Golpistas decretam estado de sítio nas Honduras

As botas cardadas da ditadura

Após o regresso, dia 21, do presidente Manuel Zelaya às Honduras, os usurpadores golpistas liderados por Roberto Micheletti acentuaram o clima de repressão com suspensão dos direitos civis, determinados a consolidar a ditadura fascista e a afogar em sangue o movimento popular.

EUA dão apoio tácito à ditadura hondurenha

Se dúvidas houvesse quanto aos intentos dos golpistas hondurenhos ter-se-iam dissipado na noite de domingo, 27, com a comunicação televisiva da suspensão dos direitos e liberdades individuais.
Em resposta a uma semana de intensos protestos populares em apoio de Zelaya, a ditadura formalizou a suspensão de cinco direitos constitucionais: a liberdade individual, a liberdade de expressão, a liberdade de associação e reunião, a liberdade de circulação e os direitos dos detidos.
Deste modo, «qualquer reunião pública não autorizada» está proibida, «qualquer pessoa que coloque em perigo a sua vida ou a de terceiros» pode ser detida sem mandato, os locais ocupados por manifestantes estão sujeitos a «evacuação» e os órgãos de comunicação que «ataquem a liberdade e a ordem pública» serão encerrados.
Estas medidas de excepção, que configuram a declaração de facto do estado de sítio no país, têm um prazo de vigência de 45 dias, isto é, abrangem o período de campanha eleitoral das eleições marcadas para 29 de Novembro, o que denuncia o claro propósito de Micheletti de inviabilizar o sufrágio e, caso viesse a realizar-se, utilizá-lo para reforçar o seu regime ditatorial.
Logo na segunda-feira, 28, um destacamento de polícias de choque e militares ocupou as instalações da Radio Globo de Tegucigalpa, cujas emissões ficaram suspensas, Também as instalações da estação de televisão Canal 36 foram cercadas e ocupadas logo pela manhã do mesmo dia. Com estes dois actos repressivos, a ditadura calou «as duas únicas vozes do povo hondurenho», segundo afirmou Manuel Zelaya por telefone à AFP.

Arrogância suspeita

Em simultâneo com a escalada repressiva no interior do país, a clique de Micheletti não hesita em desafiar abertamente as instâncias internacionais, ignorando com soberba as condenações e sanções da generalidade dos países, ainda que temperadas pelas hesitações e ambiguidades dos EUA, que alimentam as cada vez mais fundadas suspeitas do seu apoio não declarado aos putchistas.
Depois de o presidente brasileiro Lula da Silva ter protestado, dia 23, na tribuna da Assembleia Geral da ONU contra o cerco da sua embaixada em Tegucigalpa, o Conselho de Segurança, reunido de emergência na sexta-feira, 25, preveniu o governo golpista contra qualquer tentativa de violar a imunidade do recinto diplomático.
Todavia, o aviso não intimidou Micheletti que respondeu com um ultimato ao Brasil, intimando-o a, num prazo de 10 dias, definir o «estatuto» do seu convidado e «pôr termo aos apelos à violência» lançados por Zelaya a partir da embaixada, sob ameaça de intervenção militar contra a missão diplomática.
Ainda no domingo, as forças da ditadura detiveram durante seis horas, no aeroporto de Toncontin, uma delegação da Organização dos Estados Americanos (OEA), que chegou às Honduras com o objectivo de preparar uma missão de mediação.
Micheletti expulsou a equipa constituída por dois americanos, um canadiano, um colombiano e o chileno John Biehl, conselheiro do secretário-geral da OEA, José Miguel Insulza.

EUA mostram a face

Deixando cair a máscara que encobriu a verdadeira posição de Washington nos últimos três meses, o representante dos EUA na Organização dos Estados Americanos (OEA), Lewis Amselem, revelou o apoio tácito do seu governo aos golpistas hondurenhos.
Surpreendendo alguns e confirmando as suspeitas de outros, Amselem declarou, na segunda-feira, 28, durante o conselho extraordinário da OEA, que o presidente Manuel Zelaya deveria deixar de se comportar «como se fosse uma estrela de cinema» e qualificou o regresso do chefe de Estado como um acto «irresponsável», que «não serve os interesses do povo hondurenho, nem dos que trabalham para o restabelecimento pacífica da ordem democrática nas Honduras».
O representante dos EUA fez ainda questão de criticar «os que facilitaram o regresso do presidente Zelaya», acusando-os de terem «uma responsabilidade particular na prevenção da violência e na garantia do bem-estar do povo hondurenho».
Anteontem, terça-feira, 29, Manuel Zelaya dirigiu-se à Assembleia-Geral da ONU, através do telefone da sua ministra dos Negócios Estrangeiros, Patrícia Rodas, que se encontrava a discursar.
«Solicito apoio às Nações Unidas para que se mantenha uma posição firme por parte das nações civilizadas do mundo contra a força e a barbárie», apelou o presidente.
«Peço também às Nações Unidas que salvaguardem a nossa integridade pessoal e a das pessoas que estão a ser atacadas com gases químicos e com interferências electrónicas nesta sede diplomática da república irmã do Brasil».
A vida de Zelaya está em perigo, garantiu Patrícia Rodas à Assembleia Geral da ONU.

PCP condena golpistas

O PCP reitera a sua firme condenação do golpe de estado perpetrado em 28 de Junho contra o povo e a ordem constitucional hondurenha. Em comunicado divulgado, dia 26, sobre a recente evolução da situação nas Honduras, a direcção do PCP «denuncia e condena veementemente a repressão contra os trabalhadores e o povo hondurenhos e insiste na necessidade da imediata reposição da ordem constitucional, incluindo a urgente e incondicional retoma das funções de Manuel Zelaya como legítimo Presidente das Honduras, assim como o absoluto respeito do direito internacional, garantindo a inviolabilidade das representações diplomáticas».
«O PCP reafirma a sua solidariedade para com o povo e as forças progressistas hondurenhas que, com assinalável persistência e determinação, prosseguem há meses a luta pela recuperação da legalidade democrática e constitucional no seu país, saudando as iniciativas de apoio à resistência e às acções dos trabalhadores e sectores democráticos das Honduras.
«O PCP, chamando a atenção para a hipocrisia que tem caracterizado a postura da chamada «comunidade internacional» na reacção ao golpe de Estado perpetrado pela oligarquia e a reacção hondurenha, considera indispensável uma clara e adequada tomada de posição do Governo português em prol do imediato restabelecimento da legalidade constitucional nas Honduras.
«Posição tão mais importante quanto será Portugal o país anfitrião da XIX Cimeira Ibero-Americana de Chefes de Estado e de Governo, a realizar de 30 de Novembro a 1 de Dezembro de 2009, no Estoril.»


Mais artigos de: Internacional

Milhares contra G20

Milhares de manifestantes concentraram-se na cidade norte-americana de Pittsburgh para protestar contra a cimeira do G20, que reúne os líderes das principais potências mundiais.Na véspera da manifestação de sexta-feira, 25, que reuniu mais de 10 mil pessoas, a polícia dispersou violentamente grupos de jovens...