Federação Democrática Internacional
das Mulheres

Registos sobre a sua criação

Laura Cunha

Evocar a criação da Federação Democrática Internacional de Mulheres (FDIM) no Congresso fundador realizado em Paris, em Novembro de 1945, com 850 delegadas representando 110 milhões de mulheres de todo o mundo, é homenagear gerações de mulheres em luta pelos seus direitos, contra o fascismo e a guerra, pelo progresso social.

Neste congresso foi proclamado o direito das mulheres à participação activa na solução dos problemas no mundo do pós-guerra.

O âmbito desta luta vinha-se ampliando no espaço geográfico e no tempo. Já em 1933, com a chegada de Hitler ao poder na Alemanha, ante a ameaça do ascenso do nazi-fascismo na Europa, um grupo de mulheres progressistas, conhecedoras da ideologia reaccionária do nazi-fascismo e da sua natureza agressiva, pôs em marcha uma intensa actividade antifascista. O «Congresso de Mulheres Contra a Guerra e o Fascismo», realizado em Paris, em Agosto de 1934, insere-se nesse conjunto de iniciativas.

Mulheres contra o fascismo, pela paz
pelos direitos das mulheres e das crianças

Apesar da diversidade das suas origens e características, já há muito que milhares de mulheres, tal como diversas organizações de numerosos países, se vinham aglutinando em torno dos ideais fundadores da FDIM: a luta contra o fascismo, pela paz, pelos direitos das mulheres e das crianças.

Entre as organizações filiadas contavam-se: a União das Mulheres Francesas, o Comité das Mulheres Soviéticas, a União das Mulheres Italianas, a Federação das Mulheres Chinesas, a União das Mulheres Australianas, o Movimento das Mulheres Holandesas, a Gerwani – Organização das Mulheres Indonésias, a União das Mulheres Espanholas.

Nos EUA, a filiada americana da FDIM o Conselho das Mulheres Americanas (CAW) foi fundada em Nova Iorque, em 1946, para «reviver a luta do movimento das mulheres do século XIX e atrair mulheres radicalizadas pelas experiências do tempo de guerra no alargado movimento progressista».

A nível internacional, entre as valorosas mulheres antifascistas há um sem número de lutadoras anónimas, merecedoras do respeito das gerações vindouras. Pelo relevante papel que desempenharam na criação e desenvolvimento da FDIM, há nomes que se destacam pelo percurso das suas vidas. Citamos dois exemplos:

Marie-Claude Vaillant-Couturier, foi secretária-geral da FDIM nos primeiros 10 anos. Quando da ocupação da França pela Alemanha nazi, em 1940, trabalhou no L'Humanité, participando activamente na Resistência. Presa em Fevereiro de 1942, fez parte de uma leva de 230 mulheres francesas enviadas para Auschwitz e depois para Ravensbruck. A sua libertação só teve lugar em 30 de Abril de 1945 graças à chegada do Exército Vermelho. Foi eleita deputada comunista no Parlamento francês durante muitos anos. Fez um importante testemunho no primeiro julgamento de Nuremberg a que envolvia os principais criminosos nazis.

Eugénie Cotton, prestigiada intelectual francesa. Ajudou os antifascistas alemães refugiados em França desde 1933 e depois os espanhóis perseguidos por Franco. Em 1944 participa na fundação da União das Mulheres Francesas. Em 1945 é fundadora da FDIM, de que viria a ser Presidente. Foi vice-presidente do Conselho Mundial da Paz, onde desenvolve importante trabalho até à sua morte.

Dignas de referência são também outras realizações da FDIM: a Conferência em Defesa das Crianças, em Viena de Áustria (1952), o Congresso das Mães, em Lausana (Suíça, 1955) e a Assembleia Internacional de Mulheres, em Copenhaga (Dinamarca, 1960).

Os inimigos de classe dos objectivos da FDIM não ficaram inactivos perante a importante actividade internacional desenvolvida. Por isso a FDIM conheceu anos difíceis durante a «guerra fria» ocasião em que apoiou a União Soviética, sendo alvo de falsas acusações, designadamente por parte do chamado Comité contra Actividades Anti-americanas.

Antifascistas portuguesas e a FDIM

Os congressos da FDIM realizados a partir de 1945 contaram, muitos deles, com a participação de delegadas antifascistas portuguesas. É disso exemplo o congresso de Moscovo, em 1963, no qual estiveram presentes Margarida Tengarrinha, Maria Lamas, Georgette Ferreira, Laura Cunha, Alice Sena Lopes. No Congresso de 1953 participaram, entre outras, Maria Lamas e Maria Cecília Alves. Com a formação do MDM, em 1969, este movimento passou a integrar a FDIM com uma participação activa que se mantém até aos dias de hoje.

A luta contra o fascismo, pelas liberdades, democracia e pela paz foram indissociáveis em Portugal durante o meio século em que o País esteve sujeito a uma feroz ditadura. Pelas prisões fascistas passaram centenas de mulheres, na sua maioria comunistas: Maria Machado, Maria Lamas, Sofia Ferreira, Virgínia de Moura, Georgette Ferreira, Conceição Matos, Luísa Costa Dias, Isabel Aboim Inglez, Maria Alda Nogueira.

A censura fascista silenciava a realização destes Congressos. Só através do Avante!, órgão clandestino do Partido Comunista Português, e da Rádio Portugal Livre, estes acontecimentos chegavam ao conhecimento dos portugueses. Foi também nas páginas do Avante! (Setembro/1962) que foi divulgada a mensagem de apoio e solidariedade da FDIM aos presos políticos portugueses.

É por proposta da FDIM que a ONU, em 1972, fixa o Ano Internacional da Mulher para 1975 e se passa a assinalar, no plano oficial, o Dia Internacional da Mulher. E é ainda por proposta da FDIM que a ONU viria a instituir o Ano Internacional da Criança (1979).

70 anos após a sua criação, o papel da FDIM e da luta das mulheres de todo o mundo mantém toda a actualidade num contexto marcado pelos focos de guerra existentes e a possibilidade da generalização de uma guerra de tremendas repercussões a nível mundial, um perigo real que não pode ser subestimado.




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