- Nº 1763 (2007/09/13)
15.ª Bienal de Artes Plásticas

A liberdade de quem «voa mais largo»

Festa do Avante!

Uma grande parte das 120 obras expostas na 15.ª Bienal de Artes Plásticas da Festa do Avante! correspondeu ao desafio colocado aos mais de 80 criadores, entre concorrentes e convidados, individuais e colectivos, jovens e veteranos: tomar como inspiração o tema «Voa mais largo» e os versos de Luís Veiga Leitão «Que nos cubram de ameaças e de espanto/Que nos cortem as asas mas o canto/Voa mais alto do que as penas».
Seguir o tema, como explica a comissão executiva da Bienal, no Catálogo desta edição, não constituiu critério de selecção das 42 obras expostas, entre os 190 trabalhos recebidos de uma centena de concorrentes. O júri, constituído por Dinis Guarda, Eduardo Neves, Filipe Diniz, Nuno Pedrosa e Pedro Letria, considerou com exigência a qualidade técnica das obras e a sua coerência de linguagem, independentemente das opções estéticas, já que na Bienal são encorajadas «a originalidade e a busca de uma expressão própria, mas como um valor bem diferente da "originalidade" tão cara ao sistema mercantil». Na introdução do Catálogo, evocando a afirmação de Álvaro Cunhal «Arte é Liberdade», critica-se a ideologia dominante, para a qual «é inaceitável que a arte participe da luta social ao lado dos trabalhadores», opção que logo condena arte e artistas a serem «tratados de demagogos, instrumentalizados, agarrados a opções do passado - porque, quando foi decretado o "fim da história", foi naturalmente decretado também o fim da luta de classes». «Mas não está vedado fingir toda a "revolta", toda a "transgressão", todo o "inconformismo", toda a "radicalidade", todas as "rupturas", abraçar todas as "causas" que o poder dominante não apenas tolera, como muitas vezes encena», referem os responsáveis da Bienal, comentando que «a transgressão tolerada não é um instrumento de combate, é uma manobra de diversão».
A realização da Bienal assenta em princípios diferentes, como a convicção de que «não está na própria essência e na natureza da criação artística o ser instrumentalizável» e de que, com «respeito integral pela liberdade de criação, abertura e respeito perante a legítima diversidade de opções estéticas e estilísticas» e «recusa do apelo a qualquer orientação programática», «podem ser historicamente convergentes a energia criadora dos artistas e a energia criadora das forças revolucionárias».
Isto pôde ser verificado, nos três dias da Festa, pelos milhares de pessoas que passaram o pórtico vermelho, no topo poente do Espaço Central, com motivações que - como nos referiu uma camarada da executiva da Bienal - iam desde a intenção de investimento (a opção de venda das obras foi aceite pela generalidade dos autores), até à satisfação da curiosidade do primeiro encontro com a pintura, o desenho, a escultura, a fotografia, os graffiti, a trapologia...

Domingos Mealha