A consumação de um roubo
Os últimos dias do mês de Dezembro confirmaram aquilo que a política de submissão aos interesses do grande capital por parte do Governo PS já deixava adivinhar – o acordo para o aumento do Salário Mínimo Nacional (SMN) para 500 euros em 2011 (e que envolve o objectivo de 600 euros em 2013) foi rompido, roubando assim 15 euros no valor do salário de mais de 557 mil trabalhadores abrangidos pelo SMN.
As remunerações representam apenas 26,1% dos custos de produção
Foi o rasgar de mais um compromisso pelo actual Governo, anunciado antecipadamente pelas confederações patronais e que mereceu o apoio da UGT, estrutura que uma vez mais revelou o seu histórico papel na cada vez mais aguda luta de classes que se trava no nosso País. Uma actualização do salário mínimo que em termos nominais é a mais baixa dos últimos 28 anos, situando-se em pouco mais de 30 cêntimos por dia.
Foi um roubo que é inseparável de uma política mais geral de diminuição do valor dos salários, onde os cortes nas remunerações dos trabalhadores da administração pública e os sistemáticos apelos do Governo para a contenção salarial no sector privado fazem parte de uma estratégia cujo objectivo é o do agravamento da exploração em função da máxima acumulação de lucros pelo capital.
Um roubo tanto mais inaceitável quanto no início deste ano assistimos a uma das maiores vagas de aumentos dos preços dos bens e serviços essenciais, designadamente com o agravamento do IVA de 21 para 23%, mas também dos custos da energia eléctrica, do gás, dos combustíveis, dos transportes públicos, das taxas moderadoras ou dos medicamentos. Aumentos que atingem sobretudo aqueles que têm rendimentos mais baixos e que os destinam no essencial ao consumo.
A mentira da competitividade à custa dos baixos salários
Os argumentos e demais justificações apresentados pelo Governo e pelo cortejo de analistas e comentadores ao serviço da política de direita procuraram fazer passar a ideia não só de que é nos custos salariais que residem as dificuldades económicas do País, como é à custa da sua compressão que se alcançará a necessária competitividade e o crescimento económico. Teses tão velhas quanto falsas e que se destinam apenas a embaratecer o preço da força de trabalho.
A verdade é que, apesar de nas últimas décadas se ter invertido a distribuição da riqueza nacional – com 60% a ir para a remuneração do capital e apenas 40% para o trabalho – a situação económica e social do País piorou.
São os próprios dados oficiais a reconhecer que as remunerações dos trabalhadores representam apenas 26,1% dos custos de produção das empresas em geral e, especificamente, no caso dos ramos exportadores esse peso nos custos de produção é de apenas 15,5% em média. Mesmo no caso do sector exportador dos têxteis e indústria do vestuário, onde esse peso é mais elevado, esse factor representa apenas 23,9% do conjunto dos custos. Aliás, foi o próprio Ministério do Trabalho a reconhecer que aumento do salário mínimo para 500 euros em 2011 teria um impacto nos custos salariais das empresas de apenas 0,21%.
São os custos dos factores de produção como a energia, o crédito bancário, as portagens ou telecomunicações – sectores detidos no essencial por grupos monopolistas criados a partir das privatizações – que, a par das consequências decorrentes da integração na União Económica e Monetária e do Euro, constituem as causas maiores do estrangulamento da economia e da competitividade das nossas exportações.
Tudo isto num país que só nos nove primeiros meses do ano 2010 viu os 20 principais grupos económicos alcançarem mais de 9750 milhões de euros de lucros (inclui negócio da PT com venda da Vivo), valor que expressa bem para onde estão a ser canalizados os recursos provenientes das chamadas medidas de austeridade.
O aumento dos salários como factor de desenvolvimento
Os salários desempenham na vida de um país um papel que está para além da sua dimensão social. Deles podemos aferir, conjugado com o tempo de trabalho, o grau de exploração da mais-valia. Mas os salários têm também uma importante relevância económica. Só se produz e só se vende o que os salários podem comprar, já que o lucro (a mais-valia), embora também compre, nas condições actuais está a ser sobretudo canalizada para o exterior do País, para a especulação financeira e paraísos fiscais.
A situação do País, inserida que está na crise mais geral do sistema capitalista, expressa um quadro de subconsumo relativo das massas ou sobreprodução do próprio sistema, pelo que a redução do valor dos salários, a par do congelamento das pensões ou dos cortes nas prestações sociais, têm como consequência o aprofundamento da própria crise. Os baixos salários são objectivamente um entrave ao crescimento económico, um factor de recessão, que aliás se evidenciará em 2011 em Portugal.
A luta pelo aumento dos salários – incluindo a luta pelo aumento do SMN – mobilizando a classe operária e o conjunto dos trabalhadores, assumirá um papel ainda mais central. Ela é inseparável da defesa de uma política de Estado de substituição de produtos importados por produção nacional. É um factor de combate ao alastramento da pobreza. É uma condição para a melhoria das condições de vida do nosso povo. É parte integrante da luta por uma política alternativa, patriótica e de esquerda que, com o PCP, os trabalhadores e o povo continuarão a travar.