Milhares manifestaram-se
contra alienação da EGF pública

Privatização ao lixo!

No dia 6, em Lisboa, trabalhadores, utentes e autarcas exigiram que a privatização da Empresa Geral do Fomento seja deitada ao lixo e reafirmaram que vão continuar a lutar por isso. O aviso foi dirigido ao Governo e à sua maioria, mas também aos grupos económicos que querem ficar com riquíssimo património, lucros milionários e poder de decisão numa área estratégica para o País.

Nenhuma razão de interesse público justifica a privatização

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A ideia de que a privatização da EGF teria consequências desastrosas para o País e a economia nacional, para os cerca de dois mil trabalhadores das empresas do grupo, para as populações e para os municípios destaca-se na resolução que saiu da manifestação e que retoma o conteúdo do manifesto que foi divulgado pelos seus promotores, a 15 de Maio.
O alerta foi compreendido e mobilizou na manhã da passada sexta-feira alguns milhares de pessoas, entre as quais se fizeram notar trabalhadores da limpeza e higiene, de vários municípios, que compareceram em farda de serviço. Ali estiveram também vários eleitos em órgãos de municípios e freguesias. Uma dezena de camiões de recolha de lixo desfilou na cauda da manifestação, deixando uma expressiva imagem da dimensão e da importância deste sector.
Do Largo do Rato até junto da Assembleia da República, a descer a Rua de São Bento, as faixas e as palavras de ordem dos manifestantes classificavam a privatização como roubo e afirmavam a defesa dos serviços públicos. Pelas razões que motivaram esta jornada e por motivos mais alargados, foi muito frequente a exigência de demissão do Governo, como passo indispensável para que o interesse de todos deixe de ficar submetido ao lucro máximo de uns poucos.
Margarida Botelho, da Comissão Política do Comité Central do PCP, reafirmou na manifestação a solidariedade e o empenho do Partido neste combate.

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Argumentos
para lutar

No palco móvel, instalado junto à escadaria do Parlamento, os motivos da luta foram expostos com mais detalhe em intervenções de representantes das entidades promotoras deste movimento.
Alcides Galveia, trabalhador da Valnor, e Lucílio Cruz, da Valorlis, ambos do Sindicato Nacional dos Trabalhadores da Administração Local (STAL/CGTP-IN), acentuaram os perigos da privatização para a situação laboral e social nas empresas. Ela viria acrescentar ainda mais dificuldades na negociação colectiva por melhores salários e melhores condições e traria mais discriminação. O desrespeito dos direitos, o abuso de contratação de trabalhadores «temporários» (alguns há mais de dez anos e remunerados pelo salário mínimo), a desvalorização do valor do trabalho, levados a cabo há anos por administrações que são da confiança do Governo, vão ao encontro do interesse de empresários sem escrúpulos e do patronato explorador que se perfila na corrida à privatização da EGF.
Estes objectivos são contrariados pela luta dos trabalhadores, como sucedeu na Valorlis, com a greve de dois dias realizada em Dezembro.
De lutas travadas contra a privatização do sector e da Valorsul falou Mário Matos, trabalhador daquela que é a principal empresa, entre as onze onde a EGF tem participação maioritária. Dirigente do SITE CSRA (sindicato da Fiequimetal/CGTP-IN), preveniu que a privatização ameaça a contratação colectiva (Acordo de Empresa), duramente conquistada e defendida até contra cargas policiais, como em 2007.
Vítor Reis, do Sindicato dos Trabalhadores do Município de Lisboa, assinalou que é também em defesa do serviço público municipal que os trabalhadores da CML estão em luta esta semana (e em greve hoje).
José Lourenço, trabalhador da Amarsul e dirigente do SITE Sul, lembrou que, nesta área essencial para a sustentabilidade ambiental do País, foi feito um investimento de largos milhões de euros, ao longo de vinte anos, com dinheiro saído dos impostos cobrados às populações, que não pode ser agora entregue ao capital privado.
Em nome do Movimento de Utentes dos Serviços Públicos (MUSP), Cecília Sales recordou que, como já se comprovou noutros casos, as privatizações trazem consequências desastrosas, liquidam postos de trabalho, agravam a desigualdade na distribuição da riqueza, atacam os direitos dos trabalhadores, degradam o serviço e aumentam os preços. No que toca à EGF, não há qualquer razão de interesse público que justifique a iniciativa do Governo PSD/CDS, o qual age em defesa do interesse de grandes grupos económicos multinacionais.
A Associação de Municípios da Região de Setúbal também integrou o grupo inicial de organizadores desta acção, ao qual aderiram os municípios de Alenquer, Lisboa e Loures. Do palco foi ainda assinalada a presença solidária de deputados do BE, do PEV e do PCP.

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Um crime do «resíduo»

Bernardino Soares, que falou como presidente da Câmara Municipal de Loures, mas também em nome dos municípios que integram a Valorsul e têm tomado posição contra a privatização, considerou que esta é uma luta justa e por objectivos que é possível alcançar.
A privatização da EGF, acusou o eleito comunista, é um crime económico, porque põe nas mãos dos privados recursos que são do povo e são do sector público; é um crime social e laboral, porque vai afectar os direitos dos trabalhadores e vai nivelar por baixo os direitos nas empresas do grupo; é um crime ambiental, porque com os privados não serão garantidos os níveis de segurança e qualidade que hoje existem; e é um crime também contra os municípios, que são parte originária e fundamental destas empresas e não podem ser postos de parte.
Notando que nem sequer aqueles que foram eleitos pelos partidos do Governo para as autarquias locais estão a favor desta privatização, lembrou que o Executivo tem contra si os municípios, os trabalhadores, as populações, as organizações de defesa do ambiente. Derrotado duas vezes nos últimos dias, «é um Governo moribundo e, do ponto de vista deste sector, é um resíduo que tem que ser eliminado o mais rapidamente possível».

Retirem as propostas

«Vamos combater esta privatização por todos os meios possíveis, na comunicação social, nos tribunais, na rua», assegurou Augusto Pólvora, que interveio como presidente da Assembleia Intermunicipal da Associação de Municípios da Região de Setúbal. Às empresas que formalizaram o interesse na aquisição da EGF, o também presidente da CM de Sesimbra apelou a que «arrepiem caminho e retirem essas propostas», pois «não vão conseguir levar a sua avante, vamos travar este processo e vamos manter a EGF como empresa pública ao serviço das populações».
O eleito do PCP lembrou que, nos anos 1990, os municípios aceitaram integrar os sistemas multimunicipais de tratamento de resíduos sólidos sob duas condições fundamentais: as empresas deveriam manter-se com capital público, na totalidade ou em maioria, e deveriam ter acesso a fundos comunitários para ajudar à construção dos sistemas. Exige-se agora que o Governo respeite os compromissos assumidos e que constam nos contratos dos accionistas.
Para realçar o aviso quanto às consequências da privatização, apontou o que tem acontecido em países onde ela já avançou e foi seguida de agravamento dos tarifários, redução da qualidade e até abertura de espaço ao crime organizado.
Os 19 municípios accionistas e servidos pela Valorsul avisaram igualmente os interessados na compra da EGF, numa carta divulgada dia 6, de que vão continuar a opor-se à decisão de privatização, considerando que esta é hostil e coloca em causa a relação exclusiva que foi assumida com aquela empresa, como clientes e fornecedores de matéria-prima.
Outro alerta de relevo é feito na petição que a CM Almada está a promover contra a privatização da EGF. Com os novos estatutos da Entidade Reguladora dos Serviços de Águas e Resíduos, que o Governo fez aprovar, a competência de fixar as tarifas de tratamento de resíduos sólidos urbanos passará para a ERSAR, deixando de pertencer aos municípios, como sucede desde a instituição do Poder Local democrático.

Que oferece o Governo?

A EGF tem sido desde 1993 um instrumento do Estado para, no quadro da «empresarialização» dos «serviços colectivos ambientais» e a par da IPE Águas de Portugal (criada pouco antes e que viria a dar origem ao Grupo AdP) concentrar a gestão das participações públicas nos sistemas multimunicipais de recolha, tratamento e valorização de resíduos sólidos.
No universo Águas de Portugal, a EGF é a empresa de topo de um grupo rentável, que movimenta anualmente 170 milhões de euros e contabiliza 62 milhões de euros de lucros acumulados nos últimos três anos. Por via das 11 empresas em que é accionista maioritária (com 51 por cento ou mais), a EGF domina quase dois terços do sector. Possui um património avaliado em cerca de mil milhões de euros, usa tecnologia avançada e conta com trabalhadores qualificados. Investiu 45 milhões de euros só em 2012.
Na constituição das empresas entraram, como accionistas minoritários, 174 municípios com 6,5 milhões de habitantes.

Ao privatizar a EGF, impedindo os municípios de adquirirem qualquer parcela do capital desta das empresas multimunicipais, o Governo entrega a grupos privados o controlo de todo o sistema.
No dia 5, o ministro do Ambiente anunciou que todos os sete concorrentes que apresentaram propostas não vinculativas passaram esta fase. Os candidatos a donos da EGF são quatro agrupamentos (Beijing Capital Group e Capital Environment Holdings; EGEO e Antin Infrastructure Partners; Odebrecht Ambiental e Solví Investments; Suma, Mota-Engil e Urbaser) e três empresas (DST, Fomento de Construcciones y Contratas, e Indaver).

 



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