a crise social e o aumento dos combustíveis
É inadiável adoptar medidas de apoio
O Secretário-geral do PCP considerou claramente insuficientes as medidas do Governo para enfrentar o agravamento insuportável dos preços dos combustíveis, exigindo respostas de natureza diversa e de mais largo alcance. «Uma situação excepcional» como é esta , «deveria obrigar a medidas excepcionais», sustentou Jerónimo de Sousa.
Uma situação excepcional exige medidas excepcionais
Esta posição do dirigente comunista foi assumida na passada semana no Parlamento no decurso do debate quinzenal com o primeiro-ministro, onde o aumento dos combustíveis e o aprofundar da crise social voltaram ser os temas fortes que dominaram a atenção dos deputados.
Depois de estas questões terem sido introduzidas pelo BE, a quem coube pela primeira vez ao abrigo do novo Regimento escolher os temas e abrir o debate, Jerónimo de Sousa, pegando no assunto dos combustíveis, referiu-se ao facto de o País estar à espera há várias semanas do relatório de uma entidade que devia fazer, tal como o Governo, um acompanhamento diário do sector.
E a pergunta que formulou foi no sentido de saber se era preciso tanto tempo para apurar «aquilo que era obrigação saber-se diariamente». O dirigente do PCP pediu também ao chefe do Governo para explicar a posição do ministro da Economia que diz, mesmo antes de se saber o resultado do relatório, que o Governo não vai intervir no preço dos combustíveis. «Então se não quer fazer nada por que é que pediu o relatório?», foi a pergunta deixada pelo Secretário-geral do PCP, que não deixou de estranhar como é que havendo especulação, ao que tudo indica, pode o Governo deixar de intervir.
Situação inquietante
José Sócrates, na resposta, procurando iludir o ponto nodal da questão colocada, referiu que o relatório pedido à Autoridade da Concorrência é sobre concorrência e que será em função dele que o Governo tomará medidas, isto «se acaso o relatório comprovar que há algumas medidas a tomar para melhorar a concorrência». Escudou-se ainda no facto de esta ser uma autoridade administrativa independente a quem, assegurou, «o Governo não dá ordens quanto a prazos».
Sócrates sugeriu assim haver uma diferença substantiva entre concorrência e preços, mistificando deliberadamente a questão, como se não houvesse correlação entre ambos.
Sobre a citada declaração do ministro da Economia o chefe do Executivo nada disse, o que levou Jerónimo, na réplica, a fazer-lhe notar que a explicação por si dada só comprova que o Governo não quer nem vai intervir nos preços.
Mas independentemente deste facto, o importante mesmo, na perspectiva do líder comunista, é o que classificou de «situação excepcionalmente inquietante» em relação ao preços dos combustíveis. «E uma situação excepcional deveria obrigar a medidas excepcionais», sublinhou, considerando que não podemos continuar a assistir à «destruição dos nossos sectores produtivos nem à transferência para as populações do peso dos aumentos dos bens alimentares que resultam do aumento do preços dos combustíveis».
Agricultura e pescas
A situação dramática actual, designadamente no sector das pescas e no sector da agricultura, torna ainda «inadiável», na perspectiva de Jerónimo de Sousa, tal como acontece em Espanha e França, «um reforço da ajuda para o gasóleo verde».
A este propósito recordou ao primeiro-ministro que quando entrou para o Governo o gasóleo para as pescas se situava nos 30 cêntimos, elevando-se hoje, passados três anos, aos 83 cêntimos, com todas as consequências daí decorrentes. Uma situação bem diversa do que se passa em França, onde, exemplificou, o gasóleo para as pescas custa 70 cêntimos e o sector reivindica 40.
Quanto à criação do gasóleo profissional a partir de Julho, medida agora anunciada pelo Governo e destinada ao transporte colectivo de passageiros, o líder comunista afirmou o acordo do PCP quanto a tal medida, mas observou que não se pode ficar por aqui e que é preciso alargar no imediato esta medida aos taxistas, às pequenas empresas de transporte de mercadorias.
Porque o problema – sublinhou, dirigindo-se a Sócrates – é que ouvindo o ministro da Agricultura fica-se com a ideia de que a solução para as dificuldades é remetida para o que apelidam de «reformas estruturantes». Ora, perante a gravidade da situação, esse não é o caminho, advertiu Jerónimo estabelecendo metaforicamente a comparação com «alguém que, precisando de ser operado com urgência, carece em absoluto de oxigénio». Por isso, explicou, quando os comunistas apelam à adopção de medidas urgentes e excepcionais fazem-no porque é sua convicção de que só assim se consegue defender os nossos sectores produtivos.
Oferecer o garrote
«Vai continuar a adiar estas medidas inadiáveis?», foi a pergunta formulada ao chefe do Governo que, na réplica, reconheceu que a situação é de facto excepcional mas deu-se por contente com as medidas por si tomadas e anunciadas ao País na passada semana.
E repetiu tudo o que já tinha dito antes. Que as medidas tomadas pelo seu Governo são dirigidas para apoiar os sectores mais vulneráveis, as famílias do primeiro e segundo escalão, que, enfatizou, terão o maior aumento de abono de família desde o 25 de Abril. Como se a valorização desta prestação social, por maior que seja, possa suprir as extremas dificuldades que se deparam às famílias.
Ficou assim claro que para Sócrates as medidas de apoio por si tomadas são mais que suficientes, recusando qualquer cenário de intervenção no preço dos combustíveis. Porque isso significaria, justificou, «pôr o dinheiro de todos os portugueses em jogo».
A única ajuda que admitiu estar disponível para dar é aos pescadores e agricultores mas sob a forma de linhas de crédito às suas empresas com vista à respectiva reestruturação.
Reagindo a esta facilitação de acesso ao crédito aos agricultores e pescadores, o Secretário-geral do PCP foi contundente: «é não perceber que as pessoas já estão com o garrote no pescoço e que aquilo que o Governo lhes oferece é mais garrote».
Empobrecer a trabalhar
Outro tema abordado por Jerónimo de Sousa no debate com o primeiro-ministro foi o da ajuda social. Confessou ficar «profundamente inquieto» por constatar que «um primeiro-ministro de um governo da República» possa ter uma percepção tão distorcida «da situação social hoje existente no País».
É que o Governo, sublinhou, tem vindo a «tirar nos salários, nas reformas, nos pequenos rendimentos para dar umas migalhas aos pobres». E foi este quadro em que «os pobres continuam pobres» que levou o dirigente do PCP a acusar José Sócrates de «não repartir a riqueza produzida mas sim repartir a pobreza, entre os pobres e os que pouco têm.
«Esse é que é o problema», frisou, considerando que é por isso que em Portugal, hoje, se empobrece a trabalhar. Um terço dos pobres são aqueles que têm vínculos precários, estão no desemprego ou têm salários baixos. E é por isso também que outro terço dos pobres é constituído por reformados, com pensões de miséria.
«Ora a pobreza combate-se, designadamente, com a revalorização dos salários e pensões», enfatizou o líder comunista, fazendo notar que tal medida é tanto mais necessária quanto é sabido que a inflação está muito acima do previsto e que o custo de vida não tem parado de aumentar.
«Não acha que uma medida de fundo seria a revalorização das pensões e salários?», perguntou, interpelando o chefe do Governo, a quem avisou que se nada fizer a «pobreza continuará a aumentar».
Fortunas intocáveis
Sócrates, em vez de responder de forma directa e numa leitura enviesada ao que acabara de ouvir, recorreu à retórica para, empertigado, questionar se acaso os aumentos do abono de família poderiam ser vistos como «migalhas». E foi buscar o aumento do salário mínimo para o elevar a coroa de glória do seu governo, dizendo que nenhum outro antes fora tão longe na sua valorização.
Jerónimo, a concluir, virando-se para Sócrates, acusou-o de proferir um discurso que «soa a falso». E explicou porquê. «Porque se confronta com a realidade, em primeiro lugar, e, em segundo, porque nunca referiu um elemento: a razão pela qual as grande fortunas aumentaram 36 por cento e continuam intocáveis na sociedade portuguesa. Para Jerónimo, «isto demonstra a opção de classe que o Governo tomou, prejudicando quem trabalha, as reformas e pensões, os rendimentos dos pequenos e médios empresários».
«Fale lá das medidas que tomou em relação à especulação bolsista, em relação aos lucros gananciosos, em relação aos dividendos dos administradores das grandes empresas»?, desafiou Jerónimo de Sousa, antes de deixar uma advertência ao Governo: «está a praticar uma política profundamente injusta e, porque não vê essa realidade, mais cedo que tarde há-de vê-la da pior forma».
Depois de estas questões terem sido introduzidas pelo BE, a quem coube pela primeira vez ao abrigo do novo Regimento escolher os temas e abrir o debate, Jerónimo de Sousa, pegando no assunto dos combustíveis, referiu-se ao facto de o País estar à espera há várias semanas do relatório de uma entidade que devia fazer, tal como o Governo, um acompanhamento diário do sector.
E a pergunta que formulou foi no sentido de saber se era preciso tanto tempo para apurar «aquilo que era obrigação saber-se diariamente». O dirigente do PCP pediu também ao chefe do Governo para explicar a posição do ministro da Economia que diz, mesmo antes de se saber o resultado do relatório, que o Governo não vai intervir no preço dos combustíveis. «Então se não quer fazer nada por que é que pediu o relatório?», foi a pergunta deixada pelo Secretário-geral do PCP, que não deixou de estranhar como é que havendo especulação, ao que tudo indica, pode o Governo deixar de intervir.
Situação inquietante
José Sócrates, na resposta, procurando iludir o ponto nodal da questão colocada, referiu que o relatório pedido à Autoridade da Concorrência é sobre concorrência e que será em função dele que o Governo tomará medidas, isto «se acaso o relatório comprovar que há algumas medidas a tomar para melhorar a concorrência». Escudou-se ainda no facto de esta ser uma autoridade administrativa independente a quem, assegurou, «o Governo não dá ordens quanto a prazos».
Sócrates sugeriu assim haver uma diferença substantiva entre concorrência e preços, mistificando deliberadamente a questão, como se não houvesse correlação entre ambos.
Sobre a citada declaração do ministro da Economia o chefe do Executivo nada disse, o que levou Jerónimo, na réplica, a fazer-lhe notar que a explicação por si dada só comprova que o Governo não quer nem vai intervir nos preços.
Mas independentemente deste facto, o importante mesmo, na perspectiva do líder comunista, é o que classificou de «situação excepcionalmente inquietante» em relação ao preços dos combustíveis. «E uma situação excepcional deveria obrigar a medidas excepcionais», sublinhou, considerando que não podemos continuar a assistir à «destruição dos nossos sectores produtivos nem à transferência para as populações do peso dos aumentos dos bens alimentares que resultam do aumento do preços dos combustíveis».
Agricultura e pescas
A situação dramática actual, designadamente no sector das pescas e no sector da agricultura, torna ainda «inadiável», na perspectiva de Jerónimo de Sousa, tal como acontece em Espanha e França, «um reforço da ajuda para o gasóleo verde».
A este propósito recordou ao primeiro-ministro que quando entrou para o Governo o gasóleo para as pescas se situava nos 30 cêntimos, elevando-se hoje, passados três anos, aos 83 cêntimos, com todas as consequências daí decorrentes. Uma situação bem diversa do que se passa em França, onde, exemplificou, o gasóleo para as pescas custa 70 cêntimos e o sector reivindica 40.
Quanto à criação do gasóleo profissional a partir de Julho, medida agora anunciada pelo Governo e destinada ao transporte colectivo de passageiros, o líder comunista afirmou o acordo do PCP quanto a tal medida, mas observou que não se pode ficar por aqui e que é preciso alargar no imediato esta medida aos taxistas, às pequenas empresas de transporte de mercadorias.
Porque o problema – sublinhou, dirigindo-se a Sócrates – é que ouvindo o ministro da Agricultura fica-se com a ideia de que a solução para as dificuldades é remetida para o que apelidam de «reformas estruturantes». Ora, perante a gravidade da situação, esse não é o caminho, advertiu Jerónimo estabelecendo metaforicamente a comparação com «alguém que, precisando de ser operado com urgência, carece em absoluto de oxigénio». Por isso, explicou, quando os comunistas apelam à adopção de medidas urgentes e excepcionais fazem-no porque é sua convicção de que só assim se consegue defender os nossos sectores produtivos.
Oferecer o garrote
«Vai continuar a adiar estas medidas inadiáveis?», foi a pergunta formulada ao chefe do Governo que, na réplica, reconheceu que a situação é de facto excepcional mas deu-se por contente com as medidas por si tomadas e anunciadas ao País na passada semana.
E repetiu tudo o que já tinha dito antes. Que as medidas tomadas pelo seu Governo são dirigidas para apoiar os sectores mais vulneráveis, as famílias do primeiro e segundo escalão, que, enfatizou, terão o maior aumento de abono de família desde o 25 de Abril. Como se a valorização desta prestação social, por maior que seja, possa suprir as extremas dificuldades que se deparam às famílias.
Ficou assim claro que para Sócrates as medidas de apoio por si tomadas são mais que suficientes, recusando qualquer cenário de intervenção no preço dos combustíveis. Porque isso significaria, justificou, «pôr o dinheiro de todos os portugueses em jogo».
A única ajuda que admitiu estar disponível para dar é aos pescadores e agricultores mas sob a forma de linhas de crédito às suas empresas com vista à respectiva reestruturação.
Reagindo a esta facilitação de acesso ao crédito aos agricultores e pescadores, o Secretário-geral do PCP foi contundente: «é não perceber que as pessoas já estão com o garrote no pescoço e que aquilo que o Governo lhes oferece é mais garrote».
Empobrecer a trabalhar
Outro tema abordado por Jerónimo de Sousa no debate com o primeiro-ministro foi o da ajuda social. Confessou ficar «profundamente inquieto» por constatar que «um primeiro-ministro de um governo da República» possa ter uma percepção tão distorcida «da situação social hoje existente no País».
É que o Governo, sublinhou, tem vindo a «tirar nos salários, nas reformas, nos pequenos rendimentos para dar umas migalhas aos pobres». E foi este quadro em que «os pobres continuam pobres» que levou o dirigente do PCP a acusar José Sócrates de «não repartir a riqueza produzida mas sim repartir a pobreza, entre os pobres e os que pouco têm.
«Esse é que é o problema», frisou, considerando que é por isso que em Portugal, hoje, se empobrece a trabalhar. Um terço dos pobres são aqueles que têm vínculos precários, estão no desemprego ou têm salários baixos. E é por isso também que outro terço dos pobres é constituído por reformados, com pensões de miséria.
«Ora a pobreza combate-se, designadamente, com a revalorização dos salários e pensões», enfatizou o líder comunista, fazendo notar que tal medida é tanto mais necessária quanto é sabido que a inflação está muito acima do previsto e que o custo de vida não tem parado de aumentar.
«Não acha que uma medida de fundo seria a revalorização das pensões e salários?», perguntou, interpelando o chefe do Governo, a quem avisou que se nada fizer a «pobreza continuará a aumentar».
Fortunas intocáveis
Sócrates, em vez de responder de forma directa e numa leitura enviesada ao que acabara de ouvir, recorreu à retórica para, empertigado, questionar se acaso os aumentos do abono de família poderiam ser vistos como «migalhas». E foi buscar o aumento do salário mínimo para o elevar a coroa de glória do seu governo, dizendo que nenhum outro antes fora tão longe na sua valorização.
Jerónimo, a concluir, virando-se para Sócrates, acusou-o de proferir um discurso que «soa a falso». E explicou porquê. «Porque se confronta com a realidade, em primeiro lugar, e, em segundo, porque nunca referiu um elemento: a razão pela qual as grande fortunas aumentaram 36 por cento e continuam intocáveis na sociedade portuguesa. Para Jerónimo, «isto demonstra a opção de classe que o Governo tomou, prejudicando quem trabalha, as reformas e pensões, os rendimentos dos pequenos e médios empresários».
«Fale lá das medidas que tomou em relação à especulação bolsista, em relação aos lucros gananciosos, em relação aos dividendos dos administradores das grandes empresas»?, desafiou Jerónimo de Sousa, antes de deixar uma advertência ao Governo: «está a praticar uma política profundamente injusta e, porque não vê essa realidade, mais cedo que tarde há-de vê-la da pior forma».