A des(actualização) das pensões de reforma
Há cerca de um ano o PS aprovou, na Assembleia da República, as Bases Gerais do Sistema de Segurança Social, de que resultou a Lei 4/2007, publicada em Diário da Republica, em 16/1/2007. Esta lei contém 110 artigos, num dos quais é possível ler que a mesma tem como objectivo «promover a melhoria sustentada das condições e dos níveis de protecção social e o reforço da respectiva equidade».
No mesmo dia foi também aprovada a Lei 53-B/2006 que criou o Indexante dos Apoios Sociais (IAS), novas regras de actualização das pensões e outras prestações sociais cujos objectivos contrariam o princípio programático atrás referido, pelo que é oportuno recordar que, no dia 14/12/2006, na Assembleia da Republica, o PS, por via das suas reiteradas piruetas políticas, aprovou «uma coisa» e o «seu contrário», postura que tipifica bem quem, simultaneamente, pratica o programa da direita e se declara, palavrosamente, socialista.
Para se perceber o antagonismo de «uma coisa» e do «seu contrário» nada melhor do que escalpelizar a norma que assegura as actualizações das pensões e reformas.
Pois bem, com esta lei as pensões mínimas deixaram de estar relacionadas com o valor do salário mínimo nacional e passaram a estar relacionadas com uma outra coisa designada de Indexante dos Apoios Sociais (IAS). Chegados aqui poder-se-á perguntar: então a mudança é só de natureza semântica, ou vai para além disso?
Infelizmente o IAS não vai para além disso, fica aquém disso, ou seja, estabeleceu um referencial inferior ao salário mínimo, pelo que, quando se estabelecem as actualizações o resultado determina pensões mais baixas.
Com efeito, em 2008, enquanto a salário mínimo foi fixado em 426 euros, o IAS foi fixado em 407,41 euros, facto que contaria todo e qualquer objectivo tendente a aproximar o valor das pensões mínimas do salário mínimo nacional vigente.
Mas isto é, apenas, uma pequena parte do retrocesso social imposto pelo PS. As situações mais gravosas resultam do facto de as actualizações das pensões (todas elas: mínimas e estatutárias) passarem a estar indexadas a duas variáveis não controladas pelos trabalhadores, ou seja: a inflação e o crescimento da economia, o PIB (o chamado produto interno bruto).
São, pois, estes dois factores que explicam, a par da nova fórmula de cálculo das pensões, a magreza dos recentes aumentos e a magreza dos futuros aumentos. E porquê? Porque o Governo impôs, para efeito da actualização das reformas, uma estrutura em que existem 4 escalões de rendimentos e 3 escalões no que concerne ao crescimento da economia (produto interno bruto).
Os escalões de rendimentos são os seguintes:
– primeiro escalão (igual ou inferior a 1,5 do IAS; actualmente corresponde a 611,11 euros);
– segundo escalão (entre 1,5 e 6 vezes o IAS; actualmente corresponde entre 611,11 euros e 2444,46 euros);
– terceiro escalão (superior a 6 e inferior a 12 vezes o IAS; actualmente corresponde entre 2444,46 euros e 4888,92 euros);
– quarto escalão (igual ou superior a 12 vezes o IAS; actualmente corresponde a 4888,92 euros).
Os escalões relativos ao crescimento da economia são os seguintes:
– igual ou superior a 3%;
– igual ou superior a 2 e inferior a 3%;
– inferior a 2%.
Correlacionando tudo isto vejamos, então, como se processa a degradação das pensões em função do crescimento da economia, da taxa de inflação e das respectivas indexações aos escalões de rendimentos. Assim:
1º. O produto interno bruto cresce a um valor igual ou superior a 3%.
Neste caso:
– as pensões balizadas entre 6 e 12 vezes o IAS (entre 2444,46 e 4888,92 euros) não terão um aumento real dado que as mesmas serão, apenas, actualizadas num valor igual à taxa de inflação;
– as pensões balizadas entre 1,5 e 6 vezes o IAS (entre 611,11 e 2444,46 euros) serão actualizadas na base da inflação, acrescidas de 15% da taxa de crescimento do PIB. Por exemplo: se a inflação for de 2,4% e o PIB crescer 3%, daí decorre uma actualização de 2,85%;
– as pensões iguais ou inferiores a 1,5 vezes o IAS serão actualizadas na base da inflação acrescidas de 20% da taxa de crescimento do PIB. Tendo em atenção os parâmetros atrás referidos a actualização seria de 3%.
2º. O produto interno bruto cresce a um valor igual ou superior a 2% e inferior a 3%.
Neste caso.
– as pensões balizadas entre 6 e 12 vezes o IAS (entre 2444,46 e 4888,92 euros) terão um aumento negativo, ou seja: a actualização corresponderá à taxa de inflação menos 0,25 pontos percentuais;
– as pensões balizadas entre 1,5 e 6 vezes o IAS (entre 611,11 e 2444,46 euros) não terão um aumento real dado que as mesmas serão, apenas, actualizadas num valor igual à taxa de inflação;
– as pensões iguais ou inferiores a 1,5 o IAS serão actualizadas na base da inflação acrescidas de 20% da taxa de crescimento do PIB, com um limite mínimo de 0,5 pontos percentuais. Por exemplo: se a inflação for de 2,4% e o PIB crescer 2,5% daí decorre uma actualização de 2,9%;
3º. O produto interno bruto cresce num valor inferior a 2%
Neste caso:
– as pensões balizadas entre 6 e 12 vezes o IAS (entre 2444,46 e 4888,92 euros) terão um aumento negativo, ou seja: a actualização corresponderá à taxa de inflação menos 0,75 pontos percentuais;
– as pensões balizadas entre 1,5 e 6 vezes o IAS (entre 611,11 e 2444,46 euros) terão um aumento negativo, ou seja: a actualização corresponderá à taxa de inflação menos 0,50 pontos percentuais;
– as pensões iguais ou inferiores a 1,5 o IAS serão actualizadas na base da inflação, pelo que não haverá aumento do poder de compra dos reformados incluídos neste escalão de rendimentos.
Como se vê as actualizações das pensões estão dependentes de três factores: o valor do IAS, a taxa de inflação e o comportamento da economia, na base da evolução do produto interno bruto.
Resumindo:
– se a economia crescer acima dos 3% não haverá crescimento real das pensões para todos aqueles com rendimentos superiores a 2444,46 euros;
– se a economia crescer entre 2% e 3% não haverá crescimento real das pensões para todos aqueles com rendimentos superiores a 611,11 euros;
– se a economia crescer abaixo dos 2% não haverá crescimento real das pensões para ninguém.
Tudo isto conjugado, como desde sempre foi alertado pelo PCP, determinará que o valor das pensões irá diminuir, circunstância que leva os bancos e as seguradoras a esfregar as mãos de contentamento. Com efeito, uma parte dos trabalhadores portugueses ver-se-á obrigada a retirar da sua poupança uma verba destinada à criação de contas poupança-reforma, para bem do capital alheio do sistema financeiro.
Valor das pensões dependente do estrangeiro
Os trabalhadores mais pobres (a grande maioria) estarão sujeitos à evolução da economia, como aconteceu com as recentes actualizações e como acontecerá no futuro. Vamos admitir que num determinado ano as empresas com capitais portugueses tiveram um bom desempenho, produziram bem, exportaram bastante e cabendo aos trabalhadores portugueses uma evolução positiva no índice de produtividade. Vamos, também, admitir que, nesse mesmo ano, as empresas estrangeiras, como a Autoeuropa, a Siemens, a Nestlé, a Continental-Mabor e a Blaupunkt, cujo volume de negócios ultrapassa os 2% do PIB português resolveram abandonar o nosso País e instalarem-se numa outra qualquer região. O que é que aconteceria às nossas reformas? Baixariam, de certeza, tanto mais quanto maior tivesse sido a expressão no PIB português da actividade daquelas empresas no território nacional. Tudo isto para dizer o quê? Para dizer que o Partido Socialista, não contente com a destruição do sector empresarial do Estado nos últimos 30 anos, encetou, desde há dois anos a esta parte, uma outra destruição, essa no âmbito das funções sociais do Estado, indo ao ponto de fazer depender a evolução das nossas pensões daquilo que for a decisão de muitas empresas sediadas em Nova Iorque, Londres, Paris, Berlim e por aí fora.
Já se sabia, desde há muitos anos a esta parte, que muitas das bolsas das cidades atrás referidas tinham (e têm) o poder de decidir das cotações das matérias-primas (sobretudo minérios e produtos agrícolas) dos países economicamente menos desenvolvidos. Com a presente alteração da fórmula de cálculo da actualização das pensões, as multinacionais, pela mão do governo de José Sócrates, passaram a dispor da possibilidade de condicionar as nossas reformas, quer pela via do investimento, quer pela via do desinvestimento, de que a OPEL da Azambuja, e as inúmeras empresas das indústria de vestuário, calçado e cablagens são meros exemplos. Como se já não bastasse os efeitos negativos da «economia de casino» eis como a «economia beduína» pode, pela deslocalização, potenciar a redução das nossas reformas.
Nota: o conteúdo deste artigo destinou-se, apenas, a estabelecer uma correlação da actualização das reformas à evolução da economia, à taxa de inflação e ao valor fixado pelo IAS, ou seja: abordou uma pequena parte do retrocesso imposto pelo PS no que concerne ao sistema público de segurança social. Outros temas, como os prejuízos resultantes do cálculo das pensões quando o trabalhador do activo passa à situação de reformado e o aumento da idade da reforma já foram, anteriormente, abordados no nosso jornal. Um outro tema: as percentagens indexadas ao IAS para efeito de cálculo das pensões mínimas, ainda não divulgado com profundidade, deverá merecer, oportunamente, a nossa atenção.
Para se perceber o antagonismo de «uma coisa» e do «seu contrário» nada melhor do que escalpelizar a norma que assegura as actualizações das pensões e reformas.
Pois bem, com esta lei as pensões mínimas deixaram de estar relacionadas com o valor do salário mínimo nacional e passaram a estar relacionadas com uma outra coisa designada de Indexante dos Apoios Sociais (IAS). Chegados aqui poder-se-á perguntar: então a mudança é só de natureza semântica, ou vai para além disso?
Infelizmente o IAS não vai para além disso, fica aquém disso, ou seja, estabeleceu um referencial inferior ao salário mínimo, pelo que, quando se estabelecem as actualizações o resultado determina pensões mais baixas.
Com efeito, em 2008, enquanto a salário mínimo foi fixado em 426 euros, o IAS foi fixado em 407,41 euros, facto que contaria todo e qualquer objectivo tendente a aproximar o valor das pensões mínimas do salário mínimo nacional vigente.
Mas isto é, apenas, uma pequena parte do retrocesso social imposto pelo PS. As situações mais gravosas resultam do facto de as actualizações das pensões (todas elas: mínimas e estatutárias) passarem a estar indexadas a duas variáveis não controladas pelos trabalhadores, ou seja: a inflação e o crescimento da economia, o PIB (o chamado produto interno bruto).
São, pois, estes dois factores que explicam, a par da nova fórmula de cálculo das pensões, a magreza dos recentes aumentos e a magreza dos futuros aumentos. E porquê? Porque o Governo impôs, para efeito da actualização das reformas, uma estrutura em que existem 4 escalões de rendimentos e 3 escalões no que concerne ao crescimento da economia (produto interno bruto).
Os escalões de rendimentos são os seguintes:
– primeiro escalão (igual ou inferior a 1,5 do IAS; actualmente corresponde a 611,11 euros);
– segundo escalão (entre 1,5 e 6 vezes o IAS; actualmente corresponde entre 611,11 euros e 2444,46 euros);
– terceiro escalão (superior a 6 e inferior a 12 vezes o IAS; actualmente corresponde entre 2444,46 euros e 4888,92 euros);
– quarto escalão (igual ou superior a 12 vezes o IAS; actualmente corresponde a 4888,92 euros).
Os escalões relativos ao crescimento da economia são os seguintes:
– igual ou superior a 3%;
– igual ou superior a 2 e inferior a 3%;
– inferior a 2%.
Correlacionando tudo isto vejamos, então, como se processa a degradação das pensões em função do crescimento da economia, da taxa de inflação e das respectivas indexações aos escalões de rendimentos. Assim:
1º. O produto interno bruto cresce a um valor igual ou superior a 3%.
Neste caso:
– as pensões balizadas entre 6 e 12 vezes o IAS (entre 2444,46 e 4888,92 euros) não terão um aumento real dado que as mesmas serão, apenas, actualizadas num valor igual à taxa de inflação;
– as pensões balizadas entre 1,5 e 6 vezes o IAS (entre 611,11 e 2444,46 euros) serão actualizadas na base da inflação, acrescidas de 15% da taxa de crescimento do PIB. Por exemplo: se a inflação for de 2,4% e o PIB crescer 3%, daí decorre uma actualização de 2,85%;
– as pensões iguais ou inferiores a 1,5 vezes o IAS serão actualizadas na base da inflação acrescidas de 20% da taxa de crescimento do PIB. Tendo em atenção os parâmetros atrás referidos a actualização seria de 3%.
2º. O produto interno bruto cresce a um valor igual ou superior a 2% e inferior a 3%.
Neste caso.
– as pensões balizadas entre 6 e 12 vezes o IAS (entre 2444,46 e 4888,92 euros) terão um aumento negativo, ou seja: a actualização corresponderá à taxa de inflação menos 0,25 pontos percentuais;
– as pensões balizadas entre 1,5 e 6 vezes o IAS (entre 611,11 e 2444,46 euros) não terão um aumento real dado que as mesmas serão, apenas, actualizadas num valor igual à taxa de inflação;
– as pensões iguais ou inferiores a 1,5 o IAS serão actualizadas na base da inflação acrescidas de 20% da taxa de crescimento do PIB, com um limite mínimo de 0,5 pontos percentuais. Por exemplo: se a inflação for de 2,4% e o PIB crescer 2,5% daí decorre uma actualização de 2,9%;
3º. O produto interno bruto cresce num valor inferior a 2%
Neste caso:
– as pensões balizadas entre 6 e 12 vezes o IAS (entre 2444,46 e 4888,92 euros) terão um aumento negativo, ou seja: a actualização corresponderá à taxa de inflação menos 0,75 pontos percentuais;
– as pensões balizadas entre 1,5 e 6 vezes o IAS (entre 611,11 e 2444,46 euros) terão um aumento negativo, ou seja: a actualização corresponderá à taxa de inflação menos 0,50 pontos percentuais;
– as pensões iguais ou inferiores a 1,5 o IAS serão actualizadas na base da inflação, pelo que não haverá aumento do poder de compra dos reformados incluídos neste escalão de rendimentos.
Como se vê as actualizações das pensões estão dependentes de três factores: o valor do IAS, a taxa de inflação e o comportamento da economia, na base da evolução do produto interno bruto.
Resumindo:
– se a economia crescer acima dos 3% não haverá crescimento real das pensões para todos aqueles com rendimentos superiores a 2444,46 euros;
– se a economia crescer entre 2% e 3% não haverá crescimento real das pensões para todos aqueles com rendimentos superiores a 611,11 euros;
– se a economia crescer abaixo dos 2% não haverá crescimento real das pensões para ninguém.
Tudo isto conjugado, como desde sempre foi alertado pelo PCP, determinará que o valor das pensões irá diminuir, circunstância que leva os bancos e as seguradoras a esfregar as mãos de contentamento. Com efeito, uma parte dos trabalhadores portugueses ver-se-á obrigada a retirar da sua poupança uma verba destinada à criação de contas poupança-reforma, para bem do capital alheio do sistema financeiro.
Valor das pensões dependente do estrangeiro
Os trabalhadores mais pobres (a grande maioria) estarão sujeitos à evolução da economia, como aconteceu com as recentes actualizações e como acontecerá no futuro. Vamos admitir que num determinado ano as empresas com capitais portugueses tiveram um bom desempenho, produziram bem, exportaram bastante e cabendo aos trabalhadores portugueses uma evolução positiva no índice de produtividade. Vamos, também, admitir que, nesse mesmo ano, as empresas estrangeiras, como a Autoeuropa, a Siemens, a Nestlé, a Continental-Mabor e a Blaupunkt, cujo volume de negócios ultrapassa os 2% do PIB português resolveram abandonar o nosso País e instalarem-se numa outra qualquer região. O que é que aconteceria às nossas reformas? Baixariam, de certeza, tanto mais quanto maior tivesse sido a expressão no PIB português da actividade daquelas empresas no território nacional. Tudo isto para dizer o quê? Para dizer que o Partido Socialista, não contente com a destruição do sector empresarial do Estado nos últimos 30 anos, encetou, desde há dois anos a esta parte, uma outra destruição, essa no âmbito das funções sociais do Estado, indo ao ponto de fazer depender a evolução das nossas pensões daquilo que for a decisão de muitas empresas sediadas em Nova Iorque, Londres, Paris, Berlim e por aí fora.
Já se sabia, desde há muitos anos a esta parte, que muitas das bolsas das cidades atrás referidas tinham (e têm) o poder de decidir das cotações das matérias-primas (sobretudo minérios e produtos agrícolas) dos países economicamente menos desenvolvidos. Com a presente alteração da fórmula de cálculo da actualização das pensões, as multinacionais, pela mão do governo de José Sócrates, passaram a dispor da possibilidade de condicionar as nossas reformas, quer pela via do investimento, quer pela via do desinvestimento, de que a OPEL da Azambuja, e as inúmeras empresas das indústria de vestuário, calçado e cablagens são meros exemplos. Como se já não bastasse os efeitos negativos da «economia de casino» eis como a «economia beduína» pode, pela deslocalização, potenciar a redução das nossas reformas.
Nota: o conteúdo deste artigo destinou-se, apenas, a estabelecer uma correlação da actualização das reformas à evolução da economia, à taxa de inflação e ao valor fixado pelo IAS, ou seja: abordou uma pequena parte do retrocesso imposto pelo PS no que concerne ao sistema público de segurança social. Outros temas, como os prejuízos resultantes do cálculo das pensões quando o trabalhador do activo passa à situação de reformado e o aumento da idade da reforma já foram, anteriormente, abordados no nosso jornal. Um outro tema: as percentagens indexadas ao IAS para efeito de cálculo das pensões mínimas, ainda não divulgado com profundidade, deverá merecer, oportunamente, a nossa atenção.