- Nº 1835 (2009/01/29)
Comentário

Verdade e mentira

Europa

A mentira é parte integrante, constitutiva, intrínseca, permanente, da política dos governos de direita e dos partidos que nestes participam. Tornou-se uma prática que se insere com desfaçatez e cinismo na completa falta de escrúpulos morais desses governos e partidos.» (1)
Muitos são os exemplos que – a partir das diversificadas experiências individuais e, igualmente, da experiência de ser e viver colectivo, que é a nossa –, podem ser dados para comprovar a veracidade e a actualidade destas afirmações.
Aproximando-se um intenso período eleitoral, com a realização de três actos eleitorais (Parlamento Europeu, Assembleia da República e Autarquias Locais) até Outubro, o PS – com o seu governo e maioria parlamentar –, de forma desonesta e inqualificável, procura descartar-se da responsabilidade (eles que se dizem tão responsáveis...) de mais quatro anos de politica de direita, com as suas gravosas e calamitosas consequências para as condições de vida dos trabalhadores e a situação do País.
É pois, com a plena consciência de que poderiam ser realçados outros exemplos, até mais significativos, da mentira como prática própria da política de direita, que rememoramos cinco situações.
O PS (aliás, como o PSD e o CDS-PP) comprometeu-se a realizar uma consulta ao povo português sobre a proposta de tratado – inicialmente denominada de «constituição europeia» e, agora, renomeada de «tratado de Lisboa» –, para, depois, dando o dito por não dito, impedir a realização do referendo e de um amplo e esclarecedor debate nacional quanto às consequências deste tratado.
O PS votou favoravelmente no Conselho da UE a denominada directiva de «retorno», que criminaliza a imigração e viola os direitos humanos dos imigrantes. Face à denúncia do carácter desumano desta directiva, deputados do PS no Parlamento Europeu e na Assembleia da República criticaram o seu conteúdo, procurando branquear e escamotear o apoio dado pelo PS no Conselho da UE. O PS voltou a votar favoravelmente e a aprovar no Conselho da UE esta vergonhosa e inaceitável directiva a 9 de Dezembro.
O PS absteve-se no Conselho da UE na votação sobre a proposta de directiva de tempo de trabalho que, entre outros aspectos, pretendia estabelecer: 1 - um «período inactivo do tempo de permanência» não contabilizado como tempo de trabalho e, portanto, não pago, possibilitando que a jornada média semanal de trabalho, nesses casos, pudesse ir até às 65 horas; 2 - o alargamento, de facto, do período de referência de quatro para 12 meses no cálculo da duração do trabalho, o que contribuiria para agravar a desregulamentação do horário de trabalho; 3 - a possibilidade de derrogação individual, por pressão do patrão sobre o trabalhador, da duração máxima de uma semana de trabalho, admitindo o seu prolongamento, em certas condições, até às 78 horas, ou seja, 13 horas por dia, obrigando apenas a um dia de descanso em sete dias. O PS absteve-se (!?) relativamente a estas deploráveis e inaceitáveis propostas no Conselho da UE, embora os seus responsáveis bem tenham tentado esconder este seu infame mas clarificador voto, aliás coerente com o conteúdo do seu Pacote Laboral.
Bem pode o PS anunciar, utilizando formulações retóricas e inconsequentes, que pretende a eliminação dos «paraísos fiscais». A verdade é que o PS não apresentou qualquer proposta que se conheça para acabar com estes e, bem pelo contrário, em todos os orçamentos de estado atribuiu ao offshore da Madeira milhares de milhões de euros em benefícios fiscais (quase 1800 milhões de euros, só em 2009).
O PS apregoa a disponibilidade para, de forma pouca clara, receber o que designa por «prisioneiros de Guantanamo», indo uma vez mais em socorro da administração norte-americanas. No entanto, o PS nunca condenou os criminosos voos da CIA e rejeitou as propostas do PCP no sentido de apurar a responsabilidade do Governo português no eventual uso do território nacional para o transporte ilegal de detidos pelos serviços secretos norte-americanos e que propunham a adopção de medidas que impossibilitassem que tal continue a acontecer.
Não são todos iguais!
«O amor pela verdade pode temporariamente custar caro a quem o exercita. Mas a verdade acaba por triunfar da mentira. A política da mentira está condenada à derrota final. É à política da verdade que o futuro pertence. (...) A verdade é para o PCP uma necessidade objectiva, uma arma de luta, um factor da força e influência, um penhor do futuro e um imperativo moral.» (1)
Abramos com firmeza e confiança o nosso caminho!
(1) In O Partido com paredes de vidro, pág. 197 a 199, Álvaro Cunhal

Pedro Guerreiro