- Nº 2195 (2015/12/23)
Fascismo abate-se sobre a Ucrânia

Kiev ilegaliza Partido Comunista

Internacional

O regime ucraniano procura afastar a única força que luta contra a transformação do país numa colónia do imperialismo, as políticas antipopulares, a revisão da história e a glorificação e reimposição do nazi-fascismo, acusa o Partido Comunista da Ucrânia (PCU).

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Em duas notas divulgadas no final da semana passada, o PCU informa que o Tribunal Administrativo Distrital de Kiev (TADK) decidiu banir o partido depois de a instância judicial de apelação ter rejeitado os recursos apresentados contra processos interpostos pelo Ministério da Justiça. Ficou, assim, aberto o caminho para que a primeira instância, embora contrariando a legislação ucraniana e as normas internacionais, acolhesse horas depois a solicitação do regime para a proibição da organização comunista.

«A primeira acção judicial contra o PCU foi ajuizada pelo Ministério da Justiça em Julho de 2014», mas «o caso falhou porque todas as chamadas “evidências” de actividade ilegal foram grosseiramente manipuladas», forçando o juiz Valery Kuzmenko a recusar o processo considerando-o «politicamente motivado». Kuzmenko também pediu escusa, iniciativa que foi seguida por outros magistrados do TADK, levando o governo neofascista a transferir o caso para outro tribunal sem jurisdição para tal, bem como a iniciar uma vaga persecutória contra os magistrados que invocaram necessidade de dispensa.

No início de 2015, o parlamento de Kiev aprovou um pacote legislativo com o objectivo de «descomunizar» a Ucrânia. O conjunto de normas entrou posteriormente em vigor pese embora violem «a actual Constituição, o direito internacional, a Declaração Universal dos Direitos Humanos, a Convenção Europeia para a Protecção dos Direitos do Homem e das Liberdades Fundamentais ou as conclusões da Comissão de Veneza [órgão consultivo do Conselho da Europa sobre questões constitucionais]», explica ainda o PCU, que sublinha, em seguida, que «por estranha coincidência e “caprichos” do sistema electrónico de distribuição de casos entre os juízes», o processo contra o PCU «foi “acidentalmente”» distribuído, de novo, ao juiz Kuzmenko.

Kuzmenko enfrentava então um processo penal devido ao pedido de escusa, foi mobilizado para a zona de conflito armado no Leste da Ucrânia e, já este ano, «proibiu dois outros partidos comunistas», detalha-se nos textos.

O regime vassalo do imperialismo insiste que o PCU tem de renunciar aos seu nome, símbolos e ideologia comunista e, nesse propósito, obstaculizou a avaliação e discussão pública sobre as chamadas leis da «descomunização» e os factos imputados ao PCU. Forçou também o TADK a tomar a decisão agora conhecida mesmo antes de sobre o pacote legislativo anticomunista se pronunciar a Comissão de Veneza, o que estava previsto para o dia 18 de Dezembro.

«Obviamente que o tribunal foi empurrado para uma decisão», tanto mais que «dificilmente o veredicto [da Comissão de Veneza] seria favorável ao governo da Ucrânia», acrescenta o PCU, para quem, «nestas circunstâncias é impossível falar de imparcialidade e objectividade» da Justiça.


Precedentes contra regime ucraniano

Insistindo na parcialidade e na violação de «direitos humanos e liberdades fundamentais, assim como de garantias processuais», o Partido Comunista da Ucrânia detalha que «todas as acções do Estado para o proibir são baseadas nas leis de «descomunização», salientando que tendo a Ucrânia «empreendido uma série de obrigações políticas e legais para com a União Europeia», avança com normas de proibição da ideologia e símbolos comunistas, incluindo aqueles do período soviético, «abolidas por todos os países avançados da UE».

O PCU recorda, em seguida, uma série de iniciativas com o mesmo objectivo que falharam nos últimos dez anos: em 2005, a Comissão Europeia vetou a pretensão de ex-repúblicas socialistas membros da UE de banirem os símbolos comunistas; em 2009, o Parlamento Europeu adoptou uma resolução de repúdio ao totalitarismo mas não menciona nada sobre a simbologia comunista; em 2010, por solicitação da Bulgária, República Checa, Hungria, Letónia, Lituânia e Roménia, a Comissão Europeia apreciou e recusou a imposição de sanções penais contra a aprovação, negação ou subestimação do «perigo comunista».

No mesmo sentido, relembra igualmente o PCU, por diversas vezes entre 2006 e 2012, o Tribunal Europeu dos Direitos Humanos considerou legais o uso de símbolos políticos, e em 2013 a Comissão de Veneza e a Organização para a Segurança e Cooperação Europeia concluíram contra a proibição do Partido Comunista da Moldávia, determinada por uma figurino legal semelhante ao agora imposto na Ucrânia.

Neste contexto, o PCU conclui que o regime visa proibir o PCU porque é o único que verdadeiramente se opõe «à transformação da Ucrânia numa colónia, à política social de “genocídio” imposta pelo FMI, ao congelamento de salários e pensões, ao aumento das tarifas [de serviços públicos e funções sociais do Estado], ao roubo e corrupção que aumentaram significativamente depois dos capangas do Departamento de Estado [dos EUA] terem chegado ao poder; e porque, «em favor da verdade histórica e contra o fascismo», rejeita que «colaboracionistas de Hitler se transformem em “heróis” e se insulte a memória dos soldados do Exército Vermelho».

 

Breviário

  

PCP condena decisão
e apela à solidariedade

Reagindo à proibição do Partido Comunista da Ucrânia, o gabinete de imprensa do PCP divulgou uma nota na qual o Partido «expressa o mais firme repúdio pela decisão do Tribunal Administrativo de Kiev» e solidariza-se «com os militantes e simpatizantes do PCU e todas as forças democráticas e antifascistas que neste País resistem ao criminoso e desastroso rumo do poder oligárquico, resultante do golpe de Estado de Fevereiro de 2014».

«A inaceitável e arbitrária decisão agora anunciada insere-se na vasta campanha em curso na Ucrânia com vista a proibir a ideologia comunista, facto que vem confirmar a deriva anti-democrática neste País. Neste sentido, constituem igualmente motivo da maior preocupação a campanha de reescrita da história, branqueamento dos crimes das forças colaboracionistas com o ocupante nazi na II Guerra Mundial e a promoção de forças paramilitares de perfil neonazi», salienta ainda o PCP.

«A complacência e conivência da União Europeia, dos EUA e da NATO para com o actual poder de Kiev e a deriva fascizante na Ucrânia constitui um facto da maior gravidade«, acusa igualmente o Partido, que, «apelando à solidariedade dos democratas perante a frontal violação e repressão dos direitos e liberdades fundamentais na Ucrânia», não deixa de manifestar «confiança de que as justas aspirações à paz e justiça, e a luta organizada em defesa dos direitos dos trabalhadores e do povo ucranianos acabarão por se impor e travar o passo à agenda das forças retrógradas que hoje desprezam a dignidade e a soberania da Ucrânia».


«Democrática» Ucrânia
no regaço da UE

No mesmo dia em que um tribunal decretava a legalidade da proibição do Partido Comunista da Ucrânia, o presidente do regime golpista de Kiev garantia, em Bruxelas, a entrada em vigor, a 1 de Janeiro, do acordo de comércio livre com a UE.

Ao lado do presidente do Conselho Europeu, Donald Tusk, e do presidente da Comissão Europeia, Jean-Claude Juncker, Petro Porchenko assegurou que o país «está pronto a pagar o preço» pela «nossa liberdade e pela nossa escolha europeia». Porochenko aludia à suspensão por parte da Rússia, igualmente com efeito a partir do primeiro dia do próximo ano, de um tratado semelhante subscrito em 2011 entre Moscovo e Kiev.

Donald Tusk, por seu lado, saudou os esforços da Ucrânia de «aproximação à Europa» e considerou que «a Ucrânia deve manter o caminho das reformas. E a Rússia deve mudar o seu caminho». Jean-Claude Junker, no espírito democrático reinante, sentenciou que o acordo entre a UE e a Ucrânia «entrará em vigor e não pode ser alterado, nem direta nem indiretamente».