Promover o crescimento económico e o emprego
Aquando da apresentação pública do Programa Eleitoral do PCP, há duas semanas, destacámos no Avante! os seus eixos e objectivos centrais e a base material necessária à concretização da política patriótica e de esquerda que ele consagra. Iniciamos hoje uma abordagem mais pormenorizada das propostas e medidas concretas que aponta, a começar pelas que se relacionam com a questão decisiva do crescimento económico e do emprego (presentes no capítulo II da segunda parte do Programa).
No que respeita a estas matérias, as propostas do PCP visam três objectivos centrais: o pleno emprego, assumido como «objectivo primeiro das políticas económicas»; o crescimento económico «sustentado e vigoroso», capaz de promover a criação líquida de postos de trabalho e de pôr fim a um «longo período de estagnação e recessão»; e o desenvolvimento da produção nacional, encarado como «motor do crescimento económico e do pleno aproveitamento das capacidades e recursos nacionais», como resposta à procura interna e como alternativa a muitas importações.
Estes grandes desígnios assentam em quatro «opções estratégicas», fundamentais para a sua concretização (ver textos nestas páginas). Uma primeira é, desde logo, a recuperação pelo Estado do comando político da economia, afirmando-se a soberania nacional e combatendo-se de forma decidida a dependência externa – questão decisiva de uma verdadeira política alternativa, «ainda mais no contexto da globalização e da integração comunitária». Uma segunda opção aponta para a concretização de uma economia mista e o planeamento democrático do desenvolvimento, enquanto que a terceira visa o desenvolvimento e defesa da produção nacional e a superação dos principais défices estruturais. A quarta prende-se com a necessária dinamização e defesa do mercado interno.
A consolidação das finanças públicas, assentes na renegociação da dívida pública; o aumento do investimento e uma banca direccionada para o desenvolvimento; o aproveitamento dos recursos energéticos e a sua eficiência; um sector de transportes e comunicações que promova a mobilidade e aposte no transporte de mercadorias; e a assumpção do ambiente, do ordenamento do território e do desenvolvimento regional como condições indispensáveis a um desenvolvimento sustentado e à coesão territorial – são «políticas-chave» do Programa Eleitoral do PCP no que respeita à questão do crescimento económico e do emprego.
1. Recuperar o comando político da economia
A recuperação pelo Estado do comando político da economia, como o PCP defende, exige a adopção de um vasto e consistente conjunto de medidas, apontadas no Programa Eleitoral. Entre elas, sobressai a renegociação da dívida nos seus prazos, juros e montantes, que na concepção do PCP deverá ser feita por iniciativa do Estado português para responder aos problemas do País – e não aos interesses dos credores. Esta renegociação pretende reduzir em 50 por cento o valor nominal da dívida e, «em conjugação com o alargamento dos prazos e a diminuição das taxas de juro», pelo menos 75 por cento dos seus encargos anuais (a não existir renegociação Portugal pagará, de 2014 a 2020, perto de sessenta mil milhões de euros só em juros).
A intervenção visando o desmantelamento da União Económica e Monetária, o estudo e preparação para a libertação do País da submissão ao euro e a eliminação e condicionamentos estratégicos através do controlo público de sectores como a banca ou a energia são outras das medidas a adoptar. Para concretizar esta primeira opção, o PCP propõe também a efectivação do princípio constitucional de subordinação do poder económico ao poder político democrático, através do combate a uma estrutura económica monopolista e do exercício e assumpção, pelo Estado, das missões e funções constitucionais na organização e funcionamento da economia e da vida social.
A afirmação da propriedade social e do papel do Estado em empresas e sectores estratégicos é outro vector desta primeira opção: a «reversão programada das privatizações» e a integração dessas empresas no sector público, por nacionalização e/ou negociação adequada ou outros instrumentos que assegurem o controlo público, são medidas fundamentais para afirmar um Sector Empresarial do Estado «forte e dinâmico».
O PCP defende ainda «outras políticas económicas e financeiras da União Europeia»: a revogação do Tratado Orçamental e da União Bancária, o fim do Programa de Estabilidade e Crescimento e a criação de um programa de apoio aos países cuja presença no euro se tenha mostrado insustentável são matérias fundamentais, a par da revisão de outras políticas comuns.
2. Economia mista e planeamento democrático
Romper com uma «economia dominada pelos monopólios, desigual e anárquica» e concretizar um «desenvolvimento equilibrado e integrado de sectores e regiões, a justa repartição social e regional do produto nacional e a coordenação da política económica com as políticas social, de saúde, educativa e cultural» é o grande propósito do PCP nesta matéria: tal opção exige, desde logo, a «coexistência dos três sectores constitucionais – público, privado, e cooperativo e social».
Assim, e a par da «presença maioritária do sector público nos sectores estratégicos», o Partido quer assegurar um «dinâmico sector cooperativo e social» e um «papel relevante» das micro, pequenas e médias empresas. O PCP defende, nomeadamente, um forte sector público – com o Estado a assumir um «papel produtivo e não meramente regulador» – e um dinâmico sector empresarial do Estado.
Importante é, também, o sector cooperativo e social, reclamando o PCP, no seu Programa Eleitoral, «mais e melhor apoio ao cooperativismo», através do apoio às estruturas representativas, na manutenção do emprego e na constituição de novas cooperativas; de uma linha de garantias do Estado para o seu financiamento; de benefícios fiscais, assegurando uma taxa de IRC inferior dez pontos percentuais relativamente ao sector privado e da promoção do auto-financiamento e reestruturação com discriminação positiva.
3. Aumentar a produção, superar défices
A valorização e expansão dos sectores produtivos, a reindustrialização do País e a consideração da agricultura, da pecuária, das florestas e das pescas como sectores estratégicos são objectivos do PCP. A sua concretização exige a dinamização dos investimentos público e privado e das acções de investigação associadas à produção, o reforço da inovação, investigação e desenvolvimento tecnológico e a reorientação do investimento directo estrangeiro.
O Partido defende um programa de reindustrialização do País, que vise o «adensamento da malha industrial e elevação do valor acrescentado», e um «plano estratégico para o sector mineiro, com mais transformação em território nacional». Eixo central deste projecto industrial é a «renovada participação do Estado na esfera produtiva», nomeadamente em sectores estratégicos capazes de dinamizar outras actividades.
O aproveitamento e valorização dos recursos endógenos, a modernização das indústrias tradicionais e a reanimação de importantes indústrias básicas – metalomecânicas e electromecânicas, metalurgias, químicas e petroquímicas de base, construção e reparação naval – são eixos da reindustrialização proposta pelo Partido. Uma maior incorporação nacional em sectores como o automóvel, o reforço das indústrias de alta tecnologia (química fina, farmacêutica, aeronáutica e aeroespacial, tecnologias da informação e comunicação, automação, novos materiais e biotecnologia) e o aproveitamento de grandes projectos públicos como âncora na dinamização dos sectores industriais são outras vertentes deste projecto.
No que respeita às micro, pequenas e médias empresas, o Partido propõe políticas públicas de discriminação positiva, pelo relevante papel que assumem na economia nacional e na criação de emprego. O PCP defende prioridade no acesso aos fundos do «Portugal 2020», uma carga fiscal conforme os seus rendimentos e condições estruturais, a redução das despesas com taxas, energia, crédito bancário e arrendamento.
Agricultura, floresta e pescas
Para a agricultura, o Partido apresenta a proposta de, nas actuais condições, concretizar uma reforma agrária nos campos do Sul, que liquide a propriedade latifundiária. Condicionar por lei o acesso à terra pelo capital estrangeiro, travar a exploração intensiva e a especulação imobiliária «turística», aproveitar as potencialidades agrícolas do Alqueva e de outros regadios e obras agrícolas são também propostas incluídas no Programa Eleitoral do Partido. Nele defende-se ainda o direito dos compartes aos seus baldios, a salvaguarda da propriedade dos pequenos e médios agricultores, e a melhoria do seu rendimento na cadeia de valor, e o apoio ao associativismo agrícola.
Quanto à política florestal, assente no respeito pelas diferentes realidades sociais, nomeadamente da pequena propriedade e da propriedade comunitária, o PCP defende a revogação da lei da arborização e rearborização, a preservação da diversidade das espécies autóctones e a protecção de habitats ameaçados, em especial nas dunas, a par de uma efectiva protecção contra incêndios, o fomento do associativismo dos produtores e a valorização das fileiras florestais em toda a cadeia de valor.
Já nas pescas, pretende garantir os «direitos históricos da pesca, na utilização do espaço marítimo nacional», a par de uma «gestão de proximidade dos recursos, respeitando o seu acesso colectivo». A modernização e renovação da frota, a adopção de um programa específico de apoio à pequena pesca, a melhoria dos portos e infra-estruturas, a instituição legal de uma «margem mínima na segunda venda», o reforço das condições de segurança a bordo e combustíveis a custo bonificado são outras das medidas propostas.
No turismo, o PCP considera essencial «combater a sua marcada sazonalidade, salvaguardar o património natural e cultural e elevar as condições de acesso da população. A competitividade e viabilidade das empresas deve ser assegurada «sem recurso a baixos salários e trabalho precário».
4. Defender e dinamizar o mercado interno
Para dinamizar e defender o mercado interno o PCP aponta como questões essenciais uma «melhor distribuição do rendimento nacional» e uma «despesa pública criteriosa, direccionada e transparente». A par disto, o Partido defende o desenvolvimento de relações económicas externas «vantajosas e diversificadas», no quadro da cooperação com todos os povos do mundo.
A concretização deste vector exige o crescimento do rendimento disponível das famílias, nomeadamente através do aumento dos salários e pensões, travando-se e corrigindo-se, dessa forma, um consumo «desequilibrado» centrado no crédito bancário. Impõe, também, o fortalecimento do investimento público da administração central, das regiões autónomas e das autarquias», atingindo no imediato o limiar de cinco por cento do PIB.
Considerando indispensável «repor um forte investimento, público e privado» no sector da construção civil, o Partido defende a sua reorientação estratégica para a reabilitação urbana e a sua interligação com a necessária reindustrialização do País. Quanto às obras públicas, o Programa Eleitoral propõe a ruptura com o modelo das Parcerias Público-Privadas, o rearranque das obras das infra-estruturas rodoviárias e ferroviárias paralisadas, a beneficiação e renovação de estradas, a reabilitação e modernização de linhas de caminho-de-ferro e uma atenção aos portos e orla costeira.
No que respeita às grandes infra-estruturas, urge garantir a sua natureza e gestão públicas e a incorporação de produção nacional na sua construção e manutenção. A introdução da Alta Velocidade Ferroviária, o novo Aeroporto de Lisboa em Alcochete e a Terceira Travessia do Tejo, rodo-ferroviária, entre Chelas e Barreiro são exemplos desses projectos.
Esta opção exige ainda, na concepção do PCP, a dinamização e apoio da actividade das micro, pequenas e médias empresas, assegurando uma «eficaz regulação da concorrência» e «combatendo os abusos de posição dominante e de dependência económica». Uma quarta questão relaciona-se com a defesa do mercado interno, para o que é indispensável um outro nível de fiscalização das importações, o estabelecimento de mecanismos que privilegiem o consumo da produção interna e travem a importação de bens de consumo, alimentares e duradouros. O combate ao dumping e às políticas de liberalização do comércio são igualmente fundamentais.