Por último, no que toca à valorização das organizações da lavoura, um sublinhado para a proposta que defende o apoio do Estado ao cooperativismo e às organizações da agricultura familiar no desempenho das suas actividades, garantindo o pagamento justo pelos serviços da sua responsabilidade.