O banco, os bancos, a banca
Mais ainda que o permanente e sempre estrepitoso assunto dos futebóis, da entrevista de Sócrates à TVI e da venda da TAP por um governo que em verdade já não o era, o mais escaldante tema que na passada semana passou na televisão portuguesa foi o Caso Banif, isto é, da previsível e de facto há muito prevista ruptura de mais um banco português. De facto, não é surpresa: se bem nos lembramos, embora alguma coisa tenha sido feita para que o esquecêssemos, já terá sido por causa do Banif e dos seus problemas que, há uns tempos atrás, o Estado português esteve disponível para vender a sua alma não ao diabo, que aliás por ela decerto pouco se interessa, mas ao senhor presidente vitalício da Guiné Equatorial, sujeito com a reputação de ter mau feitio e de não mandar tratar bem os seus adversários. Apesar de obviamente desagradável, o Caso Banif teria menor importância se fosse uma estreia absoluta no historial recente da banca portuguesa. Infelizmente, porém, antes do Banif aconteceu o estrondoso passamento do Banco Espírito Santo e de todo o grupo a que legitimamente dava o nome, que antes dele houve o Caso BPN e seus anexos (no qual, para nossa tristeza ainda que não para nossa inteira surpresa, até esteve um pouco envolvido quem não o devera estar), que outras instituições financeiras têm dado sinais que provocam, com razão ou sem ela, alguma inquietação nos cidadãos que lhes confiaram economias geralmente magras e de penosa consecução, pois que passou de moda o velho depósito nos colchões. Ora, como todos os sectores lembram e toda a gente sabe, a salubridade do sistema bancário de qualquer país é uma questão muito séria cuja gestão exige grandes cuidados, sabedorias e honestidades superlativas, rigorosa distância de quaisquer interesses privados. Aliás, é em consequência da importância do assunto que a televisão tem vindo a referi-lo com algum relevo, não muito, o que aliás bem se entende por assunto ser melindroso.
Uma evidente conclusão
Ora, como bem se sabe, são áreas fundamentais na vida dos povos a saúde, a educação, a justiça (com maiúsculas iniciais ou sem elas, não é por aí que alguma coisa se decide), pelo que ao Estado é cometido o dever de cuidar destes sectores de modo a que eles não caiam em mãos duvidosas, levianas ou, em hipótese menos pessimista, em gestões de competência insuficiente ou ainda abaixo disso. De onde a inelutável necessidade de manter sobre a vida financeira de um país um controlo apertado, e é sabido que quem fala em «vida financeira» fala em «banca», pois são os bancos e similares instituições os verdadeiros pulmões por onde respiram as finanças de um país, que nele fazem circular o oxigénio que permite a economia nos seus vários aspectos, a saúde financeira da vida colectiva. Ora, mete-se pelos olhos dentro, e porventura também pelas nossas algibeiras, que os casos acima referidos denunciam a insuficiência da vigilância pública sobre os negócios privados na área dos bancos: a chamada supervisão do Banco de Portugal tornou-se uma piada de péssimo gosto ou, como diria o dr. Passos Coelho, uma estória para crianças. Daqui emerge, sólida e evidente, uma conclusão: é necessário e urgente que a banca seja controlada pelo Estado. Alguns dizem temer que isso corresponda a nacionalizar alguns ou todos os bancos, o que para eles, seus iguais e seus associados, seria uma grande maçada. Parece certo, porém, que o povo teme muito mais que os interesses e as manobras da gestão privada arruínem o país. Que é de nós todos, não só de alguns conselhos de administração.
Correcção
Há poucas semanas, escreveu-se aqui que o senhor professor Cavaco fez estudos em Oxford. Foi asneira: o senhor professor frequentou, sim, York. Um leitor atento, o camarada Coutinho Duarte, economista, deu pelo erro e teve a atenção de o sinalizar, acrescentando que York tem menor prestígio universitário que Oxford. Aqui fica a rectificação e o agradecimento a Coutinho Duarte.