- Nº 2081 (2013/10/17)
Pensões de sobrevivência

Mais um golpe do Governo

Nacional

Dizem alguns que uma fuga de informação levou a que o País tenha manifestado indignação perante a perspectiva de cortes nas pensões de sobrevivência tendo por base falsas premissas.

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Apressou-se o ministro Mota Soares a afirmar, em curtas declarações: «O Orçamento de 2014 vai propor alterações às pensões de sobrevivência sobretudo para os escalões mais elevados».

Acrescentando ainda: «Uma pessoa que receba hoje uma pensão de 5000 euros pode somar a essa pensão o valor de uma pensão de sobrevivência, sem qualquer limite e sem qualquer condição de recurso»1.

Seguiram-se as declarações de Paulo Portas, dirigente máximo do CDS-PP e actual vice-primeiro-ministro, que procurou explicar que não havia razão para alarmismos, porque afinal as alterações à pensão de sobrevivência deixarão de fora 96,5% dos que recebem esta pensão. Apenas 3,5% dos pensionistas, e aqueles que acumulam reformas com pensões de sobrevivência, ou seja os que recebem acima de 2000 euros verão esta prestação ser reduzida.2

Cortina de fumo

Podem os pensionistas de sobrevivência ficar descansados? Não. Não podem, porque tais declarações visam lançar uma cortina de fumo e de demagogia e ocultar que:

1.º – A pensão de sobrevivência é paga aos familiares do trabalhador falecido, beneficiário da Segurança Social ou da Caixa Geral de Aposentações, para compensar a família (em especial as viúvas(os) e filhos) pela perda de rendimentos em resultado do falecimento do trabalhador/reformado. Os trabalhadores pagam contribuições e quotizações (os descontos) em função do seu salário tendo como contrapartida a reciprocidade entre a obrigação de contribuir e o direito às prestações sociais. Nas contribuições dos trabalhadores há uma percentagem da Taxa Social Única (TSU) que é destinada ao financiamento da pensão de sobrevivência, uma das modalidades de protecção social na eventualidade de morte.

2.º – Não há qualquer critério de justiça social na decisão de sujeitar esta prestação social à condição de recurso. Pelo contrário. É dado o passo para abrir o precedente de desvinculação da relação existente entre os descontos e o valor da pensão a atribuir. Não é justo que se estabeleça como critério os rendimentos resultantes da «acumulação» da pensão de sobrevivência (que é um direito derivado) com a reforma que resulta da vida contributiva do viúvo ou da viúva. O Governo abre assim o precedente para, no futuro, prosseguir a adopção de critérios discricionários visando desvinculá-la da sua relação com os descontos do trabalhador/ reformado falecido.

Com estas alterações nenhuma pensão de sobrevivência ficará imune a uma nova escalada de cortes, tendo em vista a redução das despesas do Estado. Atente-se que todas as prestações sociais que estão sujeitas a condição de recurso – abono de família, complemento solidário para idosos, rendimento social de inserção – que integram o regime não contributivo da Segurança Social e estão dependentes do Orçamento do Estado têm sido sujeitas a profundas alterações nos seus critérios de atribuição, visando a redução das despesas do Estado à custa da exclusão de acesso de milhares de famílias que delas precisam e da redução do valor dos que delas continuam a beneficiar.

3.º Os ministros Mota Soares e Paulo Portas esqueceram-se de dizer que na proposta de lei 171/XII/2.º para discussão na Assembleia da República se prevê um corte de 10% a «aplicar às pensões de sobrevivência – prestações de natureza contributiva atribuídas aos herdeiros dos aposentados e reformados da Caixa, independentemente da situação económica de quem as recebe, que correspondem, em regra, a metade do valor mensal da pensão do falecido...3 Uma medida que se insere na falsamente designada convergência entre o regime de protecção social do sector público e privado.

4.º – As alterações à pensão de sobrevivência acrescem às que já foram adoptadas e que reduziram na prática outros importantes apoios sociais por morte. Trata-se, afinal, de desfigurar as formas de financiamento e os objectivos destas prestações sociais por morte num ataque aos direitos, que se prolongam para além da vida do trabalhador/reformado.

Exercício de hipocrisia

A cada golpe que é desferido no valor das reformas e pensões, o CDS-PP e o Governo apressam-se, sempre, a afirmar que estão na primeira linha de defesa dos que mais precisam e que estão defendidas as reformas mais baixas. Trata-se de um exercício de enorme hipocrisia que visa esconder designadamente:

Por detrás da cortina de fumo e de demagogia, o actual Governo esconde que os sacrifícios que estão a ser impostos servem exclusivamente para beneficiar, ainda mais, os responsáveis por esta crise, como atesta a transferência, só em 2013, de oito mil milhões de euros de juros para os bancos nacionais e estrangeiros.

O verdadeiro objectivo é a destruição do Sistema Público de Segurança Social, universal e solidário, tendo como finalidade a desvinculação do patronato para com o financiamento da Segurança Social; a perda de receitas para o sistema público resultante do aumento da exploração dos trabalhadores; a redução dos valores dos seus salários; o aumento da idade de reforma; redução dos direitos de protecção social dos trabalhadores ao longo do seu ciclo de vida; e a institucionalização de baixas pensões para todos. Estes são os verdadeiros objectivos dos subscritores do Memoradum da troika – o PS, o PSD e o CDS-PP.

Contra eles continuaremos a lutar!

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1 6 de Outubro de 2013, Site do Governo de Portugal.

2 Página 36, proposta de Lei n.º 171/XII/2.ª de 12/9/2013

3 Proposta de Lei n.º 171/XII/2.ª de 12/9/2013

Fernanda Mateus