PCP propõe alterações à revisão do Código do Trabalho

Travar um crime económico e social

São 184 as alterações apresentadas pelo PCP ao Código do Trabalho, actualmente em debate na especialidade no Parlamento. Este é um processo que não está encerrado e, por isso, os comunistas não dão tréguas à bancada do PS e ao Governo para evitar que se concretize o que apelidam de «autêntico crime económico e social».

As propostas do PS conduzem a mais pobreza e a maiores desigualdades sociais

Nestes termos definiu o texto legislativo do Governo o deputado comunista Francisco Lopes na conferência de imprensa realizada na passada semana onde deu a conhecer o essencial das propostas formalizadas pela sua bancada em sede de comissão parlamentar.
À cabeça dessa extensa lista de quase duas centenas de alterações subscritas pelos deputados comunistas surge a reposição do princípio do tratamento mais favorável ao trabalhador, «exactamente com a mesma redacção» que o PS lhe deu em 2003, quando era oposição e foi aprovado o Código do Trabalho, especificou o deputado do PCP. O objectivo subjacente a esta proposta, «exactamente com a mesma redacção» dada pelos socialistas há cinco anos, visa «evidenciar a mudança do PS», que «está a faltar ao prometido», explicou Francisco Lopes.
Por este sublinhado com particular dureza foi o facto de a iniciativa legislativa do Governo de alteração às leis laborais, para entrar em vigor em 2009, no actual contexto económico, constituir «um autêntico crime económico e social».
«Parte significativa dos pobres (cerca de metade) são trabalhadores que estão numa situação de pobreza devido aos fracos rendimentos que auferem», exemplificou o parlamentar do PCP, para quem as propostas do executivo, a vingarem, terão inevitavelmente como resultado «o agravamento da pobreza, das desigualdades sociais e salariais».
O que se impõe, até «pela crise do capitalismo», «é uma aposta nos aumentos dos salários, das remunerações, do poder de compra, das condições de vida dos trabalhadores», enfatizou, traçando linhas de mudança de uma política alternativa. «Só assim pode haver desenvolvimento económico», garantiu Francisco Lopes.

Impedir males maiores

As propostas de alteração dos deputados comunistas à proposta de lei (N.º 216/X) do Governo de revisão do Código do Trabalho, cujo debate na especialidade teve início anteontem, abrangem matérias da maior relevância. Entre tantas outras, destaque para a maternidade e paternidade, a contratação a termo, o trabalho a tempo parcial, o despedimento colectivo, as comissões de trabalhadores, os direitos sindicais, a contratação colectiva, a greve ou a questão do princípio do tratamento mais favorável.
É a síntese dos fundamentos de algumas dessas propostas da autoria do PCP, dadas a conhecer na passada semana, que deixamos à reflexão do leitor.

Princípio do tratamento mais favorável


O diploma governamental prevê que as convenções colectivas de trabalho e os contratos individuais de trabalho apenas poderão afastar-se do previsto na lei, desde que em sentido mais favorável ao trabalhador, em 14 matérias. Em todas as outras, convenções e contratos poderão dispor diferentemente, mesmo em sentido negativo.
O PCP retoma a proposta apresentada pelo PS em 2003 sobre o princípio do tratamento mais favorável para o trabalhador, garantindo que a lei geral constitui uma norma mínima e que os instrumentos de regulamentação colectiva de trabalho só poderão conter normas mais favoráveis, o mesmo acontecendo com os contratos individuais de trabalho.

Maternidade e Paternidade

Desmentindo a sua propaganda sobre um alegado reforço dos direitos, o PS corta nos direitos. É o caso, por exemplo, da assistência aos filhos com doenças crónicas, limitando o regime de redução do tempo de trabalho apenas para assistência a filhos até um ano (quando antes não existia qualquer limitação). Mantém, por outro lado, a licença por maternidade paga a 80% no caso de licença por 150 dias (aumentando apenas em 3% no caso do gozo em exclusivo de 30 dias adicionais pelo pai) e elimina a licença em situação de riscos específicos durante a gravidez, bem como a partilha da licença por decisão conjunta dos pais.
O PCP propõe uma licença por maternidade por 150 dias pagos a 100% da remuneração, a licença por riscos específicos paga a 100% da remuneração, uma licença em caso de nado-morto de 90 dias, paga a 100%, uma licença especial para acompanhamento da criança em caso de internamento hospitalar desta imediatamente após o parto, nomeadamente quando se trate de crianças prematuras, com duração igual à do internamento, suspendendo-se o decurso do prazo da licença por maternidade, reporá a possibilidade de partilha da licença por decisão conjunta, o aumento da dispensa de 3 para 5 faltas para acompanhamento pelo pai às consultas pré-natal e reporá a possibilidade de redução do tempo de trabalho para assistência a filho com doença crónica, independentemente da idade.

Período experimental

O Governo propõe a alteração do período experimental para 180 dias para a generalidade dos trabalhadores, permitindo assim que neste prazo os trabalhadores possam ser livremente despedidos, sem direito a quaisquer compensações ou indemnizações ou aviso prévio.
O PCP propõe uma duração do período experimental de 60 dias para a generalidade dos trabalhadores, de 90 para os que exerçam cargos de confiança técnica, elevado grau de responsabilidade ou funções de confiança e de 180 dias para pessoal de direcção e quadros superiores.

Contratação a termo

O Governo fala de combate à precariedade e à falsa contratação a termo. Todavia, a única alteração que propõe nesta matéria, embora positiva, é de alcance reduzido.
O PCP define na sua proposta a restrição das possibilidades de contratação a termo através da fixação de um elenco taxativo dos seus fundamentos mais reduzido do que o actualmente existente.

Trabalho a tempo parcial

O Governo do PS propõe que seja considerado trabalho a tempo parcial todo aquele que não corresponda à totalidade do horário de trabalho, com a consequente redução do salário, permitindo ao patronado reduzir os tempos de trabalho para horários muito próximos do tempo completo, sem ter que pagar a retribuição integral.
O PCP avança com a alteração desta norma garantindo que só é trabalho a tempo parcial, aquele que corresponder a 75% ou menos do tempo completo, repondo simultaneamente a norma que impõe o limite de três anos ao acordo de trabalho a tempo parcial.

Trabalho intermitente

O Governo cria uma figura jurídica que permite que as entidades patronais recorram a um trabalhador durante todo o ano, nos meses em que entenderem, pagando apenas a remuneração por inteiro nos meses de trabalho a tempo completo (pelo menos 6 meses consecutivos), pagando apenas 20% do salário nos tempos de inactividade (sendo que o vínculo permanece), prejudicando o trabalhador no salário, nos subsídios de férias e de Natal, não tendo o trabalhador sequer direito a subsídio de desemprego.
O PCP propõe a eliminação destes artigos que apenas servem para aumentar a precariedade.

Trabalho temporário

O Governo do PS concretiza a sua posição relativamente à precariedade, introduzindo um novo capítulo no Código do Trabalho: o trabalho temporário. Esta forma de trabalho tem servido essencialmente as aspirações das entidades patronais que contratam através de empresas de trabalho temporário e de vínculos profundamente precários trabalhadores para desempenharem tarefas permanentes.
O PCP rejeita a introdução desta forma precária de contratação no Código do Trabalho e propõe a eliminação de todo o capítulo.

Duração e organização dos tempos de trabalho

O Governo propõe a total desregulamentação dos horários de trabalho criando novas figuras – a adaptabilidade grupal (art.º 206º), o banco de horas (art.º 207º) e os horários concentrados (art.º 208º), que visam colocar na esfera da entidade patronal a determinação dos tempos de trabalho, impondo a possibilidade do alargamento da jornada de trabalho diária até 12 horas (4 horas por dia) e da jornada de trabalho semanal até 60 horas. As horas de trabalho a mais deixarão de ser pagas como trabalho suplementar ou extraordinário.
O PCP propõe a eliminação destes artigos, bem como a eliminação do regime de adaptabilidade, quer individual, quer colectivamente acordada. Propõe ainda a redução progressiva da jornada de trabalho semanal para 35 horas, o reconhecimento do carácter excepcional do trabalho nocturno e sua fixação no período compreendido entre as 20 e as 7 horas (e não entre as 22 horas e as 7) e a garantia de dois dias de descanso semanal obrigatório.

Cessação do contrato de trabalho
Simplificação do processo disciplinar


O Governo propõe a simplificação do processo disciplinar, por forma a tornar o processo de despedimento mais fácil. Por outro lado, agrava o regime existente, criando uma nova figura – a irregularidade do despedimento – que determina a redução da indemnização em metade (artigo 387º, n.º2), e reduz de uma forma injustificada de 1 ano para 60 dias (art. 386º, n.º 2), a acção de impugnação de despedimento.
O PCP propõe a reposição do prazo de impugnação em um ano, a alteração do regime de cessação do contrato de trabalho, atribuindo exclusivamente ao trabalhador a decisão sobre a reintegração ou não na empresa em caso de despedimento ilícito, e a obrigatoriedade da instrução no processo disciplinar.

Despedimento colectivo e por extinção do posto de trabalho

O Governo do PS introduz uma norma que visa reduzir os prazos de aviso prévio em caso de despedimento colectivo e por extinção do posto de trabalho, discriminando os trabalhadores em função da sua antiguidade na empresa, reduzindo os prazos consoante for menor a antiguidade.
Esta é uma distinção entre trabalhadores que não faz qualquer sentido, na perspectiva do PCP, que acusa o Governo de recorrer a esta norma apenas para prejudicar os trabalhadores com menos antiguidade. Por isso a sua proposta de instituir o aviso prévio idêntico de 60 dias para todos os trabalhadores.

Comissões de Trabalhadores

O Governo do PS, na linha do ataque às comissões de trabalhadores encetado com o Código do PSD/CDS-PP, agrava os direitos que lhes são reconhecidos, em contradição, inclusive, com as propostas apresentadas enquanto oposição.
O PCP defende a eliminação da exigência da indicação do número de trabalhadores que participam nas reuniões, bem como a elaboração de proposta formal de serviços mínimos. Propõe ainda, em respeito pelas reivindicações das comissões de trabalhadores pela Lei n.º46/79, de 12 de Setembro (Lei das Comissões de Trabalhadores), entretanto revogada pelo Código do Trabalho, o aumento do número de membros das comissões por empresa, o aumento do crédito de horas das comissões (de 25 para 40) e das comissões coordenadoras (de 20 para 50), bem como a reposição da exigência da subscrição de apenas 10% dos trabalhadores para a apresentação de listas e convocação de actos eleitorais.

Direitos sindicais – conceito de delegado sindical

O Governo do PS introduz, como conceito no âmbito do direito de associação, a definição de delegado sindical (até agora inexistente), assim interferindo de uma forma inaceitável na autonomia administrativa e estatutária das associações sindicais.
O objectivo é limitar a actividade dos delegados sindicais à empresa ou estabelecimento, dando resposta à velha aspiração patronal de afastar os delegados sindicais que dinamizam a actividade sindical nos vários locais de trabalho
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O PCP propõe a alteração desta alínea, garantindo aos delegados sindicais, expressamente, o direito de acção sindical dentro e fora da empresa.

Cobrança de quotas sindicais

O Governo apresenta uma alteração ao sistema de cobrança e envio de quotas sindicais, eliminando a obrigação legal da entidade patronal proceder à dedução do valor da quota sindical na retribuição do trabalhador.
O PCP propõe a alteração deste artigo, repondo a actual obrigação legal de cobrança e envio de quotas definida mediante convenção colectiva ou declaração do trabalhador.

Contratação colectiva
A escolha da convenção aplicável


O Governo do PS, subvertendo o artigo constitucional (56.º) que determina que «compete às associações sindicais o direito de contratação colectiva», concretiza por via de lei a exigência do patronato do fomento da desfiliação sindical. Com efeito, abre a possibilidade de reconhecer ao trabalhador sem filiação sindical o direito de escolher a convenção colectiva ou decisão arbitral (art.º 495.º) que lhe será aplicável no âmbito da respectiva empresa. Trata-se de prosseguir a via do desincentivo à actividade sindical, atacando os direitos e liberdades sindicais e enfraquecendo as estruturas representativas dos trabalhadores.
O PCP pugna pela eliminação das disposições que possibilitam a adesão individual dos trabalhadores a convenções colectivas e a sua extensão a áreas não cobertas pela negociação mesmo que existam associações sindicais e patronais representativas dessa área.

Caducidade

Já no art. 499.º e artigo 9.º da Lei Preambular, o Governo propõe a caducidade, na data da entrada em vigor do novo Código, de todas as convenções colectivas de trabalho que contenham «cláusula que faça depender a cessação da sua vigência de substituição por outro instrumento de regulamentação colectiva de trabalho», enumerando de seguida os factos determinantes da caducidade. Assim, não só não cumpre o prometido como agrava, e muito, o regime actualmente vigente.
O PCP preconiza a alteração das normas que regulam a caducidade, estabelecendo que os instrumentos de regulamentação colectiva de trabalho só caducam quando forem substituídos por outros e que não poderão conter normas menos favoráveis para o trabalhador.
Defende igualmente a eliminação da arbitragem obrigatória garantindo que as convenções colectivas dependem, exclusivamente, da negociação entre associações patronais e sindicais.

Greve

O Governo, além de manter as normas negativas que limitam, em muito, o recurso à greve, propõe ainda a instituição da regra do precedente na definição de serviços mínimos em greves «idênticas». (art.º 536.º)
O PCP advoga a alteração desta secção, garantindo efectivamente o exercício do direito à greve, nomeadamente através da alteração do regime dos serviços mínimos cabendo a quem convoca a greve a definição dos serviços necessários à segurança do equipamento e instalações e a definição dos serviços mínimos a prestar, garantindo aos representantes dos trabalhadores a designação dos trabalhadores adstritos à prestação dos serviços mínimos e diminuindo o elenco das necessidades sociais impreteríveis e alterando o prazo de pré-aviso de 10 dias úteis para 4 dias.