Das fibras ópticas em vez do cobre

Francisco Silva
Quando se fala que as fibras ópticas vão substituir os pares de cobre dos velhos acessos do telefone fixo, os tecnófilos ficam logo a salivar – desculpem a instintiva metáfora, mesmo achando eu que os cães são dignos membros do reino animal, desculpe o leitor se sentir que esta é uma indignidade de fazer protestar: «mas uma coisa são os homens (as mulheres?), outra são os animais» – ou, pronto, ficam a pensar em capacidades de transmissão multiplicadas por 10, por 100, por 1000, sei lá por quantas ordens de grandeza. Acabam-se os engarrafamentos na net, far-se-ão downloads quase instantâneos de vídeo, de filmes, a qualidade da imagem, a alta definição, restituir-nos-á a própria realidade, etc.. De tão habituados a olhar só para o arredor mais próximo do seu terminal, do seu computador, os utilizadores esquecem com frequência haver mais vida, ou mais rede, para lá dos acessos dos utilizadores aos nós daquela, às centrais que os servem; e, por outro lado, esquecem também as limitações próprias dos servidores que lhes disponibilizam os conteúdos. Sim. Mas demos de barato as vantagens das fibras ópticas em termos de maiores capacidades de transmissão nos acessos dos utilizadores.
O que quem está de fora, quem acha não ter de pensar como as coisas são e vão ser – pois só tem que alugar as coisas e utilizá-las, e sem os utilizadores, o autor destas linhas bem o sabe, a rede não seria necessária para nada – esses, certamente não imaginarão é o decorrente impacto territorial, de traçados para os cabos de fibras ópticas, das condutas, de edifícios, dos rearranjos intensos e extensos a que a tecnologia das fibras ópticas conduzirá nas áreas locais, nas áreas de central, como também é costume designá-las em linguagem profissional de quem trabalha, ou trabalhou, nas telecomunicações.
(Para os menos informados destas coisas, deve ser referido que noutras zonas da rede, nas zonas de interligação regional, interurbana, internacional / intercontinental, já há bastante tempo que as fibras ópticas são a solução «normal» para as artérias de transmissão.)

Será que…?

Ora, o certo é as linhas em fibras ópticas enfraquecerem muito menos os sinais de telecomunicações do que as ligações em pares de cobre. Mais. As diferenças entre as características de enfraquecimento dos sinais que cursam as linhas de fibra ópticas de ponta a ponta do acesso local de utilizador (da sua casa até à central) permitem larguras de banda – com atenuações aceitáveis – de ordens de grandeza superiores às mais eficientes soluções conhecidas para o cobre (a família dos sistemas xDSL, nomeadamente para além do popular ADSL, a solução para maiores velocidades VDSL).
Dos reduzidos enfraquecimentos dos sinais conseguidos com o emprego de fibras ópticas decorre que as extensões permitidas para os acessos locais serão bem maiores do que são as extensões dos acessos locais realizados em pares de cobre. O resultado do emprego de cabos de fibras ópticas será o aumento médio coberto por cada área de central – cada uma das novas áreas poderá corresponder a várias das antigas áreas. Este facto conduzirá à necessidade de um planeamento das novas áreas locais disruptivo relativamente à situação que levou tantas décadas a consolidar. Pensarão os leitores: Ah, se forem espertos, tanto quanto possível os operadores detentores das infra-estruturas tenderão a aproveitar as existentes em termos quer de edifícios quer de condutas; até poderão vender os edifícios sobrantes. Serão muitas as vantagens. Pensarão outros leitores: Ena pai, o que para aí vai de construção de novas condutas para confluir nas novas supercentrais, vai ser um desassossego terrível para o trânsito!
Outra questão que já anda também no ar: operadores «incumbentes» financeiramente mais poderosos entrarão noutros países para estabelecer infra-estruturas alternativas às dos incumbentes. Viva a concorrência! Talvez, quem sabe? E poderá vir a haver novas áreas de supercentrais consoante as redes de cada operadora! Alto lá. Onde já vai isso. Até nas redes móveis, nomeadamente a partir da 3G, já se está a querer andar no sentido de infra-estruturas partilhadas…
O que se perfila, pois, são investimentos enormes e projectos exigindo imensos recursos humanos superqualificados e coordenações pesadas – superprogramas à vista? Será que ainda nos vamos rir muito, ou chorar, quando os recursos públicos e as participações dos estados, incluindo o tão invocado dinheiro dos contribuintes, forem novamente trazidos à baila?


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