PCP prepara Conferência Nacional
Intervenção de Jerónimo de Sousa

«Portugal precisa de outro rumo»

Jerónimo de Sousa participou no primeiro debate inserido da preparação da Conferência Nacional de Novembro, que se realizou anteontem. Publicamos excertos da intervenção do secretário-geral do PCP.
«O conjunto das contribuições e o debate realizado evidenciam a grande falácia do discurso e das políticas neoliberais que responsabilizam o trabalho, os trabalhadores e os seus direitos pelo fraco crescimento e desenvolvimento da economia e que em Portugal, as forças do bloco central, nomeadamente PS e PSD, têm, no essencial, assumido como parte integrante das suas orientações e práticas governativas. Orientações que se combinam e articulam com outra ardilosa linha de ataque que responsabiliza o Estado Social pela “perda de competitividade”, como afirmam, no “mercado global”.
«Trata-se de uma poderosa ofensiva ideológica e de uma concreta acção governativas que, por um lado visa desresponsabilizar as actuais políticas dos graves e negativos impactos que têm no desenvolvimento económico e na degradação da situação social e, por outro, tem como objectivo promover activamente políticas de regressão social e favorecer a concentração da riqueza. (…)
«Esta redução da produtividade ao salário do trabalhador, escamoteando factores cujo peso é determinante no aumento da produtividade, como sejam a qualidade da gestão e organização dos processos de produção, a incorporação da investigação e de desenvolvimento tecnológico nas actividades produtivas ou a qualidade do produtos, entre outros, evidencia que a aposta da política de direita continua a ser a continuação de uma estratégia que mantém o País preso a um modelo de desenvolvimento assente em mão-de-obra barata. (…)
«Mas, este empurrar para cima dos trabalhadores e dos custos do trabalho, ao mesmo tempo que se fazem comparações da baixa produtividade média do País, com sub-reptícias insinuações à eficiência do trabalho sem ter em conta as reais e substanciais diferenças entre as especializações produtivas de cada país, tem uma outra razão: – a de escamotear o papel e as responsabilidades das políticas de direita pela manutenção em Portugal de um modelo produtivo desvalorizado. (…)
«Foram as políticas concretas de governos concretos, mas também a acção de grupos económicos concretos que estão na origem das actuais dificuldades que o País enfrenta e não os trabalhadores. Políticas de privatização, de fundos comunitários impróprios, de educação e formação e uma política de integração europeia e políticas europeias que nos empurraram, na divisão do trabalho no mercado único

Contra o de­sem­prego, a pre­ca­ri­e­dade e a «flexi-se­gu­rança»
Greve Geral é res­posta ne­ces­sária


«O desemprego, como todos sabem, atingiu no último trimestre de 2006 a mais alta taxa das duas últimas décadas: mais de 600 mil desempregados. Assistimos já a um novo surto de emigração e o trabalho precário, medido pelo INE e referente ao mesmo período, abrange cerca de 21,3% dos trabalhadores por conta de outrem, colocando Portugal no topo dos países da União Europeia em matéria de precariedade laboral.
«De facto, nestes últimos anos a precariedade tornou-se uma praga social. Mais de um milhão de trabalhadores tem vínculos precários. Os contratos a prazo, os recibos verdes, a prestação de serviços, as bolsas de investigação, os apoios de inserção, o trabalho temporário, são algumas das figuras que servem para eternizar a situação de precariedade e acentuar a exploração.
«Os reflexos são conhecidos e vieram também hoje exemplos do impacto da precariedade dos vínculos laborais, não apenas na vida, precária ela também, mas na actividade económica e laboral e quanto favorável é ao crescimento económico e ao desenvolvimento a segurança no emprego, ao propiciar, como aqui foi demonstrado, condições e motivação para aquisição de formação profissional e o aumento das competências com impactos positivos na produtividade.
«O mesmo para os efeitos dos baixos salários que obrigam a multiplicar o biscate, o recurso a um trabalho suplementar, muitas vezes ambos precários e sem direitos.
«Estas mudanças do mercado de trabalho, cada vez mais precarizado e com um largo contingente de desempregados, ferem os mais elementares direitos económicos e sociais dos trabalhadores e acabam por impor também graves retrocessos no plano da democracia participativa, nos direitos de organização e acção sindical, conduzindo ao refinamento dos mecanismos de exploração e ao condicionamento crescente do exercício de direitos individuais, mas também dos direitos colectivos.

«Flexi-se­gu­rança» agra­vará a si­tu­ação

«É isso que temos visto com a cobertura dos governos do PS e do PSD/CDS-PP. Situação que se agravará de forma preocupante com a imposição do conceito de “flexi-segurança” que a concretizar-se em legislação concreta como pretendem o grande patronato europeu e nacional degradaria ainda mais a situação laboral de milhões de portugueses.
«O Governo do PS quer, durante a Presidência Portuguesa da União Europeia, fazer avançar a liberalização dos despedimentos individuais sem justa causa e a possibilidade da decisão arbitrária pelo patronato sobre os horários de trabalho, remunerações, funções, carreiras e condições de trabalho, visando instalar a “lei da selva” nas empresas com a possibilidade de alterar a organização do trabalho a seu belo prazer e dispor, no fundo, da autonomia e da vida dos trabalhadores.
«Tudo feito em nome da produtividade e da competitividade e da falsa promessa de uma maior protecção no desemprego que nunca chegará, como o têm provado estes dois anos de governo do PS e as suas propostas de ataque aos direitos dos trabalhadores, à segurança social, às reformas ou, como se vê, pela ofensiva contra o direito à saúde dos portugueses ou ainda com a recente Lei que acaba de aprovar sobre o trabalho temporário e que mais não é que legalizar a ilegalidade das novas praças de jorna. (…)
«O que se está a passar na Administração Pública diz-nos até onde o Governo do PS está disposto a ir em matéria de precariedade e em matéria de direitos laborais, mas também de ataque às principais funções sociais do Estado. (…)
«É por isso que se justifica e é muito justa a decisão da CGTP de marcação de uma Greve Geral para 30 desse mesmo mês de Maio. Greve Geral que é uma importante oportunidade para todos expressarem o seu protesto e o seu descontentamento e lutarem contra a política deste Governo. Greve Geral que é a resposta necessária e adequada aos mais de dois anos de ofensiva do Governo do PS contra os direitos laborais e os interesses dos trabalhadores e os direitos sociais do povo.»

Há al­ter­na­tivas!

«A resposta à grave situação económica e social não pode ser encontrada dando continuidade às políticas de direita que já provaram que não resolvem os problemas nacionais nem o desenvolvimento do País. (…) Nós pensamos que há alternativas, que o actual caminho que a política de direita impõe não é único, nem inexorável como aqui também se tornou evidente. Há outras soluções capazes de resolver os problemas nacionais e garantir o desenvolvimento sustentado e equilibrado do País e melhores condições de vida aos portugueses.
«O PCP reafirma a necessidade do País adoptar políticas macro-económicas de crescimento e desenvolvimento que, tendo como objectivo a melhoria do nível e qualidade de vida e o pleno emprego, tenham como componentes essenciais a dinamização da produção e do consumo, por via do crescimento dos salários e das pensões e por uma mais equilibrada repartição do rendimento. Políticas que defendam o fortalecimento do aparelho produtivo e combatam as deslocalizações e as privatizações.
«O PCP reafirma a necessidade de promover um modelo de desenvolvimento do País que decididamente assuma a valorização do trabalho nacional e do trabalho com direitos, nomeadamente para que a um posto de trabalho permanente corresponda um contrato de trabalho efectivo, contra a praga social da precariedade, do trabalho temporário, dos falsos recibos verdes. Pela contratação colectiva contra a extinção dos contratos colectivos de trabalho. Pela defesa do direito ao trabalho e dos vínculos contra a arbitrariedade dos despedimentos individuais sem justa causa e da arrogância patronal na fixação de horários, remunerações e funções.
«O PCP reafirma a necessidade de uma Administração Pública eficaz ao serviço do povo e do País e serviços públicos de qualidade.
«Portugal precisa de outro rumo, precisa de retomar o projecto de democracia e desenvolvimento económico e social que a Revolução de Abril inscreveu na Constituição da República Portuguesa.»


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