Revolução e contra-revolução em Portugal
Nos anos da Revolução, tudo mudou em Portugal. As amplas liberdades, o fim da guerra, as conquistas económicas e sociais não eram já um programa político – eram a realidade construída dia-a-dia.
O PCP passou de um sólido e poderoso partido clandestino para um imenso partido de massas. Um ano após o 25 de Abril, tinha já 100 mil membros e continuava a crescer, a ligar-se ainda mais profundamente à classe operária, aos trabalhadores e ao povo e a encaminhar a jovem democracia para o socialismo.
É de tudo isto, e dos ataques ao Partido, à democracia e ao 25 de Abril que nos falam os documentos, resoluções e intervenções dos congressos que o Partido realizou nos anos da Revolução – o VII (Extraordinário) e o VIII.
O VII Congresso (Extraordinário) do PCP realizou-se no dia 20 de Outubro de 1974. Menos de seis meses depois do 25 de Abril e 9 anos depois do congresso anterior.
Nesses anos, mas sobretudos nesses escassos meses, muito tinha mudado no País: o governo fascista tinha sido deposto; o PCP, que contava já com 30 mil militantes e milhares de organizações a funcionar, integrava os governos provisórios e os seus militantes eram eleitos pelo povo nas mais variadas frentes da luta pela liberdade; as massas populares, nas ruas e nas empresas, empurravam a Revolução mais para diante.
Muitos dos objectivos inscritos no Programa do PCP para a Revolução Democrática e Nacional, aprovado em 1965 no VI Congresso, tinham já sido realizados ou encontravam-se em fase de realização prática, exigindo a sua actualização. A existência legal do Partido, ainda que não legalmente consagrada, tornava prementes alterações aos Estatutos, que mantinham ainda normas de natureza conspirativa.
Tudo isto levou à convocação, pelo Comité Central, no dia 6 de Outubro, de um Congresso Extraordinário, «tendo como ponto único da ordem de trabalhos a discussão e aprovação de modificações ao Programa e aos Estatutos do Partido, tendo em conta a nova situação política existente em Portugal após o 25 de Abril e as novas tarefas dela decorrentes», como se podia ler no comunicado dessa reunião.
Nas duas semanas entre a convocação e a realização do Congresso, os comunistas levaram a cabo um intenso trabalho de preparação, intimamente ligado à Revolução que se construía nas ruas e nas empresas. No dia 20, na abertura dos trabalhos, Joaquim Pires Jorge, do Comité Central, lembrou que «este Congresso é o primeiro que efectuamos em condições legais e abertas no espaço de quase meio século. O fascismo não conseguiu impedir que quatro congressos fossem realizados na clandestinidade. Estamos a realizá-lo hoje com a participação de mil delegados e a presença de mais de quatro mil militantes».
Como diria, a seguir, Álvaro Cunhal, então Secretário-geral do PCP, o VII Congresso do Partido era, «por si só, uma mostra da radical transformação da situação política verificada em Portugal a partir do 25 de Abril».
Liquidar o poder dos monopólios e dos latifundiários
Prosseguindo a sua intervenção, Álvaro Cunhal justificou a necessidade de alterar o Programa do Partido. A liberdade era já uma realidade: a imprensa publicava-se sem censura; os partidos, sindicatos e associações organizavam-se e actuavam livremente; o direito de reunião era exercido, assim como o direito à greve. A guerra colonial tinha já terminado e «passos históricos» se tinham dado, então, no sentido da descolonização. As relações diplomáticas com a União Soviética e o campo socialista tinham-se iniciado.
Mas a liberdade conquistada era mais do que política: os trabalhadores tinham alcançado a «satisfação de algumas importantes reivindicações»: o estabelecimento do salário mínimo; a conclusão de acordos colectivos; a obtenção de benefícios sociais. «Os êxitos alcançados – sublinhou Álvaro Cunhal – nem os poderia alcançar o MFA sem as forças democráticas e as massas populares, nem os poderiam alcançar as forças democráticas e as massas populares sem o MFA.
No Programa do Partido, depois de alterado, foi incluída uma plataforma de emergência, apontando três direcções de luta pela instauração de um regime democrático: o reforço do Estado democrático e a defesa das liberdades; a defesa da estabilidade económica e financeira com vista ao desenvolvimento; o prosseguimento da descolonização. O Congresso confirmaria ainda a tese que considerava que a defesa da liberdade e a construção da democracia exigiam a completa liquidação do poder económico dos monopolistas e latifundiários. As nacionalizações, o controlo operário e a Reforma Agrária seriam, meses depois, uma realidade!
No VII Congresso (Extraordinário) tomaram a palavra mais de meia centena de delegados. O Programa e os Estatutos foram aprovados sem votos contra, tendo o primeiro contado com três abstenções e o último apenas com uma.
Dado o seu carácter extraordinário e o facto de se realizar apenas num dia, o VII Congresso não contou com a presença de delegações estrangeiras. Mas foi saudado por dezenas de partidos comunistas, operários e progressistas de todo o mundo.
Militantes com direitos iguais
No VII Congresso do PCP não foi eleito o Comité Central, dado o seu carácter extraordinário. Mas foi apresentado, pela primeira vez, o Comité Central em funções e os seus organismos executivos. A tarefa coube a Octávio Pato, à data membro da Comissão Política e do Secretariado do CC.
Composto por 36 membros, efectivos e suplentes, o Comité Central representava e resumia a intensa luta do Partido contra a ditadura fascista em Portugal. No total, os seus membros tinham passado 755 anos na clandestinidade e 308 no cárcere. Apenas quatro não tinham conhecido a prisão. A grande maioria – 75 por cento – era operária ou empregada.
No discurso de encerramento, Álvaro Cunhal afirmou: «não queremos que haja no Partido membros do Partido de primeira classe e de segunda classe. Todos os membros do Partido têm direitos iguais, têm deveres iguais, venham do tempo da clandestinidade ou entrem depois do 25 de Abril».
Defender e ampliar as conquistas de Abril
De 11 a 14 de Novembro de 1976, realizou-se na FIL (onde, meses antes, se realizara com sucesso a primeira Festa do Avante!), o VIII Congresso do PCP, sob o lema «Com a democracia para o socialismo». Participaram 1282 delegados e assistiram aos trabalhos 62 delegações de partidos estrangeiros.
O Congresso culminou um intenso trabalho de preparação. Na reunião do Comité Central de 2 e 3 de Outubro, foram aprovados o relatório, da autoria de Álvaro Cunhal, intitulado A Revolução Portuguesa, o Passado e o Futuro, e as Teses. Estas foram amplamente debatidas em todo o Partido: 40 mil comunistas participaram na discussão das Teses em 2300 reuniões especialmente dedicadas a esse efeito. Foram apresentadas mais de 3 mil propostas de alteração ou adenda.
«Dois anos e meio após o derrubamento da ditadura fascista, o balanço do caminho percorrido mostra os extraordinários êxitos alcançados pelo povo português num tão curto espaço de tempo», afirmou, na intervenção de abertura, Álvaro Cunhal, então Secretário-geral do Partido. Fazendo o balanço da Revolução, o histórico dirigente comunista sublinhou os avanços alcançados: liberdades políticas; liquidação do poder dos monopólios e dos latifundiários e construção de «estruturas económicas diferentes»; o fim da guerra colonial.
Para Álvaro Cunhal, a Revolução portuguesa «comprovou e continua a comprovar que há leis objectivas do desenvolvimento» ao mesmo tempo que comprovava que «cada revolução tem particularidades e originalidades». Em primeiro lugar, a aliança que se estabeleceu entre o povo e as Forças Armadas (não sem grandes contradições internas); depois, as «profundas alterações nas estruturas económicas pelas forças revolucionárias em movimento, sem que tivessem o poder político»; ou as «amplas» nacionalizações, a Reforma Agrária ou o controlo operário como «medidas impostas pela própria situação». Mesmo o regime instituído pela Constituição, aprovada meses antes, apresentava «traços originais», realçou. «Nem é parlamentar, nem é presidencialista, nem é popular, e tem um pouco de cada uma destas características.»
As tarefas necessárias
Para além de analisar os últimos anos da ditadura fascista e a construção do Portugal de Abril, o Congresso definiu também a política necessária para o consolidar e desenvolver, rumo ao socialismo. E acentuou o papel desempenhado e a desempenhar pelo Partido.
Num dos documentos aprovados pelos delegados, Medidas para defesa e consolidação da democracia e da independência nacional, apontava-se o caminho: «Não é com uma política de recuperação capitalista, agrária e imperialista que se poderá reanimar a economia, restabelecer o equilíbrio financeiro e caminhar para uma nova época de desenvolvimento. As liberdades defendem-se defendendo as outras grandes conquistas da Revolução: as nacionalizações, a Reforma Agrária e o controlo operário.»
Sobre o governo PS, dirigido então por Mário Soares, que começava a desferir sérios golpes nas conquistas revolucionárias, Álvaro Cunhal alertou, no encerramento do Congresso: «o governo do PS está a meter-se num beco sem saída.» E reafirmou que «nas condições actuais criadas pela Revolução, as liberdades não se podem defender, a democracia não se pode construir sem o PCP e muito menos contra o PCP».
«O VIII Congresso mostrou bem perante todo o País as profundas e sólidas raízes do PCP na classe operária, no campesinato, nas classes e camadas não monopolistas. Mostrou que o nosso Partido, com a sua força, a sua organização, a sua unidade, a sua capacidade de realização, as suas profundas raízes no seio do povo trabalhador, não só é necessário como indispensável para a construção da democracia portuguesa», continuou Álvaro Cunhal.
Um grande partido comunista
Quando se realizou o VIII Congresso, o PCP era um grande Partido, com profunda ligação e implantação na classe operária. Como anunciou, na tribuna do Congresso, Octávio Pato, membro da Comissão Política e do Secretariado do Comité Central, o PCP contava, então, com 115 mil militantes, a que se somavam os 25 mil membros das organizações de juventude, a União da Juventude Comunista (UJC) e a União dos Estudantes Comunistas (UEC).
Só no ano seguinte à Revolução, destacaria Fernando Blanqui Teixeira, da Comissão Política, o Partido «alcançou um efectivo de 100 mil membros». Por alturas do VIII Congresso, o PCP contava com 7 mil organismos em funcionamento (3 mil de empresa) e 70 por cento dos militantes encontravam-se envolvidos na actividade diária do Partido.
Blanqui Teixeira realçou também que «é muito importante que se torne parte integrante do pensamento revolucionário de todos os camaradas que, assente numa correcta orientação política, a organização do Partido é a nossa principal arma». Contudo, persistiam dificuldades que, para serem superadas, necessitavam de um «notável alargamento dos quadros do Partido».
O Avante! contava, na altura, com uma tiragem média de 85 mil exemplares, anunciou António Dias Lourenço, membro da Comissão Política e seu director.
A grandeza do Partido era particularmente visível na influência de que gozava junto da classe operária e dos trabalhadores. O movimento sindical, que também se reforçava (a Intersindical contava, então, com 201 sindicatos, representando 1 milhão e 600 mil trabalhadores), contava com uma grande presença de comunistas. Assim como as comissões de trabalhadores e de moradores ou as assembleias populares.
Para as eleições autárquicas desse ano, a Frente Eleitoral Povo Unido (FEPU) concorria a 273 dos 274 municípios do País. Nenhuma outra força conseguiu tal façanha nesse acto eleitoral. «Esta é já uma primeira grande vitória», salientou, na ocasião, Carlos Costa, da Comissão Política e do Secretariado.
No VIII Congresso, foi eleito um Comité Central de 90 elementos, dos quais 54 efectivos e 36 suplentes. Este alargamento causou apreensões a alguns elementos do Partido no período de discussão das Teses. Álvaro Cunhal, considerando «natural» essas preocupações, realçou que as tarefas colocadas ao Partido exigiam a necessidade deste alargamento «considerável» do CC. «O nosso Partido não é um partido voltado para o passado, é um partido voltado para o futuro.»
Nesses anos, mas sobretudos nesses escassos meses, muito tinha mudado no País: o governo fascista tinha sido deposto; o PCP, que contava já com 30 mil militantes e milhares de organizações a funcionar, integrava os governos provisórios e os seus militantes eram eleitos pelo povo nas mais variadas frentes da luta pela liberdade; as massas populares, nas ruas e nas empresas, empurravam a Revolução mais para diante.
Muitos dos objectivos inscritos no Programa do PCP para a Revolução Democrática e Nacional, aprovado em 1965 no VI Congresso, tinham já sido realizados ou encontravam-se em fase de realização prática, exigindo a sua actualização. A existência legal do Partido, ainda que não legalmente consagrada, tornava prementes alterações aos Estatutos, que mantinham ainda normas de natureza conspirativa.
Tudo isto levou à convocação, pelo Comité Central, no dia 6 de Outubro, de um Congresso Extraordinário, «tendo como ponto único da ordem de trabalhos a discussão e aprovação de modificações ao Programa e aos Estatutos do Partido, tendo em conta a nova situação política existente em Portugal após o 25 de Abril e as novas tarefas dela decorrentes», como se podia ler no comunicado dessa reunião.
Nas duas semanas entre a convocação e a realização do Congresso, os comunistas levaram a cabo um intenso trabalho de preparação, intimamente ligado à Revolução que se construía nas ruas e nas empresas. No dia 20, na abertura dos trabalhos, Joaquim Pires Jorge, do Comité Central, lembrou que «este Congresso é o primeiro que efectuamos em condições legais e abertas no espaço de quase meio século. O fascismo não conseguiu impedir que quatro congressos fossem realizados na clandestinidade. Estamos a realizá-lo hoje com a participação de mil delegados e a presença de mais de quatro mil militantes».
Como diria, a seguir, Álvaro Cunhal, então Secretário-geral do PCP, o VII Congresso do Partido era, «por si só, uma mostra da radical transformação da situação política verificada em Portugal a partir do 25 de Abril».
Liquidar o poder dos monopólios e dos latifundiários
Prosseguindo a sua intervenção, Álvaro Cunhal justificou a necessidade de alterar o Programa do Partido. A liberdade era já uma realidade: a imprensa publicava-se sem censura; os partidos, sindicatos e associações organizavam-se e actuavam livremente; o direito de reunião era exercido, assim como o direito à greve. A guerra colonial tinha já terminado e «passos históricos» se tinham dado, então, no sentido da descolonização. As relações diplomáticas com a União Soviética e o campo socialista tinham-se iniciado.
Mas a liberdade conquistada era mais do que política: os trabalhadores tinham alcançado a «satisfação de algumas importantes reivindicações»: o estabelecimento do salário mínimo; a conclusão de acordos colectivos; a obtenção de benefícios sociais. «Os êxitos alcançados – sublinhou Álvaro Cunhal – nem os poderia alcançar o MFA sem as forças democráticas e as massas populares, nem os poderiam alcançar as forças democráticas e as massas populares sem o MFA.
No Programa do Partido, depois de alterado, foi incluída uma plataforma de emergência, apontando três direcções de luta pela instauração de um regime democrático: o reforço do Estado democrático e a defesa das liberdades; a defesa da estabilidade económica e financeira com vista ao desenvolvimento; o prosseguimento da descolonização. O Congresso confirmaria ainda a tese que considerava que a defesa da liberdade e a construção da democracia exigiam a completa liquidação do poder económico dos monopolistas e latifundiários. As nacionalizações, o controlo operário e a Reforma Agrária seriam, meses depois, uma realidade!
No VII Congresso (Extraordinário) tomaram a palavra mais de meia centena de delegados. O Programa e os Estatutos foram aprovados sem votos contra, tendo o primeiro contado com três abstenções e o último apenas com uma.
Dado o seu carácter extraordinário e o facto de se realizar apenas num dia, o VII Congresso não contou com a presença de delegações estrangeiras. Mas foi saudado por dezenas de partidos comunistas, operários e progressistas de todo o mundo.
Militantes com direitos iguais
No VII Congresso do PCP não foi eleito o Comité Central, dado o seu carácter extraordinário. Mas foi apresentado, pela primeira vez, o Comité Central em funções e os seus organismos executivos. A tarefa coube a Octávio Pato, à data membro da Comissão Política e do Secretariado do CC.
Composto por 36 membros, efectivos e suplentes, o Comité Central representava e resumia a intensa luta do Partido contra a ditadura fascista em Portugal. No total, os seus membros tinham passado 755 anos na clandestinidade e 308 no cárcere. Apenas quatro não tinham conhecido a prisão. A grande maioria – 75 por cento – era operária ou empregada.
No discurso de encerramento, Álvaro Cunhal afirmou: «não queremos que haja no Partido membros do Partido de primeira classe e de segunda classe. Todos os membros do Partido têm direitos iguais, têm deveres iguais, venham do tempo da clandestinidade ou entrem depois do 25 de Abril».
Defender e ampliar as conquistas de Abril
De 11 a 14 de Novembro de 1976, realizou-se na FIL (onde, meses antes, se realizara com sucesso a primeira Festa do Avante!), o VIII Congresso do PCP, sob o lema «Com a democracia para o socialismo». Participaram 1282 delegados e assistiram aos trabalhos 62 delegações de partidos estrangeiros.
O Congresso culminou um intenso trabalho de preparação. Na reunião do Comité Central de 2 e 3 de Outubro, foram aprovados o relatório, da autoria de Álvaro Cunhal, intitulado A Revolução Portuguesa, o Passado e o Futuro, e as Teses. Estas foram amplamente debatidas em todo o Partido: 40 mil comunistas participaram na discussão das Teses em 2300 reuniões especialmente dedicadas a esse efeito. Foram apresentadas mais de 3 mil propostas de alteração ou adenda.
«Dois anos e meio após o derrubamento da ditadura fascista, o balanço do caminho percorrido mostra os extraordinários êxitos alcançados pelo povo português num tão curto espaço de tempo», afirmou, na intervenção de abertura, Álvaro Cunhal, então Secretário-geral do Partido. Fazendo o balanço da Revolução, o histórico dirigente comunista sublinhou os avanços alcançados: liberdades políticas; liquidação do poder dos monopólios e dos latifundiários e construção de «estruturas económicas diferentes»; o fim da guerra colonial.
Para Álvaro Cunhal, a Revolução portuguesa «comprovou e continua a comprovar que há leis objectivas do desenvolvimento» ao mesmo tempo que comprovava que «cada revolução tem particularidades e originalidades». Em primeiro lugar, a aliança que se estabeleceu entre o povo e as Forças Armadas (não sem grandes contradições internas); depois, as «profundas alterações nas estruturas económicas pelas forças revolucionárias em movimento, sem que tivessem o poder político»; ou as «amplas» nacionalizações, a Reforma Agrária ou o controlo operário como «medidas impostas pela própria situação». Mesmo o regime instituído pela Constituição, aprovada meses antes, apresentava «traços originais», realçou. «Nem é parlamentar, nem é presidencialista, nem é popular, e tem um pouco de cada uma destas características.»
As tarefas necessárias
Para além de analisar os últimos anos da ditadura fascista e a construção do Portugal de Abril, o Congresso definiu também a política necessária para o consolidar e desenvolver, rumo ao socialismo. E acentuou o papel desempenhado e a desempenhar pelo Partido.
Num dos documentos aprovados pelos delegados, Medidas para defesa e consolidação da democracia e da independência nacional, apontava-se o caminho: «Não é com uma política de recuperação capitalista, agrária e imperialista que se poderá reanimar a economia, restabelecer o equilíbrio financeiro e caminhar para uma nova época de desenvolvimento. As liberdades defendem-se defendendo as outras grandes conquistas da Revolução: as nacionalizações, a Reforma Agrária e o controlo operário.»
Sobre o governo PS, dirigido então por Mário Soares, que começava a desferir sérios golpes nas conquistas revolucionárias, Álvaro Cunhal alertou, no encerramento do Congresso: «o governo do PS está a meter-se num beco sem saída.» E reafirmou que «nas condições actuais criadas pela Revolução, as liberdades não se podem defender, a democracia não se pode construir sem o PCP e muito menos contra o PCP».
«O VIII Congresso mostrou bem perante todo o País as profundas e sólidas raízes do PCP na classe operária, no campesinato, nas classes e camadas não monopolistas. Mostrou que o nosso Partido, com a sua força, a sua organização, a sua unidade, a sua capacidade de realização, as suas profundas raízes no seio do povo trabalhador, não só é necessário como indispensável para a construção da democracia portuguesa», continuou Álvaro Cunhal.
Um grande partido comunista
Quando se realizou o VIII Congresso, o PCP era um grande Partido, com profunda ligação e implantação na classe operária. Como anunciou, na tribuna do Congresso, Octávio Pato, membro da Comissão Política e do Secretariado do Comité Central, o PCP contava, então, com 115 mil militantes, a que se somavam os 25 mil membros das organizações de juventude, a União da Juventude Comunista (UJC) e a União dos Estudantes Comunistas (UEC).
Só no ano seguinte à Revolução, destacaria Fernando Blanqui Teixeira, da Comissão Política, o Partido «alcançou um efectivo de 100 mil membros». Por alturas do VIII Congresso, o PCP contava com 7 mil organismos em funcionamento (3 mil de empresa) e 70 por cento dos militantes encontravam-se envolvidos na actividade diária do Partido.
Blanqui Teixeira realçou também que «é muito importante que se torne parte integrante do pensamento revolucionário de todos os camaradas que, assente numa correcta orientação política, a organização do Partido é a nossa principal arma». Contudo, persistiam dificuldades que, para serem superadas, necessitavam de um «notável alargamento dos quadros do Partido».
O Avante! contava, na altura, com uma tiragem média de 85 mil exemplares, anunciou António Dias Lourenço, membro da Comissão Política e seu director.
A grandeza do Partido era particularmente visível na influência de que gozava junto da classe operária e dos trabalhadores. O movimento sindical, que também se reforçava (a Intersindical contava, então, com 201 sindicatos, representando 1 milhão e 600 mil trabalhadores), contava com uma grande presença de comunistas. Assim como as comissões de trabalhadores e de moradores ou as assembleias populares.
Para as eleições autárquicas desse ano, a Frente Eleitoral Povo Unido (FEPU) concorria a 273 dos 274 municípios do País. Nenhuma outra força conseguiu tal façanha nesse acto eleitoral. «Esta é já uma primeira grande vitória», salientou, na ocasião, Carlos Costa, da Comissão Política e do Secretariado.
No VIII Congresso, foi eleito um Comité Central de 90 elementos, dos quais 54 efectivos e 36 suplentes. Este alargamento causou apreensões a alguns elementos do Partido no período de discussão das Teses. Álvaro Cunhal, considerando «natural» essas preocupações, realçou que as tarefas colocadas ao Partido exigiam a necessidade deste alargamento «considerável» do CC. «O nosso Partido não é um partido voltado para o passado, é um partido voltado para o futuro.»