Festa do Avante! evoca 75 anos de Guernica no espaço das Artes Plásticas

A arte contra a guerra

Guer­nica, a obra-prima de Pablo Pi­casso, será evo­cada no es­paço das Artes Plás­ticas da Festa do Avante!, no ano em que se as­si­nala o seu 75.º ani­ver­sário. A sua his­tória, os es­tudos pre­pa­ra­tó­rios e a bar­ba­ri­dade que ele re­trata es­tarão em des­taque no co­ração da Festa.

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26 de Abril de 1937: sobre a pe­quena ci­dade basca de Guer­nica cai uma chuva de bombas, lan­çadas pela Le­gião Condor, cons­ti­tuída es­sen­ci­al­mente por forças alemãs. A ci­dade fica ar­ra­sada, per­ma­ne­cendo de pé apenas um velho car­valho, que se tor­naria um sím­bolo da re­sis­tência à guerra e à bar­bárie. Guer­nica foi o pri­meiro bom­bar­de­a­mento aéreo sobre civis da his­tória e não tinha qual­quer ob­jec­tivo mi­litar. Foi um teste, um sim­ples e bár­baro teste, à má­quina mi­litar nazi e à re­acção da po­pu­lação pe­rante ta­manha e in­dis­cri­mi­nada vi­o­lência.

Es­tava-se em plena guerra civil es­pa­nhola e os fran­quistas avan­çavam sobre a jovem Re­pú­blica su­por­tados pela Ale­manha nazi e pela Itália fas­cista, pe­rante a pas­si­vi­dade das «de­mo­cra­cias li­be­rais» fran­cesa e bri­tâ­nica. Ao lado dos re­pu­bli­canos, apenas com­ba­tiam so­vié­ticos e mi­lhares de vo­lun­tá­rios in­ter­na­ci­o­nais.

Eis como uma tes­te­munha viveu o mas­sacre de Guer­nica (ci­tado em Wil­fried Wi­e­gand, Pablo Pi­casso, 1973): «Es­tava um dia ma­ra­vi­lho­sa­mente claro, o céu es­tava calmo e lím­pido. Che­gámos aos su­búr­bios de Guer­nica por volta das cinco horas. Havia muita agi­tação nas ruas porque era dia de feira. De re­pente, ou­vimos as si­renes e fi­cámos ater­ro­ri­zados. As pes­soas cor­riam em todas as di­rec­ções e dei­xavam tudo em busca de pro­tecção, al­guns também cor­riam para as mon­ta­nhas. Pouco de­pois, surgiu um avião ini­migo sobre Guer­nica (…) Largou três bombas di­rec­ta­mente sobre o centro. Logo a se­guir, vi sete aviões, aos quais se se­guiram seis e, de­pois, mais cinco. Eram todos Jun­kers. En­tre­tanto, toda a ci­dade tinha sido to­mada pelo pâ­nico (…) Os aviões apro­xi­maram-se vo­ando muito baixo, no má­ximo a 200 me­tros de al­tura (…) En­tre­tanto, mu­lheres e cri­anças e ve­lhos atin­gidos caíam no chão, como moscas, víamos grandes poças de sangue por todo o lado. Vi um velho cam­ponês so­zinho num campo, morto por uma ra­jada de me­tra­lha­dora. Os de­zoito aviões man­ti­veram-se mais de uma hora sobre Guer­nica, a uma al­tura de poucas cen­tenas de me­tros, lar­gando bomba atrás de bomba. Não é pos­sível ima­ginar o ba­rulho das ex­plo­sões e o ruído das casas a des­mo­ro­narem-se. Vo­avam por cima das ruas. Caíram muitas bombas, apa­ren­te­mente por todo o lado. Mais tarde, vimos as cra­teras: ti­nham um di­â­metro de de­zas­seis me­tros e uma pro­fun­di­dade de oito. Por volta das sete horas, os aviões afas­taram-se para longe e, agora, che­gava uma nova vaga que, desta vez, voava a grande al­ti­tude. A se­gunda vaga largou bombas in­cen­diá­rias sobre a nossa ci­dade mar­ti­ri­zada. O se­gundo bom­bar­de­a­mento durou trinta e cinco mi­nutos mas foi o su­fi­ci­ente para trans­formar o lugar numa enorme for­nalha.»

 

Oito dias que ficam para a his­tória

 

Quando Guer­nica foi ar­ra­sada pela avi­ação alemã, Pi­casso en­con­trava-se a tra­ba­lhar numa en­co­menda para o pa­vi­lhão da Re­pú­blica es­pa­nhola na Ex­po­sição Mun­dial de Paris, em­bora per­ma­ne­cesse num di­lema quanto à te­má­tica a abordar. Ao tomar co­nhe­ci­mento do mas­sacre, o pintor es­pa­nhol de­cide-se e lança-se ao tra­balho, que con­clui em pouco mais de uma se­mana.

Ma­nuel Au­gusto Araújo, do grupo de tra­balho das artes plás­ticas da Festa do Avante!, sa­li­enta a in­crível energia de­mons­trada por Pablo Pi­casso du­rante os es­cassos oito dias em que pinta Guer­nica. Nesse pe­ríodo, faz mais de se­tenta es­tudos em torno da obra, entre gra­vuras, pin­turas e de­se­nhos, e al­tera o quadro di­versas vezes. Ani­mais, pes­soas e ob­jectos mudam de po­sição re­la­tiva na pin­tura, mo­di­fi­cando-se também a sua im­por­tância na tela. As fo­to­gra­fias de Dora Maar, que acom­pa­nham o dia-a-dia da con­cepção de Guer­nica, re­velam todas estas al­te­ra­ções.

Como re­velou Ma­nuel Au­gusto Araújo, todos estes ele­mentos es­tarão pre­sentes na ex­po­sição da Festa do Avante!: o quadro em si, numa re­pro­dução com mais de seis me­tros de com­pri­mento (ou seja, muito pró­ximo da di­mensão ori­ginal: 350x782); al­guns dos es­tudos pré­vios re­a­li­zados por Pi­casso, em re­pro­du­ções de­ta­lhadas que chamam a atenção para a evo­lução da obra; e as fo­to­gra­fias de Dora Maar.

A ex­po­sição fica com­pleta com a evo­cação de dois po­emas de­di­cados a Guer­nica: Des­crição da Guerra em Guer­nica por Pablo Pi­casso, de Carlos de Oli­veira, di­vi­dido em 10 partes re­la­tivas a ou­tros tantos seg­mentos do quadro, apre­sen­tados junto ao ex­certo cor­res­pon­dente do poema; e Guer­nica, de Eu­génio de An­drade, que evoca o grande car­valho que so­bre­viveu aos bom­bar­de­a­mentos. Ha­verá ainda um fo­lheto ex­pli­ca­tivo da obra de Pi­casso e do acon­te­ci­mento que ins­pirou aquele que é por­ven­tura o seu mais cé­lebre quadro e vá­rios ob­jectos de banca evo­ca­tivos da obra-prima do pintor es­pa­nhol.

Para Ma­nuel Au­gusto Araújo não é apenas o quadro de Pi­casso que será evo­cado. É também um «dever de me­mória» dos co­mu­nistas não deixar es­quecer o cri­mi­noso bom­bar­de­a­mento na­zi­fas­cista de Guer­nica, he­di­ondo teste para o que se se­guiria: a car­ni­fi­cina da Se­gunda Guerra Mun­dial, que ceifou a vida a quase 60 mi­lhões de pes­soas.

 

Ar­tista ge­nial e com­ba­tente pela paz

 

Guer­nica é, sem dú­vida, a obra-prima de Pablo Pi­casso e um dos mais re­co­nhe­cidos qua­dros de todos os tempos. Mas o pintor es­pa­nhol foi um pro­fícuo cri­ador e um de­di­cado mi­li­tante do Par­tido Co­mu­nista Francês (país onde se exilou) e do mo­vi­mento da paz criado nos pri­meiros anos da Guerra Fria com o ob­jec­tivo de mo­bi­lizar os povos contra o ad­vento de uma nova e ainda mais des­trui­dora guerra.

No âm­bito deste mo­vi­mento, par­ti­cipa em 1948, no Con­gresso Mun­dial dos In­te­lec­tuais pela Paz e, em Abril do ano se­guinte, é uma das suas cé­le­bres pombas da paz a ilus­trar o pri­meiro Con­gresso Mun­dial dos Par­ti­dá­rios da Paz, re­a­li­zado si­mul­ta­ne­a­mente em Paris e em Praga. Em torno deste tema, faz mais de cem de­se­nhos. Em 1950, vai a Var­sóvia, ao se­gundo Con­gresso Mun­dial da Paz, onde é eleito para o Con­selho Mun­dial da Paz aí criado.

Du­rante a guerra da Co­reia (1950-1953), Pablo Pi­casso mostra uma vez todo seu re­púdio pela vi­o­lência e pela guerra, neste caso pela agressão ao país asiá­tico pelos Es­tados Unidos da Amé­rica e seus ali­ados e pelos hor­rores co­me­tidos contra civis, mu­lheres e cri­anças no seu quadro Mas­sacre na Co­reia



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