Ensino profissional

Melhores condições com a luta dos estudantes

Hugo Janeiro

A Juventude Comunista Portuguesa está a aumentar a sua influência entre os alunos das escolas profissionais, disseram ao Avante! João Martins, Catarina Vieira e Carlos Viegas, estudantes daquele subsistema de ensino que, acusam, tem sido abandonado pelo Governo com o objectivo de o entregar à lógica do lucro.

 

João é aluno da Escola Profissional de Ciências Geográficas. Catarina e Carlos frequentam a Escola Profissional Agostinho Roseta. Os três fazem parte dos colectivos da JCP naqueles estabelecimentos. Todos contribuem para o diagnóstico dos problemas do ensino profissional e para a apresentação de propostas visando a sua resolução. O apuramento faz-se na discussão colectiva da experiência vivida.

Mas a sua militância não se limita à constatação das dificuldades e ao enunciar de soluções. Procuram esclarecer e ouvir os estudantes, orientação que tem dado frutos, explicam, nomeadamente quanto à influência da «jota» entre os alunos.

«Ao lermos o Projecto de Resolução do 9.º Congresso, é evidente que a JCP tem hoje maior conhecimento da situação», diz Catarina Vieira.

O número de colectivos no distrito de Lisboa também tem vindo a aumentar. «Neste momento são 6», esclarece, por seu lado João Martins, que, no entanto, recorda a existência de «muitos camaradas dispersos por várias escolas», aos quais, pelo contacto directo e aproveitando documentos e iniciativas da JCP – como o caso do recente Encontro Regional de Lisboa ou, agora, do Congresso – tem sido possível chegar.

 

O caminho mais sólido

 

Mas a mobilização dos alunos para a acção em defesa dos seus interesses é, seguramente, o melhor exemplo de que a luta por objectivos concretos, lá onde os problemas se fazem sentir, é o caminho mais sólido. O caso da Escola Profissional Agostinho Roseta (EPAR) é lapidar.

No início deste ano, alunos e professores da EPAR transferiram-se para um andar no Parque das Nações. Com a mudança, aos problemas comuns a todos os estabelecimentos do Ensino Profissional, acresceram outros, específicos da EPAR. À inexistência de um bar ou de um refeitório, respondeu a direcção da escola com a instalação de micro-ondas numa sala de convívio, e firmando um acordo com um café das redondezas que vende refeições com desconto de 1 euro. «A questão é que a sala não tem condições e no café os alunos têm de pagar 5 euros pelo almoço», explica Catarina Vieira.

Mas a deslocação acarretou, também, transtornos no normal funcionamento das aulas. «Deixámos de ter Educação Física porque não existem balneários», denuncia Carlos Viegas. «Durante cerca de 1 mês, a escola ainda nos transportou de autocarro para a Afonso Domingues, mas rapidamente percebeu que tal era insustentável», acrescenta.

Depois, há os problemas com as aulas de Expressão Plástica, as quais funcionam numa sala sem mesas adequadas. «Desde Janeiro que prometem resolver o problema mas até agora nada», sublinha Catarina Vieira.

«Outra questão – diz - é a saída de professores. Eu entrei em Outubro e desde então mudei de professores em várias disciplinas. Cheguei a ter três professores na mesma cadeira. Ou seja, com a mudança de instalações, todo o processo lectivo tem sido prejudicado», conclui.

 

Resultado da luta

 

Perante este cenário, era preciso fazer qualquer coisa. Distribuímos um boletim de escola apontando alguns dos problemas existentes, contaram. A iniciativa teve «um apoio fenomenal», sublinhou entusiasmado Carlos Viegas, que considera a chave do sucesso o facto de «todos os colegas se identificarem com as questões abordadas e com a denúncia da desresponsabilização do Governo face ao Ensino Profissional».

Mas a mobilização dos alunos, quer perante a EPAR quer perante o executivo PS/Sócrates, não foi bem vista pela direcção da escola. Carlos e Catarina foram acusados de espalharem mentiras, «algo que um dos colegas que mais próximo está da JCP reclamou ser injusto confrontando mesmo a directora, que não argumentou quanto ao que escrevemos no boletim», contou Carlos Viegas.

Uma vez chegados à sala da direcção, foi-lhes referido ainda outro assunto: o processo de constituição da Associação de Estudantes (AE). «A proposta de estatutos e o pedido de uma sala para a convocação de uma Reunião Geral de Alunos afim de os aprovar encontra-se parado desde a distribuição do boletim», diz Catarina Vieira.

Apesar de incómoda, a acção dos jovens comunistas teve as primeiras consequências práticas. «Houve uma adesão à JCP», diz Catarina Vieira. «Ainda não aderiram mais colegas, mas muitos perguntam sobre a constituição da AE ou o Congresso da JCP», diz Carlos Viegas. «Mesmo nos transportes públicos proporciona-se a conversa e querem saber se podem ir ao Congresso ou quais as próximas lutas», aduz.

 

Ensino de segunda?

 

O Ensino Profissional é cada vez mais «um ensino de vocações» que «contribui para a especialização dos jovens», lembra João Martins. Mas, apesar da propaganda do Governo, a realidade demonstra a sua desresponsabilização face a este subsistema, patente na «substituição das escolas profissionais públicas pelas privadas, onde se chegam a pagar propinas de 350 euros».

Outra questão candente é a dos estágios, os quais deveriam servir para adquirir experiência. Os factos mostram, porém, o contrário, com exemplos de «alunos de informática a arrumarem livros numa biblioteca serem considerados estagiários», conta ainda João Martins.

Por outro lado, há a questão dos conteúdos curriculares que, «com o fim do PRODEP e a revisão dos cursos, baixaram a exigências para os alunos do Ensino Profissional prejudicando-os no acesso ao Ensino Superior», denuncia Catarina Vieira; e «a inexistência de legislação que obrigue a implementação da Educação Sexual nestas escolas», recorda Carlos Viegas.

Para alertar sobre estas questões, a Associação de Estudantes da Escola Profissional de Ciências Geográficas lançou, no dia 24 de Março, um abaixo-assinado que reivindica a resolução destes e doutros problemas, defendendo, como opção de fundo, um Ensino Profissional publico, gratuito e de qualidade. Contamos recolher 4 mil assinaturas e levar a discussão à AR exigindo que o Ensino Profissional não seja tratado como de segunda, explica João Martins.

 

Na rua com Maio

 

A conversa com os jovens militantes da JCP antecedeu a manifestação do 1.º de Maio em Lisboa. Durante a manhã participaram num plenário electivo de delegados ao Congresso que a organização revolucionária da juventude vai realizar a 22 e 23 de Maio, em Lisboa. À tarde, lembraram, as forças estavam guardadas para o desfile.

Catarina Vieira e Carlos Viegas têm razões acrescidas para o fazerem. Para além de estudantes são trabalhadores. Precários, sem direitos, sobre-explorados.

Ambos partilham experiências de sucessivos contratos com empresas de trabalho temporário que alugam a sua mão-de-obra; de salários de miséria que resultam do pagamento de pouco mais de 1 euro por hora de trabalho; de obrigatoriedade de frequência de formações sem qualquer remuneração; da ausência de quaisquer direitos no local de trabalho.

Vão ao primeiro de Maio porque essa é uma forma de integrar uma luta que já é a sua. Pela mudança de políticas, pela valorização do trabalho, dos trabalhadores, e, destacaram ainda, em defesa do aproveitamento da formação que ao longo do respectivo percurso escolar foram adquirindo, mas que política de direita deita borda fora, desperdiçando o saber-fazer essencial ao desenvolvimento do País. Depois venham-nos falar de qualificação das novas gerações…

 

Propostas de classe

 

O projecto de Resolução Política do 9.º Congresso da JCP é um instrumento valioso para contactar e esclarecer os estudantes do ensino profissional, como sublinhou João Martins. No documento, a Juventude Comunista Portuguesa analisa criticamente a situação neste subsistema e avança com contributos para superar as debilidades que mais sobressaem em resultado das orientações prosseguidas pelos sucessivos governos.

Das propostas da JCP destacamos:

 

  • Um claro e sério investimento público neste subsistema de ensino que se assume, cada vez mais, como um importante objectivo para uma estratégia nacional que garanta um futuro de crescimento ao serviço do País, dos interesses do povo e dos trabalhadores.

  • A adopção de um sistema de financiamento do ensino profissional que garanta a igualdade de oportunidades entre estudantes no acesso ao ensino profissional.

  • A eliminação das propinas e de qualquer outra forma de pagamentos.

  • O desenvolvimento de mecanismos de apoio aos estudantes através do pagamento de subsídios de alimentação, transporte e alojamento.

  • A adopção de políticas que garantam a igualdade de oportunidades entre os estudantes do profissional e secundário no acesso ao Ensino Superior.

  • A criação de condições de acesso ao emprego com direitos por parte dos estudantes que terminam a sua formação em cada uma das escolas.

  • A criação de cursos profissionais que se enquadrem nas necessidades de cada distrito do País.