A reforma pastoral das paróquias (3)
O Santuário de Fátima caracteriza-se, como se pôde ver, pela sua riqueza, pela sua organização empresarial, pela sua localização privilegiada e pela rigidez da sua cadeia de comando. Dispõe, ainda, de uma larga banda «cinzenta» de actuação onde se cruzam os privilégios que a Concordata lhe confere, a não apresentação de contas públicas e de um inventário patrimonial, e a indefinição da sua tutela. Perante que sede responde? É a Conferência Episcopal ou os superiores da Prelatura Pessoal do Papa - o Opus Dei? Sobre estas dúvidas, os bispos portugueses nunca se pronunciaram. Só D. José Policarpo afirmou secamente, como foi referido, acerca das contas do santuário mariano: «Disso nada sei!».
Estas indefinições não têm um interesse meramente canónico. Traduzem algumas das graves contradições que atravessam o panorama actual da igreja. Tal como é, afinal, a reforma pastoral em preparação que virá dar sentido global às realidades de Fátima.
Tanto quanto se sabe, a primeira medida espectacular da «reforma» consistirá na extinção prática das paróquias como células vivas do tecido da igreja. Não se sabe se elas serão pura e simplesmente eliminadas. Mas o pároco residente, o tradicional prior, ou as juntas paroquiais, são figuras que irão passar à história. Algures, disseminadas pela diocese, formar-se-ão equipas móveis de sacerdotes e leigos, bem equipadas e altamente especializadas, que acorrerão às paróquias e substituirão os velhos párocos ou os padres, jovens mas mal preparados pelos desacreditados seminários da província. Esses grupos serão constituídos, numa perspectiva eclesial optimista, por especialistas nas diferentes matérias, possuirão um alto grau de informatização e ligarão «em rede» os problemas paroquiais que se lhes deparem.
Em princípio, o responsável e dirigente máximo deste corpo de missão será o bispo diocesano. IPSS, ONGS, Ordens religiosas, Escuteiros, Voluntariado, Mutualidades, Fundações, Universidade Católica, serão mobilizados numa intervenção evangelizadora exemplar a que alguns já chamaram «Segunda cristianização» de Portugal. Neste primeiro aspecto da reforma pastoral pode já certamente notar-se a presença do paradigma Fátima - a paróquia/holding, o missionário-tecnocrata, a enorme massa financeira disponível e o bispo autocrata.
Questões interessantes
Outra inovação sensacional da reforma pastoral (eventualmente, a sua decisão mais drástica) será a da reestruturação profunda das três Províncias Eclesiásticas reconhecidas no país (Braga, Évora e Lisboa). No mapa provincial que ainda vigora, estas três circunscrições agrupam 20 dioceses e 4365 paróquias a que se deve juntar (como diocese canonicamente reconhecida mas sem obediência ao episcopado) a da Prelatura de Santa Cruz e Opus Dei que apenas responde perante o Papa romano.
Não são por enquanto conhecidos grandes pormenores acerca do redesenho eclesiástico do país. Mas sabe-se que irá ser constituída uma extensa Província Eclesiástica do Centro, com sede em Coimbra e uma superfície equivalente ao quadrado da distância que separa Braga e Lisboa. Milhares de paróquias serão deste modo absorvidas. O território da nova região eclesiástica será fornecido pela incorporação das actuais dioceses do Centro e por parte da diocese de Lisboa. Todo o poder será atribuído ao bispo diocesano, ainda por designar. Fátima e Leiria situar-se-ão no coração deste território.
Será interessante verificar-se se a nova reforma pastoral virá clarificar o confuso estatuto que rege o santuário e a diocese de Leiria. No primeiro caso, tudo o indica, as contas e planos de acção de Fátima escapam ao controlo da Conferência Episcopal; no caso de Leiria, cuja diocese tem um bispo residente com assento na CEP, as aparências apontam noutro sentido. Mas não é verdade ser facto do domínio público que o bispo de Leiria é sempre escolhido entre os eclesiásticos do Opus Dei? Como se pode esperar que um eclesiástico tenha duas obediências contraditórias; preste honestas contas ao colégio de pares a que pertence; e cumpra o mesmo dever em relação a uma prelatura que é pessoal e exige rigoroso acatamento da política de sigilo?
Será também de interesse referir a campanha de enganos com que a hierarquia acompanha a próxima apresentação da reforma pastoral.
Estas indefinições não têm um interesse meramente canónico. Traduzem algumas das graves contradições que atravessam o panorama actual da igreja. Tal como é, afinal, a reforma pastoral em preparação que virá dar sentido global às realidades de Fátima.
Tanto quanto se sabe, a primeira medida espectacular da «reforma» consistirá na extinção prática das paróquias como células vivas do tecido da igreja. Não se sabe se elas serão pura e simplesmente eliminadas. Mas o pároco residente, o tradicional prior, ou as juntas paroquiais, são figuras que irão passar à história. Algures, disseminadas pela diocese, formar-se-ão equipas móveis de sacerdotes e leigos, bem equipadas e altamente especializadas, que acorrerão às paróquias e substituirão os velhos párocos ou os padres, jovens mas mal preparados pelos desacreditados seminários da província. Esses grupos serão constituídos, numa perspectiva eclesial optimista, por especialistas nas diferentes matérias, possuirão um alto grau de informatização e ligarão «em rede» os problemas paroquiais que se lhes deparem.
Em princípio, o responsável e dirigente máximo deste corpo de missão será o bispo diocesano. IPSS, ONGS, Ordens religiosas, Escuteiros, Voluntariado, Mutualidades, Fundações, Universidade Católica, serão mobilizados numa intervenção evangelizadora exemplar a que alguns já chamaram «Segunda cristianização» de Portugal. Neste primeiro aspecto da reforma pastoral pode já certamente notar-se a presença do paradigma Fátima - a paróquia/holding, o missionário-tecnocrata, a enorme massa financeira disponível e o bispo autocrata.
Questões interessantes
Outra inovação sensacional da reforma pastoral (eventualmente, a sua decisão mais drástica) será a da reestruturação profunda das três Províncias Eclesiásticas reconhecidas no país (Braga, Évora e Lisboa). No mapa provincial que ainda vigora, estas três circunscrições agrupam 20 dioceses e 4365 paróquias a que se deve juntar (como diocese canonicamente reconhecida mas sem obediência ao episcopado) a da Prelatura de Santa Cruz e Opus Dei que apenas responde perante o Papa romano.
Não são por enquanto conhecidos grandes pormenores acerca do redesenho eclesiástico do país. Mas sabe-se que irá ser constituída uma extensa Província Eclesiástica do Centro, com sede em Coimbra e uma superfície equivalente ao quadrado da distância que separa Braga e Lisboa. Milhares de paróquias serão deste modo absorvidas. O território da nova região eclesiástica será fornecido pela incorporação das actuais dioceses do Centro e por parte da diocese de Lisboa. Todo o poder será atribuído ao bispo diocesano, ainda por designar. Fátima e Leiria situar-se-ão no coração deste território.
Será interessante verificar-se se a nova reforma pastoral virá clarificar o confuso estatuto que rege o santuário e a diocese de Leiria. No primeiro caso, tudo o indica, as contas e planos de acção de Fátima escapam ao controlo da Conferência Episcopal; no caso de Leiria, cuja diocese tem um bispo residente com assento na CEP, as aparências apontam noutro sentido. Mas não é verdade ser facto do domínio público que o bispo de Leiria é sempre escolhido entre os eclesiásticos do Opus Dei? Como se pode esperar que um eclesiástico tenha duas obediências contraditórias; preste honestas contas ao colégio de pares a que pertence; e cumpra o mesmo dever em relação a uma prelatura que é pessoal e exige rigoroso acatamento da política de sigilo?
Será também de interesse referir a campanha de enganos com que a hierarquia acompanha a próxima apresentação da reforma pastoral.