As propostas do Governo para mexer na legislação laboral visam destruir a contratação colectiva e sobre elas não pode haver negociação séria, afirma a CGTP-IN, que apela à mobilização dos trabalhadores.
«Não pode haver qualquer negociação séria, quando o Governo tenta pura e simplesmente destruir um dos instrumentos mais importantes para o equilíbrio das relações de trabalho, numa lógica de substituir a contratação colectiva pela relação individual de trabalho», declarou Arménio Carlos, em conferência de imprensa, ao fim da tarde de segunda-feira. Para o Secretário-geral da CGTP-IN, as propostas divulgadas pelo Governo na quinta-feira da semana passada, dia 8, «remetem para um recuo de mais de um século nas relações do trabalho», uma vez que «assentam numa lógica que está subjacente à tese da escravidão: os trabalhadores como elementos da produção, para servir os interesses dos patrões, e não como elementos que fazem do trabalho um instrumento de valorização pessoal, de desenvolvimento da sociedade e de progresso social».
Após a reunião da Comissão Executiva, o dirigente explicou aos jornalistas que estas propostas «são para rejeitar e combater», porque «visam, no essencial, a caducidade das convenções colectivas de trabalho, a redução dos direitos e da retribuição dos trabalhadores, a acentuação da exploração e do empobrecimento».
Arménio Carlos citou alguns governantes e dirigentes patronais, que não há muito tempo admitiam que a reforma da legislação laboral já estava feita. Numa entrevista publicada a 21 de Abril, o presidente da CIP, António Saraiva, reconhecia que a legislação laboral «não é factor constrangedor da actividade económica».
Sobre cortes salariais, dizia o vice-primeiro-ministro, Paulo Portas, a 22 de Fevereiro, que «o sector privado já fez o ajustamento salarial», enquanto o actual ministro da Economia, Pires de Lima, em Novembro também defendia que «não é preciso reduzir salários no sector privado». «Era verdade absoluta e tornou-se agora uma mentira grosseira», criticou Arménio Carlos.
Por outro lado, o ministro do Emprego, Mota Soares, tem dito que é preciso dinamizar a contratação colectiva, mas o que está a apresentar é uma proposta de liquidação da contratação colectiva.
Para a CGTP-IN, está em marcha um atentado contra o Direito do Trabalho, que teve sempre como perspectiva dar maior protecção à parte mais fraca na relação laboral, e também contra a contratação colectiva, como instrumento de harmonização social no progresso.
Lembrando que esta ofensiva não é nova, Arménio Carlos saudou a resistência dos trabalhadores, que desde o Código do Trabalho de 2003 «têm conseguido obstar a que a contratação colectiva seja destruída».
Abordando as revisões da legislação laboral realizadas desde então, o Secretário-geral da Inter considerou que haveria interesse em fazer uma avaliação do acordo firmado há dois anos pelas associações patronais, o Governo e a UGT. A pretexto de competitividade, crescimento e emprego, «esse acordo já abria as portas a medidas como as que agora são apresentadas pelo Governo».
Responder ao golpe
Os três projectos de propostas de lei, que anteontem foram abordados na Concertação Social, representam «um autêntico golpe de Estado institucional, contra a contratação colectiva, a harmonização social no progresso e os direitos laborais e sociais dos trabalhadores». A CGTP-IN nota que este pacote legislativo acresce às graves medidas e orientações inscritas na «estratégia orçamental (DEO) e na «reforma do Estado».
Da Comissão Executiva saiu «um apelo muito forte aos trabalhadores: “Levantai-vos, levantai a vossa luta contra estas propostas!”». O apelo estende-se à população, em geral, e concretiza-se em três momentos:
- uma participação activa na semana de luta que a Inter vai promover, de 26 a 31 de Maio, pela exigência do aumento imediato do salário mínimo nacional e dos salários;
- mobilização para as manifestações que vão ter lugar a 14 e 21 de Junho, no Porto e em Lisboa;
- e para que, a 25 de Maio, nas eleições para o Parlamento Europeu, o voto seja usado «no sentido de romper com a política de direita e reforçar as posições daqueles que estão com os trabalhadores hoje, sempre estiveram e continuam a assumir as suas responsabilidades, nesta aliança que para nós é fundamental que permaneça e perdure».
Arménio Carlos informou ainda que a central vai solicitar audiências aos partidos com representação parlamentar que assumem oposição ao Governo, para que publicamente rejeitem estas propostas, para que apoiem a reivindicação do salário mínimo de 515 euros a 1 de Junho, para que se pronunciem contra a «reforma do Estado» que está em desenvolvimento, e para discutir e assumir a promoção de uma política para criação de emprego de qualidade, em vez da generalização da precariedade. Vai suscitar reuniões com outras organizações e movimentos da sociedade.
Vai estilhaçar-se
Quando o Governo propõe reduzir os prazos da caducidade e da sobrevigência dos contratos colectivos, está a atacar a retribuição do trabalho e os direitos dos trabalhadores e está a atacar os sindicatos, pois pretende colocá-los numa posição de reféns, perante a chantagem patronal, em vez de serem parceiros, em condições iguais, para negociar a salvaguarda dos direitos dos trabalhadores e a sua melhoria.
A suspensão da contratação colectiva, ao nível de empresa e em situações de crise de mercado, é «uma inconstitucionalidade monumental». Além do mais, lembrou a Inter, as empresas já têm ao seu dispor o mecanismo legal do lay-off, para responderem a dificuldades económicas, e até são financiadas pela Segurança Social, no pressuposto de evitar despedimentos.
Arménio Carlos questionou «como é que este Governo tem a ousadia de propor o prolongamento da redução do pagamento do trabalho extraordinário». Notando que o mesmo Governo diz que «a economia está a evoluir», apontou o objectivo da proposta: «a exploração é para continuar». O ministro Mota Soares diz que é preciso criar mais emprego e combater o desemprego, mas esta proposta teria o efeito oposto, permitindo o aumento da exploração dos trabalhadores e do desequilíbrio nas relações de trabalho.
Para a Inter, «esta é também uma matéria inconstitucional, tem pés de barro e mais cedo do que tarde vai estilhaçar-se».
Ao contrário do que está nas propostas do Governo, o poder de representação dos trabalhadores para negociação de contratação colectiva não está atribuído a estruturas de empresa (como as comissões sindicais ou intersindicais), mas sim aos sindicatos.
A central considera ainda inaceitável a promoção da discriminação e da divisão, criando situações em que haveria «trabalhadores de segunda». O protesto foi deixado a propósito da ideia de, numa eventual caducidade de qualquer convenção colectiva, assegurar aos actuais trabalhadores os direitos nela consagrados, excluindo os trabalhadores futuros.