Intervenção de José Casanova
no funeral de Rogério Ribeiro

Até amanhã, Camarada!

Umas breves palavras para deixar ao Rogério a nossa imensa saudade, o nosso imenso adeus de amizade, admiração e camaradagem.
A amizade pelo homem sempre de braços abertos à solidariedade, à lealdade, à fraternidade; sempre disponível para o gesto solícito a transbordar de ternura; sempre protagonista activo da partilha de valores, de referências, de sonhos, de afectos de que é feita a nossa condição de comunistas, de homens que acreditam, e por isso lutam, por uma sociedade livre, justa, solidária, fraterna, pacífica.
A admiração pelo artista - figura maior da arte e da cultura portuguesas, artista em movimento perpétuo que atravessou a vida a desenhar e a pintar, o que lhe era tão essencial como o bater do coração ou o respirar o vento das lutas que vão construindo o homem, lutas que animavam a sua mão prodigiosa, inventando a realidade de paisagens naturais e humanas que preenchem algumas das páginas mais sublimes da história de arte portuguesa - designadamente enquanto personalidade marcante do movimento neo-realista, a cuja génese o Rogério se referiu nestes termos: «Houve um sentimento profundo que atravessou o homem, um pouco por todo o mundo, um sentimento pleno e sensível onde se reflectiram e convergiram duma forma idêntica os desejos, os sonhos, as lutas, que de todos os continentes se anunciavam numa vontade que conquistou o canto e a voz de milhares e milhares de homens numa determinação de ganhar a paz necessária ao refazer do mundo (...) escritores, poetas, operários, camponeses, estudantes, homens e mulheres, como uma imensa mola disparavam para o futuro, mau grado as condições de repressão arbitrária, mau grado a censura, a violência, e a miséria. É neste barco que viaja uma grande e incontida esperança que os poetas cantam, que os músicos como que a anunciam, que os escritores denunciando-a abrem ao mundo, que os pintores descobrem uma outra natureza em si próprios... que uma grande onda de solidariedade invade o mundo» - esse movimento de que ele foi personalidade destacada.
A camaradagem nascida e crescida ao longo de muitos e muitos anos de lutas, de resistências sempre que elas eram necessárias e fosse qual fosse a situação vivida, de sonhos e anseios comuns, de derrotas e de vitórias, de tristezas e de alegrias, de êxitos e de inêxitos, mas sempre, sempre de convicções inabaláveis no ideal comunista, fonte de força essencial na nossa luta de todos os dias, raiz de capacidades de resistência incomensuráveis, nascente inesgotável de confiança no futuro, na construção de uma sociedade nova, liberta de todas as formas de opressão e de exploração.
Guardaremos para sempre nas nossas memórias, e na história partidária, a militância do Rogério: o seu contributo valiosíssimo para a construção da monumental e fascinante exposição sobre o 60.º aniversário do PCP; a sua intervenção inestimável enquanto construtor dessa enorme obra colectiva que é a Festa do Avante!; a sua intervenção, enquanto militante e dirigente comunista, no debate partidário - caminho certo para a construção das orientações e linhas de acção próprias de um partido como é o nosso Partido Comunista Português.
E recordaremos como imagem impressiva e inapagável a sua presença na sessão em que, no Centro de Trabalho Vitória, ao lado do Álvaro, ofereceu ao Partido as ilustrações para o «Até Amanhã, Camaradas»: era o Rogério a contar-nos a forma como aquele romance o havia ajudado a situar-se, após o 25 de Abril, e a entender a maneira como poderia ser mais útil aos seus ideais e dar continuidade à sua participação - a emoção e as lágrimas incontidas tolhendo-lhe a voz e revelando a enorme dimensão humana e revolucionária presente em toda a sua vida e Obra, desde o seu primeiro desenho até a esse hino à mulher e à luta que é o Monumento à Mulher Alentejana.
Até amanhã, camarada Rogério Ribeiro.


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